Sunday, March 29, 2009

GP da Austrália 2009 - Acidentes esperando para acontecer



"We are accidents waiting/
Waiting to happen"
There There, Radiohead



Foi um pódio de desacreditados. Trulli, porque ninguém acreditava que um bom resultado seria possível saindo da última fila. Barrichello desfrutava de uma dupla desforra: por pensarem que a carreira dele havia terminado e por pensarem que a corrida dele terminaria na primeira curva após a largada. Button era o símbolo do triunfo da Brawn GP, aquela equipe pobre, surgida do espólio de uma equipe horrível.



(Mais tarde foi decidido que a desforra de Trulli caberia a Hamilton, vá lá, esse é outro que está desacreditado na temporada. O italiano teria feito uma ultrapassagem em bandeira amarela- ok Race Control, vou fingir que não estou questionando dessa vez.)



Impossível não sentir apreço por essa equipe que não pode mais ser chamada de ex-Honda, assim como foi impossível não reparar em como Button cumprimentou Barrichello após a prova. Ou como os dois conversavam paralelamente durante a entrevista coletiva. Nota-se que são cúmplices no resultado, que correm como equipe.



No mais, além de uma desforra, o que foi o GP da Austrália?



Foi a prova de que o pacote aerodinâmico funciona. Os carros ultrapassam com mais facilidade, algo tão estranho à Fórmula 1 que por mais de um momento parecia uma corrida de kart.



Se as ultrapassagens voltaram a ser viáveis, a categoria também perdeu um pouco daquele ar racionalista, de jogo de xadrez, e se partiu para o corpo-a-corpo. Que o diga Kubica, com pneus duros, versus Vettel, com pneus de classificação que resolveram chamar de "moles".



E após todos os cálculos, todas as estratégias de pit stop, os dois se encontraram na pista. E a Fórmula 1 voltou a ser o que era. Pois somos todos acidentes, esperando para acontecer.



Race Control

Durante a transmissão da prova, pela primeira vez apareceu uma bancada composta por senhores de terno. O Race Control finalmente ganhou um rosto. Estes senhores de terno decidiram punir Vettel pela colisão entre ele e Kubica com a perda de dez posições no grid mais multa.



Para o Race Control, as batidas são indesejáveis (por destruírem o logotipo dos patrocinadores?) e alheias à natureza do automobilismo. Como postei em um texto recente, Contardo Calligaris diz que após dois séculos higienistas só é dado ao homem civilizado ver a morte de perto em esportes na tv. Mas se a higiene extrema já chegou a Fórmula 1, por que continuaríamos assistindo suas corridas? Para engoradar os bolsos de outros homens de terno?

Saturday, March 28, 2009

Duplo twist carpado, com leve desequilíbrio


Já foi dito que a Fórmula 1 está mais emocionante, que o jogo de forças entre as equipes mudou. Como já disse em um post anterior, não presto tanta atenção nas mudanças repentinas que ocorrem na categoria. As mudanças silenciosas e graduais é que são as mais importantes.


Hoje fui dormir com um grid formado e acordei com outro. Três punições. Não sei se alguém se lembra como as classificações costumavam ser mais simples.


A Fórmula 1, ou melhor, o Race Control pune cada vez mais. Não é um fenômeno novo (basta clicar na tag Race Control, neste blog, para ver como ele já dura algum tempo), mas é um fenômeno crescente.


O resultado é que a Fórmula 1 parece mais um jogo de tabuleiro. Jarno Trulli e Timo Glock jogam os dados e caem em suas respectivas casas, que os obriga a tirar uma carta do monte. "A aerodinâmica do seu carro está fora do regulamento, largue do fim do grid". Hamilton tira a sua carta: "Você trocou seu câmbio, recue três posições".


Desde 2003 a categoria se parece menos com um esporte a motor e mais com uma competição de ginástica olímpica, dependente de um júri para deliberar sobre a validade de pequenos detalhes que escapam aos olhos do espectador.


