Sunday, January 31, 2010

Apresentação da Jordan, 2005


Lembra quando eu afirmei algo sobre, na primeira metade dos anos 2000, as equipes terem abandonado as apresentações exóticas, em locais improváveis, feitas para chamar a atenção, em prol de eventos mais 'low-fi'? Apenas gostaria de deixar claro que tal regra não se aplica para bilionários russos que eventualmente compram times independentes falidos.

Fica o registro.

Saturday, January 30, 2010

Apresentação da Renault, 2002 - Quem te viu, quem te vê


Amanhã acontece a apresentação do carro 2010 da Renault. Teoricamente, a equipe permanece aquela mesma que reestreou em 2002 após comprar a Benetton. Mas agora sem o "100%".

Thursday, January 28, 2010

A temporada de apresentações


Já se foi o tempo em que as equipes de Fórmula 1 gastavam os tubos com pirotecnias espetaculosas nos lançamentos de seus carros a cada começo de ano. Hoje ninguém mais se dá a tal luxo.

Talvez a apresentação mais vultuosa de todos os tempos tenha sido a da McLaren em 1997. Como se não bastasse expectativa de a equipe trocar seu visual após 23 anos de patrocínio da Marlboro, o evento ainda contou com um número das Spice Girls.

Embora poucos tenham chegado perto de tamanha ostentação, fogos de artifício e efeitos visuais perduraram ainda por muitos anos. Locações bizarras e panos por cima dos bólidos eram regra. Valia tudo para conquistar as manchetes dos jornais. O orçamento ilimitado fazia a alegria dos setores de ‘public relations’ das equipes.

Das equipes ricas, diga-se de passagem. Porque o fundo do grid não se podia permitir tanta gastança, e suas apresentações costumavam se resumir a seções de fotos improvisadas nos boxes de Silverstone ou de Melbourne no fim da tarde de quinta-feira, às vésperas do GP da Austrália. Os jornalistas costumavam registrá-los com algumas poucas linhas de desdém e sarcasmo.

Estávamos no auge do neoliberalismo, período em que os hábitos da nouvelle richesse talvez tenham atingido sua maior amplitude. E então veio a Enron, o estouro da bolha pontocom e o escândalo das fraudes nos balanços das grandes corporações.

E o que era auge do glamour de repente virou vergonhoso e kitsch. A moda era ser discreto, tentar chamar a atenção sem fazer alarde.

Como se não bastasse, o golpe de misericórdia veio com a crise econômica de 2008, e a discrição deu lugar ao mais disciplinado espartano. Nada de penduricalhos: apenas o carro, os pilotos em seus macacões, e talvez um shakedown para provar que aquilo não era teatrinho.

Este ano provavelmente as equipes se permitirão mais do que no ano passado, mas não se sabe até que ponto os excessos será permitidos. O certo é que os dias em que os lançamentos eram superproduções à la Broadway acabaram.

Mesmo assim, aquele período ainda reservou algumas poucas apresentações memoráveis. A minha preferida é a da
Benetton em 2000 (foto acima), quando colocaram seu modelo B200 no Museu Nacional de Arte da Catalunha. O carro azul, ao lado das esculturas de Gaudí e do skyline de Barcelona, ao menos rendeu uma boa imagem.

Wednesday, January 27, 2010

Cartazes - GP da África do Sul 1967


A partir de 1967, a etapa sul-africana se deslocou para Kyalami, mais perto dos grandes centros urbanos. O cartaz que o apresenta apresenta algumas sacadas e soluções interessantes.

Uma delas é organizar o título de forma a anunciar o evento em duas das línguas oficiais do país. Mas talvez a aposta mais certeira tenha sido a paleta de cores: amarelo, vermelho e um verde escuro. Só por elas já é possível saber que a corrida se dará no continente africano.

Interessante notar a sensação de rapidez em uma curva à esquerda passada pelo carro desenhado. Afinal, com exceção do Jukskei Sweep, as curvas mais notáveis de Kyalami são todas tomadas à direita...

Monday, January 25, 2010

O rio das lágrimas de Tadashi Yamashina

Em um post da semana passada, usei a história do Japão para desconstruir algumas explicações sobre a saída da Honda, da Toyota e da Bridgestone da Fórmula 1. Uma das imagens mais reveladoras desse processo de “êxodo japonês” da Fórmula 1, colocada acima, é o choro de Tadashi Yamashina. Também podemos aprender muito sobre a terra do sol nascente com este registro.

Até o ano passado, Yamashina desfilava pelo paddock (incógnito, diga-se de passagem) como o chefe da Toyota na Fórmula 1. Quando a equipe convocou uma coletiva de imprensa para anunciar que estaria fora da categoria, não foi capaz de se conter.

Podemos supor que a situação era tão delicada e embaraçosa quanto para, por exemplo, Mario Theissen em agosto último, ao fazer anúncio semelhante. No entanto Theissen não chorou. E se chorasse, talvez não tivesse desabado tal qual Yamashina.

Onde está, afinal, a nascente destas lágrimas? Uma pista valiosa pode ser encontrada em um artigo de Contardo Calligaris, psicanalista e colunista da Folha de S. Paulo, datado de fevereiro de 2006.

Intitulado “Culpa e vergonha”, Calligaris discorre: “Num livro famoso, ‘O Crisântemo e a Espada’, de 1946, uma grande antropóloga americana, Ruth Benedict, tentou entender a sociedade japonesa.”

