Monday, February 7, 2011

Duas faces de Robert Kubica



Você não precisa ver o vídeo acima até o fim. Assista apenas ao primeiro minuto, até acabar a entrevista - o resto é um daqueles videoclipes insuportáveis feitos por pessoas que se acham cineastas. Os dois abaixo, estes sim são recomendáveis do início ao fim.

Em italiano, na referida entrevista, concedida no ano passado, ao comentar sobre sua paixão por rali, diz que este tipo de prova é "um divertimento, mas não posso me dedicar integralmente a ele, já que meu principal trabalho é outro". No vídeo abaixo, Kubica conduz o Renault Clio S1600 rumo à vitória (na soma dos tempos) em sua classe no Rali del Salento, também em 2010.

O polonês se mostra um piloto dividido. Em entrevista dada à F1 Racing publicada em fevereiro de 2008, ele comenta o banimento do controle de tração (à época, prestes a ser proibido) com sinceridade desconcertante: "Para mim, a Fórmula 1 deveria ser o ápice. Os carros deveriam ter motor V10, slicks, máximo downforce, eletrônica - tudo o que os faz mais rápidos. Mas eu também sou um fã de rali, portanto gosto quando o piloto tem mais controle".

O repórter aproveita o gancho e emenda: "Você tem corrido em rali?"

Ele se torna cauteloso: "Em casa, na Polônia, sim. Eu adorei e talvez corra mais no futuro". Sua equipe na época, a BMW Sauber, vetava aos seus pilotos atividades arriscadas. Ao se mudar para a Renault, segundo o jornal Folha de S. Paulo publicou ontem, o piloto fez questão de fazer constar no acordo sua liberdade para entrar nesse tipo de competição.



Na mesma entrevista de 2008, ao ter de responder que "você seria se são fosse um piloto de corridas", declara: "Eu realmente gostaria de ter sido um piloto de rali. E se você não me deixar, gostaria de ser um policial. Acho que seria divertido".

Por pelo menos duas vezes, ao falar sobre ralis, Kubica se mostra contraditório como um marido infiel - a Fórmula 1 é sua casa e não quer abandoná-la, mas tem no rali uma amante irresistível.

No último dia 6, esse flerte com o outro mundo - mais perigoso decerto, mas mais leve, descontraído, com menos linhas de contrato a pesarem em volta - cobrou seu preço. Sobram comentários de "como a (Lotus?) Renault deixou seu piloto-chave se arriscar tanto?" Ou "como Kubica pode assumir tantos riscos com o compromisso que tem frente a sua equipe?"

Quem respondeu a tanta indignação foi Oscar Wilde, há muito tempo: a coerência é o último refúgio dos que não têm imaginação. O psicólogo Contardo Calligaris se deu a liberdade de completar a frase: e também dos que não têm coragem.

Wilde foi condenado pelos vitorianos de seu tempo por ter a coragem de assumir seus desejos. Os vitorianos de hoje fazem o mesmo com Kubica. Frente a uma tragédia, o desejo é a forças mais fácil de se culpar. Mais difícil é, em momentos como este, encarar a beleza de performances como a registrada abaixo, que talvez jamais se repitam.



E que Kubica tenha uma vida inteira pela frente.

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