E isso traz a inevitável pergunta: será que tornar as regras cada vez mais ininteligíveis para o espectador é uma atitude deliberada? Alienar quem está assistindo é uma maneira de deixá-lo menos crítico? De fazê-lo assimilar tudo o que acontece como 'lógico'?


Acompanhe logo mais as 'fantásticas ultrapassagens' que as Toyotas farão em uma 'emocionante corrida de recuperação'.

Thursday, March 26, 2009

Columbine, Calligaris e gasolina (parte 2)

Retomando a coluna de Contardo Calligaris (Folha de S. Paulo, 19/03/2009), ele conclui sua argumentação da seguinte forma (grifos meus):

"Na aurora da modernidade, Hegel escrevia que o desprendimento em encarar a morte de perto era a marca do mestre. Depois de dois séculos higienistas, que fizeram a apologia da sobrevivência a qualquer custo, nestas décadas em que arriscar a vida num esporte extremo é apenas um entretenimento televisivo, talvez, aos olhos de alguns, a verdadeira marca do mestre pareça ser o desprendimento em matar."

Voilà! Onde se lê ‘exporte extremo’ leia-se ‘automobilismo’, e este pequeno parágrafo fala mais sobre corridas do que todos os jornais e blogs especializados, meu inclusive, falaram nos últimos quatro meses.

A afirmação de Hegel encontra fundamento em inúmeras fontes, desde romances até costumes de tribos amazônicas. Os dois séculos higienistas, o colunista gentilmente me confirmou tratar-se de uma referência foucaultiana.

Calma gente, explico. O próprio termo ‘higiene’ parece ter sido criado nesses últimos 200 anos, ao menos no sentido que o usamos. Foi no fim do século XIX que Louis Pasteur descobriu a vida microscópica e passamos a lavar as mãos antes de comer. Mais que isso, só muito recentemente os hospitais foram divididos em alas, e os tuberculosos passaram a ser tratados muito longe dos amputados e assim por diante.

‘Higiene’ não se refere apenas à medicina. Podemos dizer que colocar corredores e grades nas masmorras, transformando-as em prisões, foi uma medida de higiene social. Há 200 anos as residências européias (e mais tarde as brasileiras) das classes baixas começaram a ganhar algo inovador: paredes internas; inventaram os cômodos, o quarto dos pais separado do quarto dos filhos, a cozinha separada dos quartos e uma sala de estar na entrada.

Higiene é algo bom? Depende. Hitler, para exterminar doentes, ciganos e judeus, não invadiram casas em plena luz do dia nem derramou sangue nas ruas (os otomanos, 20 anos antes, ainda impalavam inimigos). Ao invés disso, construíram campos de concentração e extermínio longe dos centros urbanos, com uma divisão racional do espaço e intrincados cálculos logísticos. Pode-se dizer que os nazistas foram higiênicos.

No entanto, em geral pode-se dizer que os procedimentos de ‘limpeza’ foram utilizados nos últimos anos sempre para preservar a vida. Na época de Hegel, era comum artistas pintarem os leitos de morte de figuras da sociedade. Como seriam estas pinturas hoje? Uma sala branca com uma cama verde clara com alguém cheio de tubos deitado com pessoas mascaradas em volta, talvez? Hoje se morre sozinho, longe de qualquer parente ou amigo.

Penso que é nesse contexto que devemos pensar que o esporte a motor surgiu. Num mundo cada vez mais asséptico, mais seguro, é certamente mais difícil perceber que estamos vivos. Ao mínimo avanço tecnológico, portanto, foi natural que indivíduos se sentissem dispostos a disputar corridas, e mais natural ainda que muita gente se dispusesse a assisti-las - vale lembrar que o automobilismo e o cinema foram criados na mesma época.

Não acho necessário ressaltar como o automobilismo foi um esporte perigoso durante 60 anos. O fato é que ele passou a ficar mais seguro. Pode haver controvérsias quanto aos fatores que operaram essa mudança, porém há um dado inegável: a escalada da segurança na Fórmula 1(único protótipo possível do automobilismo como um todo) coincidiu com a chegada da televisão. A diferença entre a Fórmula 1 dos anos 60 e a dos anos 80 era que, na primeira década, ela era um entretenimento. Na outra, era um entretenimento televisivo.