“Ela chegou a uma conclusão que se tornou clássica: há sociedades em que o comportamento moral é regulado pela vergonha (por exemplo, o Japão) e outras em que ele é regulado pela culpa (por exemplo, as sociedades ocidentais modernas). Em cada tipo de sociedade, ambos os afetos estariam presentes como motivações e deterrentes, mas um deles seria dominante.”

“A vergonha parece ser um regulador perfeito para as sociedades tradicionais, em que, acima da lei, vigem os códigos de honra, a fidelidade ao legado dos ancestrais, o sentimento de uma missão simbólica da estirpe e da casta - ideais que permitem medir nosso valor e nossa dignidade.”

Já a culpa, escreve o colunista, teria uma origem na doutrina cristã “de que o indivíduo deve pouco ou nada a seu passado e aos grupos aos quais ele pertence, mas é contável diante de um Deus que sabe tudo e, em última instância, julgará e punirá ou recompensará”.

Em tese, tanto a culpa quanto a vergonha produziriam efeitos semelhantes. Eis o problema, pois, como adverte Calligaris, “a culpa é um péssimo regulador moral”.

“À primeira vista, que a gente acredite ou não nas penas do inferno, pareceria lógico que evitássemos as ações que (como sabemos sempre de antemão) não nos deixariam dormir tranqüilos. Mas qualquer terapeuta sabe que não é assim: a culpa funciona como uma espécie de pagamento antecipado. Autorizo-me a fazer algo que me parece errado justamente porque sei que me sentirei culpado, e meu sofrimento futuro compra, desde já, o perdão para meu ato”.

“A vergonha é um regulador moral muito mais eficaz que a culpa porque meu sofrimento por perder a face não repara minha honra. Enquanto a própria culpa absolve o sujeito culpado, a vergonha mancha, e sentir vergonha não restitui a dignidade de ninguém. A única cura da vergonha está nos atos futuros do sujeito”.


A foto de Yamashina chorando correu o mundo – ao menos, diga-se, o mundo ocidental moderno -, perplexos que ficamos com uma manifestação tão comovente de reconhecimento do fracasso.

Como Calligaris explica em um artigo posterior, a vergonha desempenha alguma regulação em sociedades como a nossa, não relacionada ao débito com nossos antepassados ou com nosso legado, mas com a imagem que os outros têm de nós. No entanto, o pensamento japonês, que enfatiza a dimensão simbólica do trabalho, estará a partir de agora ausente da Fórmula 1.

Da próxima vez que uma equipe encerrar as operações, provavelmente teremos que nos contentar com discursos decorados de executivos com voz empostada tentando nos convencer de que estão fazendo o bem. A ausência japonesa se fará sentir então numa Fórmula 1 cada vez mais homogênea.

Saturday, January 23, 2010

Vídeo: Mid Ohio, Fórmula 5000, 1971



No início dos anos 70, o canal norte-americano ABC produziu uma série de documentários sobre diferentes tipos de corrida nos EUA, chamados “Once Upon a Wheel”. No capítulo “Road Race”, eles retrataram um fim de semana de competições da Fórmula 5000 (ou Fórmula A): a prova de Mid Ohio de 1971. Ele está na íntegra no Youtube, e apresento ele aqui com comentários.

Os pilotos-protagonistas escolhidos foram Sam Posey e David Hobbs.

Sam Posey aparece chegando ao autódromo de carro, falando sobre seu nervosismo. É apresentado como um piloto que sonha um dia correr na Fórmula 1. Posey comenta as intrigas entre os pilotos no paddock, mas adverte que é da natureza do esporte.



Brett Lunger fala das temperaturas altas no cockpit. “Na Califórnia também estava assim, mas não havia umidade”, relata.

A narração do autódromo informa sobre os horários dos treinos, o comprimento da pista e a premiação: US$ 1.400 para o pole position, US$ 4.500 para o vencedor geral. Em seguida, Posey e Hobbs vão para a pista com câmeras acopladas a seus capacetes para que suas warm up laps sejam filmadas. Claro que eles filmaram sem acelerar muito, mas já é possível sentir como é estar dentro de um desses carros.

Depois do comercial, Posey passeia pelo paddock – um enorme assentamento improvisado – reportando à câmera sobre as diferentes categorias que correm no mesmo fim de semana, diferenciando a vasta quantidade de pilotos e equipes amadoras, que estão lá por paixão, e os pilotos da F5000 como ele, que trabalham profissionalmente. Suas divagações sobre a vida útil dos carros são muito instigantes como retrato de sua época: “A vida operacional de um carro de corrida ‘top’ é de mais ou menos seis meses (...). Depois disso ele está pronto para ir pro museu. Se ele estiver inteiro, é claro, porque a maior parte dos carros de corrida acaba destruída em acidente. Esse é o destino de 75% deles”.



Sam Posey prossegue bastante desenvolto em sua explicação: “E agora estamos chegando perto de um dos três tipos de carro que correm profissionalmente pelo SCCA (Sports Car Club Association, promotora do campeoanto). Eles são este Fórmula A que você pode ver (o antigo nome dos F5000), os Can-Am, que são carros esporte, e os Trans-Am, que são como Mustangs ou Camaros. Dos três, acho que prefiro os Fórmula A. Rodas descobertas, como os carros de Grand Prix que disputam o mundial na Europa, 500hp ou mais, agilidade incrível, e a maior satisfação ao pilotar porque são monopostos (single-seaters, no original)”.

“De todos os carros que vimos no paddock os Formula A são os mais rápidos, e entre todos os Fórmula A, eu acho que o mais rápido é o meu Surtees Formula A.

No briefing antes da última sessão de classificação, vemos Posey e Hobbs numa conversa descontraída. “Na sessão passada eu tentei copiar o seu traçado, mas acontece que meu carro não anda na grama”, provoca o primeiro. Ambos riem.

No fim, Posey é o pole, seguido de Grable, Brett Lunger e Hobbs, que dominava o campeonato até então. Poucos minutos antes da largada, o tempo fecha e especula-se uma prova sob chuva – que acaba não ocorrendo.

Na época, as provas da F5000 eram corridas em duas baterias iguais – de 30 voltas, neste caso. As posições de chegada da segunda bateria eram as mesmas de largada da segunda. O vencedor saía de um sistema de pontuação interno que, segundo o próprio narrador do documentário, “é um pouco complicado. O melhor a fazer é acelerar primeiro e se preocupar com as contas depois”.

Na primeira bateria, Posey lidera durante quase todo o percurso, até que Hobbs o ultrapassa e vence por apenas 0,2s.



Durante a pausa de uma hora entre as duas baterias, podemos ver Posey descansando embaixo de um caminhão e explicando que ele não viu a investida de Hobbs por estar com o retrovisor quebrado.

A situação se inverte na sessão seguinte. Posey ultrapassa Hobbs nas primeiras voltas e ambos mantém suas posições até o final. No resultado total, Posey termina como o grande vencedor.

Friday, January 22, 2010

Indie Rocks - Team Gunston, África do Sul, 1969


Das equipes “locais” que se inscreviam apenas em GPs da África do Sul, o Team Gunston é o exemplo mais destacado. Os europeus da Lotus, Brabham, Ferrari etc eram unânimes em considerá-los os mais profissionais da região.

Na verdade, era uma equipe da Rodésia (atual Zimbábue), país que ficou conhecido por um dos governos mais autoritários e racistas do século XX. O Team Gunston estreou no GP da Rodésia de 1967 (sem relação com o campeonato mundial) em torno dos dois melhores pilotos do país: John Love e Sam Tingle.

A Gunston era uma marca de cigarros pertencente ao grupo rodesiano Winston, e o patrocínio no automobilismo teve como objetivo promover os negócios no país vizinho, já que eles próprios se afundavam em guerras civis e precisavam de capital externo. Dessa forma, quando os pilotos da Gunston alinharam para o GP da África do Sul de 1968, fizeram da equipe a primeira na história (antes mesmo da Lotus) a correr com patrocínio de cigarro na Fórmula 1.

Na foto acima vemos John Love com uma Lotus 49 em Kyalami. O contrato com a Winston previa que os pilotos recebessem uma certa soma de dinheiro anualmente, mas eles mesmos eram responsáveis por comprar e manter os próprios carros.

Wednesday, January 20, 2010

A rendição japonesa (na Fórmula 1)


A saída da Honda da Fórmula 1 no fim de 2008, e a da Toyota, tão logo terminou a temporada no ano passado, sem dúvida fazem parte de um mesmo contexto: a crise econômica dos últimos tempos. No entanto, muita gente associou o fim das operações das equipes japonesas aos maus (ou péssimos) resultados que elas obtiveram na pista.

É uma explicação um tanto rasa, e que não leva em conta o passado recente do Japão.

Também devemos incluir no ‘pacote’ a saída da Bridgestone como fornecedora de pneus da Fórmula 1 a partir de 2011, anunciada quase simultaneamente à desistência da Toyota. Outra vez, ventilou-se a idéia de que um modelo de fornecimento único de compostos não agregaria valor à marca e, portanto, não seria viável para a empresa – o que é possível, mas carece de provas materiais.

A história pode nos oferecer uma base mais concreta. O Japão sofreu um processo de industrialização repentino e súbito, entre 1870 e 1914. Assim como em outros países, tal fenômeno provocou grande concentração de renda. Formaram-se, assim, os zaibatsus, conglomerados gigantes responsáveis por fatias enormes da economia.

Mas se na maioria dos países estes grupos batiam de frente contra o governo, os zaibatsus trabalharam em plena sintonia com o poder político (na época, imperial).

A Guerra abalou profundamente a sociedade japonesa. O Japão que emergiu, porém, conservou algo dessa integração entre grupos econômicos e Estado visto anteriormente. Sendo que a reorganização social do país foi muito influenciada pelos EUA (receoso do avanço comunista no Oriente), a estrutura resultante foi baseada nas políticas do New Deal e do welfare state. Os zaibatsus, verticalmente controlados, deram lugar então aos keiretsus, horizontalmente (mas também verticalmente) dispostos.

E assim se deu o “milagre econômico japonês”. Dois aspectos da estrutura resultante são importantes para se entender o Japão e as decisões empresariais de Honda, Toyota e Bridgestone.

Em primeiro lugar, que os
keiretsus não se interessam por lucros no curto prazo. A Toyota permaneceu sete anos sem vencer na Fórmula 1, e talvez ficasse outros sete sem se importar. A Honda se infiltrou timidamente no início dos anos 2000, na BAR, e só se assumiu como o primeiro nome do time quanto o banimento ao cigarro expulsou a BAT.