Isso vai contra o que diz Calligaris? De forma alguma. Apesar de a morte ter sido quase banida da Fórmula 1, ela ainda permaneceu por um bom tempo como possibilidade. É discutível se essa possibilidade tem subsistido nos últimos 15 anos. Mas não fosse a morte, existiria diferença entre acordar domingo de manhã para assistir a uma corrida de carros ou a uma maratona?

A conclusão desse raciocínio não poderia ser mais cruel. Se Calligaris diz que o projeto de civilização moderna subtrai o senso de existência e identidade do indivíduo, então devemos nos questionar: será que é para isso que foi criado o automobilismo, para que nos devolva a noção de morte? O automobilismo sem morte serve para quê, então?

Não é a toa que o regulamento da Fórmula 1 se torna mais confuso e questionável a cada ano. Ecclestone e Mosley, assim como nós, estão completamente perdidos no mundo atual. E ninguém sabe que respostas dar às perguntas acima.

Wednesday, March 25, 2009

Columbine, Calligaris e gasolina (parte 1)

Se quiserem entender de automobilismo, leiam o caderno de esportes por último, ou melhor, nem leiam- a poucos dias do início da temporada de Fórmula 1 2009, acho um bom momento para fazer afirmações radicais.

Os jornais, ou melhor, a divisão dos jornais em cadernos é um dos maiores problemas do jornalismo impresso do qual ninguém fala. É por causa disso, por exemplo, que a cobertura das pré-temporadas da F1 são tão arrastadas e cheias de boataria.

Tudo isso pra dizer que semana passada li um artigo sobre automobilismo escrito por Contardo Calligaris, no caderno Ilustrada, da Folha de S. Paulo (19/03/2009). Na verdade, nem a palavra “automobilismo” estava escrita: era um artigo sobre assassinos em massa que matam dezenas em um só dia e freqüentemente se matam depois. Como aqueles de Columbine.

Calligaris, psicanalista cujas colunas acompanho faz tempo, começa traçando um panorama dessas ocorrências e aponta a dificuldade de estabelecer um padrão de motivos que levam pessoas a cometer tais atos: umas são mais abastadas, outras menos, é indiferente terem emprego ou não, terem relacionamento conflituoso com as vítimas ou não.

Dois pontos, no entanto, emergem como denominadores comuns: os algozes são sempre homens, e a matança é sempre pública (nunca o assassino está escondido). Ou seja, os gestos são atitudes masculinas que precisam ocorrer em frente aos olhos dos outros. Uma conclusão arrebatadora vem a seguir. “A identidade da gente é um tecido de imagens incertas; nesse jogo de espelhos, há poucos atos ‘reais’, que possam dizer a que viemos sem que seu sentido dependa do olhar dos outros. Como dizia um psicanalista famoso, é possível que haja só dois atos dessa qualidade: dar à luz e morrer. Claro, para ‘meninos’ só sobraria morrer. Mas acrescento: morrer e, talvez, matar”.

Ok, mas... o que o automobilismo tem a ver com isso? A resposta vem amanhã no próximo post (caso contrário, este ficaria muito longo e teórico, e poucos de vocês chegariam até o fim). Antes, porém, é interessante analisar alguns dados fornecidos por Calligaris: segundo ele, há uma epidemia de tais casos nos EUA, desde Columbine em 1999, e na Alemanha, desde 2002. De fato, nesses dois países ocorreram massacres do tipo agora mesmo, em março. Houve um caso na Escócia, em 1996, e dois na Finlândia, anos passado e retrasado.

Alemanha e Finlândia, dois países que, juntos, levaram sete títulos mundiais de F1 nos últimos dez anos. A Escócia tem tradição no esporte, e em meados dos anos 1990 Coulthard era um piloto promissor, lembram? Quanto aos EUA, faltou o colunista ressaltar que os massacres se concentram no sul do país... onde a Nascar é extremamente popular.