Mas se os resultados não importavam tanto assim, por que saíram? Aí entramos no segundo aspecto.

A ligação das empresas com o interesse do Estado, e a ligação do Estado com o welfare state criaram uma política arraigada de manutenção a qualquer custo dos postos de trabalho.

O declínio do welfare, nos anos 90, fez os paradigmas da ilha tremerem, e algumas empresas começaram então, a demitir – embora não tanto quanto no Ocidente. O caso mais clássico é o da Nissan, então sob o domínio de Carlos Ghosn, que a salvou da falência (e foi trabalhar na matriz, a Renault). Ainda assim, sociedade e empresas resistiram.

E veio então a crise econômica, que não mais permite a manutenção das políticas tradicionais. E se Toyota e Honda terão de colocar um número jamais visto de empregados na rua, não é de bom tom que continuem a brincar de carrinho nas pistas do mundo afora – tal postura seria vista como uma traição a seu povo.

O embate entre tradição e modernidade está na base da retirada em massa dos japoneses da Fórmula 1. O mesmo embate levou às lágrimas o chefe da Toyota, Tadashi Yamashina, na coletiva que a equipe convocou para anunciar seu afastamento. Este é um assunto para um próximo post...

Monday, January 18, 2010

As pontes de Calatrava


No GP da Europa do ano passado, quem assistiu a corrida com a narração brasileira talvez se recorde que Reginaldo Leme fez um comentário (bastante incomum para uma tradição de narração em geral bitolada) sobre a ponte sobre a qual passa o circuito de Valência.

É uma ponte muito pequena, além de estreita. Por ter sido alocada em um trecho muito lento do traçado, é possível reparar nela com alguma atenção durante a corrida. Sua dimensão simbólica vai um pouco além de sua extensão: foi desenhada pelo mais famoso arquiteto valenciano contemporâneo, Santiago Calatrava.

Calatrava (1951-) projetou muitas outras pontes, e maiores, sobretudo no início de sua carreira. Seu trabalho agrega à arquitetura seus conhecimentos de engenheiro estrutural, de forma que a estrutura não é ocultada, mas exposta e apresentada como elemento monumental da obra.

As curvas estão sempre presentes, derivadas de estudos do corpo humano e do mundo natural.

A posição de destaque que Calatrava ocupa na cena atual veio da
Torre Telefónica de Montjuic, em Barcelona, que serviu de marco para as Olimpíadas de 1992 e para a revitalização da cidade. Poucos anos depois concluiu o marco da renovação de sua própria cidade, a Cidade das Artes e Ciências de Valência.

O arquiteto passou então a ser requisitado nos EUA, onde realizou o
Museu de Arte de Milwaukee. Na Suécia inaugurou em 2005 o revolucionário arranha-céu Turning Torso. Atualmente trabalha na central de transporte que constituirá o enorme complexo do World Trade Center Site, em Nova York.

Dono de um estilo próprio, considerado herdeiro de Gaudí, sua fama porém não é isenta de polêmica. Calatrava é cercado delas. A mais famosa se dá em torno do Aeroporto de Bilbao, que coleciona problemas estruturais. Uma ponte sobre o Canal Grande de Veneza é esperada há quase 15 anos, mas sua estrutura é considerada pesada demais e resiste em passar nos testes de rigidez. Seu custo já ultrapassa mais de três vezes o valor inicialmente estipulado.

Críticas contundentes ao conjunto de sua obra têm aparecido com regularidade. Tem seu nome profundamente ligado ao adjetivo “extravagância” quando seus projetos são julgados pelo propósito a que servem.

Falhas de funcionalidade, uso de materiais prejudiciais ao ambiente e desprezo da relação entre obra e entorno também fazem parte de suas menções. A Cidade das Artes e Ciências oferece um espaço expositivo exíguo em comparação à área construída. O terminal de Bilbao sofre acusações de mau uso do espaço. Como se não bastasse, há quem diga que suas construções são repetitivas demais.

De toda esta questão, a Fórmula 1 passa em uma pequena ponte - geralmente rápido demais para refletir a respeito.

E você? Conhece alguma obra de Calatrava? Tem uma opinião formada sobre sua obra? Ou sobre a ponte do circuito de Valência? Sinta-se livre para comentar!

Sunday, January 17, 2010

Indie Rocks – Team Pretoria, África do Sul 1968


Uma equipe de um piloto só, de uma corrida só. Jackie Pretorius foi um grande nome do automobilismo de seu país a seu tempo e, como seus compatriotas, costumava se inscrever nos GPs quando a Fórmula 1 visitava a África do Sul.

Tentou largar em meio aos ‘pilotos graduados’ em 1965, num carro nacional, da LDS. A foto mostra sua segunda tentativa: com um Brabham BT11, munido de um motor Climax.

Largou em 23º e último, e completou 71 das 80 voltas. Apesar de receber a bandeirada, não foi classificado por não atingir o percurso mínimo, 90% da distância do vencedor. Pretorius fez outras duas aparições, mas não com seu Team Pretoria: em 1971, com o Team Gunston, e em 1973, com um dos carros de Frank Williams.