Claro que pode ser apenas uma enorme coincidência, mas que o automobilismo está completamente imerso nas sociedades onde foram registrados tais eventos, ah ele está.

Saturday, March 21, 2009

O erro de Bernie e Max – ou regras básicas para fazer carros andarem em círculos

Durou algo em torno de 72 horas a mais nova regra desportiva da Fórmula 1, e mesmo assim ela foi suficiente para encher laudas e laudas de posts blogosfera afora. Visto que o piloto com mais vitórias não será, obrigatoriamente, o campeão da temporada de 2009, hoje o dia é de alívio.

A Folha de S. Paulo se arriscou a comentar os motivos do imbróglio (infelizmente, a parte mais interessante do texto foi suprimida por um erro de diagramação). Fábio Seixas, no mesmo jornal, arrisca especular sobre as manobras dos bastidores que culminaram na polêmica. Este, porém, não me parece ser o centro da questão.

Por mais que seja um momento otimista, é importante observar que a Fórmula 1 não é menos business e mais esporte por causa da anulação da regra das vitórias. Nem porque ‘surgiu’ uma nova ‘força’ na Fórmula 1 para combater os desmandos de Ecclestone e seu títere Max Mosley. Ninguém vai deixar de ganhar um euro só porque o regulamento desportivo se mantém inalterado de 2008 para 2009.

O que aconteceu não foi a violação de um simples artigo do Código Esportivo, mas uma quebra do pacto estabelecido entre a Fórmula 1 e o espectador. É um pacto que não está escrito em lugar nenhum, mas está colocado claramente toda vez que você senta na poltrona e liga a tv para ver carros andando em círculos. Acima de tudo, é fácil perceber quando ele é violado: vide o GP da Áustria de 2002.

O erro de Bernie e Max foi quebrar este pacto para exercer um melhor controle sobre o campeonato – caso a regra das vitórias valesse para o ano passado, a desclassificação de Hamilton no GP da Bélgica teria certamente determinado o título a favor de Massa. Se o intento da FIA fosse apenas privilegiar as vitórias, por que não pleitear a reimplantação do sistema de descartes, que vigorou por quarenta anos e quase nunca foi questionado?

Pretendo me alongar mais na questão do pacto com o espectador em breve, mas não acho grave o fato de ele ter sido quebrado: quando isso acontece, quase sempre volta-se atrás. O problema é que ele é plástico, não estático, pequenos adendos são feitos a ele com o passar do tempo. As mudanças lentas que ocorrem na Fórmula 1 são as mais perigosas.

Basta perceber como os avisos de ‘Race Control’ durante as transmissões têm aumentado um pouquinho mais, e têm sido um pouquinho mais determinantes ao longo das últimas temporadas. Nada indica que essa tendência diminuirá.

Friday, March 20, 2009

Um GP da Austrália com luz artificial


Nos últimos anos Bernie Ecclestone tentou, sem sucesso completo, transformar o GP da Austrália em um evento noturno. Este ano, a largada será ao fim da tarde, mas os organizadores foram irredutíveis em fazer uma corrida sob luz artificial. De fato, da última vez que houve um GP da Austrália sob luz artificial, ninguém ficou muito satisfeito.

Mas como assim, um GP da Austrália sob luz artificial?? Sim, pois é. Não na Fórmula 1, é claro, mas na antiga Indy, o GP em Surfers Paradise terminou com a iluminação pública ligada (e mesmo assim no breu). O ano era 1994.

A largada havia sido atrasada por causa da areia que invadiu a reta paralela à praia no circuito de rua, quando a chuva começou a cair. Como resultado, a prova só teve seu início 2h30 após o horário previsto. A pista ainda estava molhada e pelo menos dois acidentes isolados ocorreram na primeira volta – um deles antes até de os carros cruzarem a linha de início -, não impedindo Michael Andretti de superar Mansell na largada.

Quando a bandeira verde volta o asfalto já está seco o necessário para que os carros rodem com slicks. Após os pits, Andretti continua implacável na liderança. Apenas 15 voltas depois uma garoa atingiria o circuito fazendo o piloto a Ganassi escapar – por sorte, uma barreira de pneus amorteceu o impacto e não causou maiores danos.