O piloto foi bastante influente do lado de fora das pistas: por exemplo, como um dos mentores e conselheiros de Jody Scheckter, prestes a tentar a sorte na Europa. Era conhecido por seu bom humor e irreverência.

Nos últimos anos, viveu uma aposentadoria confortável, até que a violência endêmica do país lhe cobrou o preço. No ano passado, uma tentativa de assalto à sua casa o deixou ferido. Pretorius não resistiu e morreu em 30 de março de 2009. Antes, havia perdido sua mulher, também assassinada.

Thursday, January 14, 2010

GP do Cabo, 1962

2 de janeiro de 1962. A Fórmula 1 ainda demoraria 360 dias para disputar o primeiro GP da África do Sul válido para o campeonato mundial, mas alguns dos melhores pilotos da Europa haviam passado a virada do ano no país, disputando corridas entre si e com os anfitriões.

Na foto acima, vemos os carros alinhados para o GP do Cabo, na cidade de mesmo nome, no autódromo de Killarney. Da esquerda para a direita, na primeira fila se posicionam Jo Bonnier (Porsche 718), Trevor Taylor e Jim Clark (Lotus 21 - Climax).

Taylor venceu, com seu companheiro de equipe em segundo. Mas seu maior inimigo foi o fator natural com que os estrangeiros estavam então se acostumando: o calor. Como se pode ver abaixo, Taylor mandou a equipe, no meio da prova, retirar a parte lateral da lataria do seu carro para que pudesse se manter refrescado. Talvez tenha sido a chave para seu sucesso.




Tuesday, January 12, 2010

Detroit: a cidade, o carro, a corrida, o caos

Quem acompanhava a Fórmula 1 nos anos 80 deve se lembrar de cenas como esta acima: os carros (no caso, a Williams de Keke Rosberg, em 84) rasgando as ruas de uma cidade americana com as torres do Renaissance Center ao fundo. Era o GP de Detroit, e estes prédios, circundados pela pista, são a sede mundial da General Motors.

Mais difícil de notar, entretanto, era a decadência da cidade além das grades que delimitavam o circuito. Hoje, Detroit é tida como o maior desastre urbano da história dos Estados Unidos.

No domingo passado a Folha publicou em seu caderno ‘Mais!’ um artigo da New Republic, assinado por Bruce Katz e Jennifer Bradley, que apresentam mais detalhadamente alguns dos problemas da cidade que vão além do colapso da indústria automobilística.

“Nenhuma outra cidade dos EUA perdeu mais moradores desde 1950 (...). Seu governo municipal falha no cumprimento das tarefas mais básicas”.

“Uma ligação para o número de emergência 911 leva em média 20 minutos para resultar em uma ação de resposta (tais chamadas são desanimadoramente comuns na área metropolitana: ocorrem 1.220 crimes violentos para cada 100 mil pessoas).”

“E isso sem mencionar a corrupção nas fileiras municipais. Apenas em 2009, pelo menos 48 funcionários de escolas públicas de Detroit foram investigados por fraude. O desemprego está na porcentagem assustadora de 28%”.

Pulsante Motown
O cenário de
edifícios em ruínas e ruas desertas não parece se encaixar com a mais próspera cidade do país nos anos 1950. Conhecida como Motown, “The City of the Homeowners” (referência aos baixos índices de moradores que tinham de pagar aluguel), era a quarta maior aglomeração urbana dos EUA.

A história do sucesso começou quando Henry Ford fez sair os modelos T de sua fábrica na cidade. E então Detroit se tornou o centro da indústria automobilística mundial, a sede da Ford, da GM e da Chrysler.

Como atesta o repórter da Time
Daniel Okrent numa matéria recente, nem a questão racial parecia incomodar a confiança dos moradores. “No noroeste da cidade, uma construtora ergueu um muro de concreto de quase 800m de extensão para separar seu desenvolvimento de um bairro negro. Ainda assim, a Detroit branca acreditava que as revoltas que atingiram Los Angeles em 1965 e tantas outras cidades no verão seguinte nunca explodiriam na nossa cidade. Negros em Detroit, acreditavam os brancos esclarecidos, tinham empregos e casas, e mesmo que estas casas estivessem do outro lado de um muro ‘apartheid’, seus donos tinham interesse na cidade”.

Revoltas varreram a cidade em julho de 1967.


FDPNC
Após o controle da emergência social, por poucos e brancos policiais mal preparados, boa parte da população branca fugiu para os subúrbios, pessoalmente engajada em não deixar que negros e outras minorias ‘contaminassem’ a vizinhança. Detroit é hoje uma cidade majoritariamente afrodescendente (82% da população total) e a segunda mais segregada dos EUA.

A partir de 1973, e pelos 20 anos seguintes, o prefeito da cidade foi Coleman Young. Negro, sua gestão ficou conhecida pelo desaparelhamento social e pelas práticas vingativas que isolaram a metrópole de seu subúrbio e impediram qualquer política conjunta. Okrent relata que ele costumava se referir a si próprio como FDPNC: NC por “no comando”; FDP por exatamente o que você está pensando.

Some-se a isso o lobby da indústria automobilística e o desastre estava completo. Nos anos 70, os fabricantes americanos não corresponderam ao desejo dos consumidores por carros menores e mais leves frente à crise do petróleo. Nas duas décadas e meia seguintes mesmo o design dos carros estava ultrapassado, acomodados que estavam os construtores, que jamais pensaram ser possível perder seu ‘market share’ para concorrentes estrangeiros. Eis o resultado.

Dresden
A cidade que víamos pela TV enquanto os carros da Fórmula 1 corriam nos anos 80, e os da Cart nos mais de dez anos seguintes, perdia sua população rapidamente. De mais de 1,8 milhão de habitantes nos anos 50, hoje ela retém pouco mais da metade.

Daí deriva seus maiores problemas urbanísticos. “Ela é simplesmente extensa demais para sua população com uma paisagem que até mesmo seus moradores comparam à Dresden do pós-guerra”, afirmam Katz e Bradley. “Quase um terço dos terrenos da cidade está vazio ou sem uso, e 80 mil unidades habitacionais estão desocupadas”.

Como é possível ver no infográfico abaixo, em sua mancha urbana cabem inteiras San Francisco, Boston e Manhattan, que totalizam 2,8 milhão de habitantes.



Em Motown, obviamente, o combustível das corridas realizadas em suas ruas era a cultura do carro. Apesar disso, pilotos eram unânimes em criticar as duas pistas urbanas usadas na cidade.
A primeira, da Fórmula 1, era mais lenta que Mônaco. Quando a Cart se mudou para o Belle Isle, a poucos metros do primeiro e no meio do rio, os problemas se agravaram: de difícil acesso, estreito, sem margem para a competição, infra-estrutura precária. Fora do calendário norte-americano desde 2001, Roger Penske o trouxe de volta á vida em 2007, mas em 2009 a crise o enterrou outra vez no ostracismo.

“Quando o governo federal justificou a injeção de dinheiro nas montadoras, apresentou um argumento implícito sobre os EUA – que essas empresas são essenciais para a grandeza econômica futura do país e que sua perda seria uma derrota simbólica insuportável. O mesmo vale para a cidade que as abriga”, completam Katz e Bradley.

A morte das corridas por lá é certamente parte desta perda. De uma cidade dos carros inabitável para humanos.

Monday, January 11, 2010

Cartazes – GP do Rand 1963


Nos anos 60, deslocar toda estrutura da Fórmula 1 para a África do Sul para disputar apenas uma corrida era um grande desperdício. Por isso, quando os melhores pilotos estavam lá, na época da virada do ano, durante o inverno do hemisfério norte, entre duas e quatro corridas de Fórmula 1 eram marcadas para reunir os pilotos internacionais e locais.

O GP da África do Sul, válido para o campeonato, em princípio foi atribuído a East London. Já Kyalami era sede do GP do Rand, que foi disputado ininterruptamente de 1961 a 1965.

O nome "Rand" é curioso: vem de 'Witwatersrand', ou Montanha das Águas Brancas, uma localidade próxima a Johannesburgo que era a maior reserva de ouro do país. Como Kyalami também fica próxima da cidade, herdou a referência.

O cartaz de 1963, mais uma vez, não deixa dúvidas quanto ao talento do desenho gráfico sul-africano. A prova foi disputada no dia 14 de dezembro em duas baterias de 25 voltas cada. Ao final, dobradinha das Ferrari, com John Surtees seguido por Lorenzo Bandini.

Saturday, January 9, 2010

Vídeo: GP de Questor, 1971



Os melhores da Fórmula 1 contra os melhores dos EUA. Assim foi anunciado a quatro ventos o GP de Questor de 1971. Ele não contou pontos, mas ficou marcado como um evento único na história – daí meu espanto em encontrar imagens desta corrida.

No quase novo Ontario Motor Speedway, na Califórnia, carros da Fórmula 1 e da F5000 americana (também conhecidos como Fórmula A) disputaram curvas lado a lado. No vídeo acima, que mostra os preparativos e os treinos para a prova, podemos ver as estrelas consagradas do Mundial, como Jackie Stewart e Mario Andretti, ao lado dos nomes locais, como Ron Grable, Sam Posey e Mark Donohue (que cruzaria o Atlântico para morrer a bordo de um F1).

Para quem não conhece, a F5000 era um formato de competição com monopostos de motor 5.0 litros de baixo custo que se popularizou em categorias nacionais na Europa, Oceania e África do Sul. Mas nos EUA ela atingiu seu ápice. Um dos poucos momentos em que os circuitos mistos atraíram, naquele país, profissionais tão bons quanto os ovais – já que os F5000 só corriam em mistos.

Mas todos no paddock sabiam que a comparação direta seria injusta. “O F5000 tem mais potência que um F1, mas o motor é mais pesado e fixado mais alto”, explicava Sam Posey. Ron Grable foi mais taxativo: “A relação peso/potência dos F1 é melhor, o que os torna mais rápidos nas retas, e por serem mais leves também são melhores nas freadas e nas curvas”.

Donohue coloca a questão em outros termos. “Gasta-se muito dinheiro para correr na F1 sem necessidade, pois é possível ser tão quase tão rápido com muito menos investimento. Os F1 são menores, mais leves e provavelmente serão mais rápidos na corrida, mas nossos carros são aproximadamente dez vezes mais baratos”.

O circuito de Ontario era mais utilizado como um oval, mas possuía uma seção ‘infield’ que os pilotos pareciam gostar. Um deles, não identificado, no vídeo, diz: “É um circuito completamente artificial. Era pra ser um desastre, mas certamente é uma das pistas mais desafiadoras do país”. Os pilotos europeus também manifestaram apreço.

Os espectadores, no entanto, não compartilhavam da opinião. Enquanto a média de público nas provas tradicionais era de 80 mil, essa prova não atraiu mais que 55 mil pessoas.

Como previsto, os F1 voaram: pole para Jackie Stewart, vitória nas duas baterias para Mario Andretti. Destaque para Donohue.

Os vídeos abaixo mostram a primeira e a segunda baterias. Divertido ver a Fórmula 1 com os trejeitos ianques, como largar em movimento. Valem também pelos pegas na grande reta, os carros tomando a curva 1 do oval. Enfim, uma simbiose inimaginável entre as corridas internacionais e o ‘american way of racing’.




Friday, January 8, 2010

Formação de mão de obra, o próximo problema da F1


A formação de pilotos de competição é uma questão razoavelmente discutida no Brasil – ou a falta dela. Com o declínio das categorias de base no país especula-se que em menos de uma década o país não mais terá um piloto capaz de pilotar competitivamente na Fórmula 1. Apesar de boa parte da intelligentsia automobilística estar a par do problema, ele ainda não possui um (cada vez mais urgente) encaminhamento prático.

No entanto, existe outra questão subjacente, que é um problema não apenas brasileiro, mas mundial: a formação de mão de obra técnica para a Fórmula 1. Categorias de base existem aos montes em diversas partes do mundo, com ênfase na Europa – mas não apenas nela.

O problema surge a partir dos anos 90, com a standardização. Isso significa que séries de competição antes abertas a novos projetos vêm se tornando cada vez mais realizadas com um único motor e um único chassi para todos os inscritos.

Em princípio parece um bom negócio para os pilotos, já que, com (teoricamente) o mesmo equipamento, podem ser mais bem avaliados conforme seu potencial. No entanto, jovens engenheiros e projetistas que antes tinham a chance de colocar em prova suas ideias perderam completamente o campo de atuação.

Os casos mais ilustrativos talvez tenham ocorrido com as Fórmulas 3000 e 3. A primeira foi concebida, em 1985, como um campeonato completamente aberto. Já no ano seguinte os pneus foram uniformizados. Em 1996, ela se transformou em categoria monomarca.

As diversas Fórmula 3 existentes na década passada não tiveram como competir contra categorias monomarca similares, tais como Fórmula Renault ou World Series. Sendo mais baratas para as equipes, os grids minguaram. Muitas delas enfraqueceram até o desaparecimento, e outras resistem bravamente ou adaptando-se à estandardização.

E se um engenheiro disposto a trabalhar em projetos para competição não encontra um lugar para exercer seu gênio, ou ele eventualmente chega à Fórmula 1 menos preparado, ou ele muda de ramo - o que é ruim, a longo prazo para o esporte.

Os efeitos da estandardização já são mais do que patentes nas categorias de base. A Fórmula 3000 foi extinta em 2004, entre outros motivos, por problemas relacionados ao projeto do carro, e a estréia da GP2 foi marcada por problemas estruturais graves dos monopostos, no ano seguinte – principalmente relacionados aos freios.

E quem acompanhou a estreia da nova Fórmula 2 em 2009 pôde notar desde o início rodas dianteiras que se soltavam com imensa facilidade dos braços da suspensão. Uma delas fatalmente direcionada a Henry Surtees.

Isso talvez explique a permanência, na Fórmula 1, de engenheiros que freqüentam os paddocks da categoria desde o início dos anos 80: Ross Brawn, Adrian Newey... Até mesmo Mike Gascoyne voltará ao circo com a nova Lotus. Em comum, todos tiveram que projetar, antes de chegar lá, um carro que competisse com outros de mesma especificação e se sobressaísse. Aparentemente, emprego não lhes faltará.

Wednesday, January 6, 2010

Bristow, Stacey, Camus


O ano de 2010 marca os 50 anos de três mortes que valem a pena ser registradas.

Duas delas ocorreram em um intervalo de minutos, a metros de distância uma da outra. Era o dia 19 de junho de 1960, e o GP da Bélgica se realizava em Spa-Francorchamps. Os muitos espectadores que se aglomeravam ao longo da rápida e perigosa curva Burnenville, tomada à direita, puderam ver a vida de dois britânicos terminar tragicamente.

Primeiro a de Chris Bristow, jovem com poucas provas no currículo, conhecido por seus colegas como “o selvagem” por ter batido ou rodado em quase todos os eventos em que participou.

Cinco voltas depois Alan Stacey, também jovem mas bastante experiente, tido como conservador na pista e carismático fora dela, encontra o mesmo fim de seu compatriota. Ao contrário de Bristow, a fatalidade de Stacey não se deu por erro de pilotagem, mas por ter sido atingido na cabeça por um pássaro.

A perplexidade e, talvez, o absurdo destas duas mortes é reforçada pelo acidente do também inglês Stirling Moss, um dia antes, quase ter morrido na mesma Burnenville. Embora a região seja conhecida pelas chuvas constantes, os acidentes todos aconteceram em pista seca sob sol forte.

A terceira morte é a de Albert Camus, que jamais pilotou um carro de corrida. Era filósofo. Morreu seis meses antes de Bristow e Stacey, no dia 4 de janeiro (há dois dias a data foi extensamente lembrada pelos jornais). Argelino de origem francesa, um dos escritores mais ativos de seu tempo (como atesta seu Nobel recebido aos 44 anos de idade), também morreu a bordo de um carro – em uma estrada da França, no banco do passageiro. O motorista em questão, Michel Gallimard, e os outros ocupantes do veículo, sobreviveram.

A morte de Camus ganha destaque aqui porque de certa foram encerra as muitas mortes que a Fórmula 1 nos legou. Um obscuro documentário sobre sua vida, Albert Camus, la tragédie du bonheur (França, 1998), traz um depoimento de um amigo cujo nome não mais me recordo.

Ele relata o telefonema que recebe dizendo que Camus havia sofrido um acidente de carro. “Ele está morto?”, questiona. “Sim”, do outro lado da linha. “Como foi, como aconteceu?”. “Era uma estrada deserta, seca e retilínea”.

“Deserto, seco, retilíneo”, conclui o amigo, “é o destino, é o destino”.

Sunday, January 3, 2010

Cartazes - GP da África do Sul 1963


Quando entrou no calendário no campeonato mundial de pilotos, em 1962, o GP da África do Sul era disputado no autódromo de East London. Naquela região os primeiros GPs do país haviam sido realizados, nos anos 30, em uma localidade de não muito fácil acesso na costa leste do país.

E no entanto era um lugar agradável, principalmente pela proximidade com o mar, que o cartaz acima, da corrida de 1963, destaca ao fundo. O enorme céu azul desenhado também deve ter influenciado positivamente a opinião dos europeus. No mais, é um cartaz que nos coloca dentro da pista, em alta velocidade, possivelmente sentados em cima do motor do carro que vai à frente. Os monopostos parecem inspirados nos Cooper que dominaram as pistas até 1960. Curioso, para os leigos, notar a data do evento: 28 de dezembro.

Friday, January 1, 2010

O ano da Copa, o país da Copa


Anos de Copa do Mundo (e, por que não, de Jogos Olímpicos também) costumam ser desgastantes para os devotos do esporte a motor: cobertura mais restrita, mudanças de horário e diminuição de interesse do público amplo são alguns dos transtornos. Este ano será um deles.

Até que a Copa comece, no meio do ano, ela dominará a pauta do noticiário esportivo e tenderá a asfixiar um pouco além do normal outras discussões. Quando ela começar, entretanto, o panorama será bem pior.

Lutar contra tal tendência é estúpido. Por isso mesmo que decidi me juntar a ela desde o primeiro minuto deste ano. E meu maior aliado será justamente o país da Copa.

A África do Sul, afinal, tem uma história riquíssima nas pistas. E aproveitando a tradicional falta de informação nova que abala a Fórmula 1 e o automobilismo em geral, o país será o carro-chefe deste espaço ao longo do mês de janeiro.

Antes que me perguntem, nunca fui à África do Sul, não conheço sua cultura e sua sociedade presencialmente. Estou desautorizado, portanto, a emitir alguma opinião confiável a respeito do tema em si. Por outro lado, reuni ao longo dos anos muitos dados sobre a competição automotiva por lá, e o momento me parece propício para compartilhá-los aqui.

Há mais de 15 anos este país não figura mais na elite do automobilismo, mas ao longo do século passado ele exerceu certo protagonismo. Algumas Grandes Épreuves foram realizadas lá nos anos 1930, atraindo carros e competidores europeus. Ao final dos anos 50, quando a Fórmula 1 começava a se estruturar melhor, um GP sul-africano no campeonato começou a se delinear, realizando-se de fato em 1962.

Durante os anos 1960 e até 1970 o país se colocava como uma espécie de "residência de verão" para os grandes pilotos e equipes da Fórmula 1 que fugiam do frio do Velho Mundo. Tal dinâmica perdurou até meados dos anos 1980, quando o GP sul-africano foi extinto. Chegou a retornar no início dos anos 1990, apenas por um biênio, até cair no ostracismo. Durante o auge, a África do Sul produziu uma safra de pilotos talentosos, com destaque para Jody Scheckter, que seria campeão mundial; e até mesmo um campeonato de Fórmula 1 próprio era promovido por lá.

Como não poderia deixar de ser, o esporte a motor sempre esteve sujeito a pressões políticas e econômicas, das quais a nação jamais deixou de sofrer. A insustentabilidade do regime apartheid emergia desde a metade do século XX. Mantendo-se relativamente distante no início, a Fórmula 1 também não pôde ignorá-lo e dele mesmo acabou por padecer: a execução de um dissidente negro em 1985, a poucos quilômetros do autódromo de Kyalami, na semana da realização do GP, transformou a corrida num ridículo detalhe. Em 1992 e 1993 o regime segregacionista já tinha arrefecido - Nelson Mandela até circulou pelo paddock no derradeiro evento -, e cairia em definitivo um ano depois. Mas a reconstrução do tecido social do país, problemático até os dias de hoje, minou os recursos necessários para um parque automobilístico e para outras futilidades.

Durante o mês que se segue, gostaria de entregar ao leitor um aprofundamento na história da Fórmula 1 na África do Sul. Inserida no contexto da história africana, podemos ver algumas semelhanças: tão trágica quanto fascinante; se ela pode nos trazer alguma lição, é a de que o mundinho das corridas jamais pode voltar as costas para o que acontece no mundo lá fora. Aí está a sua beleza.