Atrás dele, Fittipaldi, como sempre em Queensland, mantinha um bom ritmo, enquanto Mansell e Robby Gordon repetiam, nas mesmas curvas e com os mesmos atos, a disputa do ano anterior: o americano ultrapassa o inglês que, cinco voltas depois, se recupera e dá o troco. Ao contrário de 1993, no entanto, a corrida não acaba bem para ambos. Mansell roda durante a garoa e perde mais de uma volta enquanto espera a ajuda dos comissários, perdendo assim todas as suas chances. Gordon abrevia sua corrida ao entrar rápido demais em uma chicane e vai de encontro ao muro.

O terceiro colocado, então, era Mario Andretti. Havia acabado de anunciar sua retirada das pistas ao fim do ano, alinhara na décima fila e ninguém viu direito como tinha chegado na frente.

Na verdade, a visão de todo mundo se embaçou ao fim da segunda rodada de pit stops. A tarde caía, as luzes da cidade acenderam, a pista escureceu e o locutor da ABC garantia que a imagem que se via nas câmeras era muito mais clara do que se podia notar a olho nu.

Fittipaldi diminuía a diferença para Michael Andretti. Cabe ressaltar que Andretti acabava de chegar, desmoralizado, da sua desastrosa passagem pela Fórmula 1, querendo a todo custo recuperar sua reputação. A Ganassi, sua equipe, jamais havia ganhado uma corrida. A Reynard, seu chassi, estreava na categoria – e jamais havia perdido uma corrida de estréia.

Chip Ganassi gritava aos comissários para que a corrida terminasse. A escuridão avançava e, ao fim, foi decidido que a corrida seria reduzida em dez voltas. As quatro voltas seguintes foram indescritíveis. As posições se mantiveram. Andretti estava vingado.

Ao ser entrevistado após deixar sua Penske, Fittipaldi sorria como uma criança. Declarou à tv americana que o circuito não estava perigoso, mas que as últimas três voltas foram muito escuras. Mario Andretti foi mais enfático: “Cada vez que eu faço isso, ganho dez anos de vida”.

Experientes sim, mas seria injusto dizer que o tempo deles já havia passado.

Wednesday, March 18, 2009

A equipe de Brackley: 1995- presente


“Na Williams eu aprendi como se devem fazer as coisas. Já na Tyrrell eu aprendi como não se devem fazer as coisas”. Quando a British American Tobacco comprou a equipe e Ken Tyrrel para erguer sobre ela a BAR, colocaram o autor desta frase como principal diretor técnico da nova equipe. Seu nome: Craig Pollock.

Na época, em 1999, tinha 42 anos, era um escocês que rodava o mundo com passaporte suíço. Prometia transformar a apagada Tyrrell em um time vencedor, e não começou timidamente. Mudaram a equipe de Ockham para Brackley, onde uma recém-construída fábrica de 41 mil metros quadrados com equipamentos de ponta os aguardavam.

A BAR surgiu em uma manhã, logo após a vitória de Jacques Villeneuve nas 500 Milhas de Indianapolis, em 1995. Numa mesa, estavam o piloto, Pollock, amigo deste, Adrian Reynard (construtora britânica de chassis, ligada na época à Indy) e um diretor da BAT, esta já ligada a Villeneuve. Menos de quatro anos depois, alinhavam seus carros no grid da Fórmula 1.

O plano original de Pollock e da BAT era aproveitar o staff da Tyrrell – afinal, a equipe inteira, e não apenas as vagas no grid, estavam incluídas nos US$ 24 milhões. No entanto, os funcionários de Ken, talvez motivados pelo desprezo com que Pollock tratou o time em frases como esta acima, se dispersaram. Um deles foi Neil Davies, mecânico que constava na folha de pagamento desde os primórdios, e que possuía tanto status lá dentro que, no inverno de 1970, quando Ken Tyrrell decidiu construir seu próprio Fórmula 1, ele confidenciou seu plano a apenas quatro pessoas – Davies era uma destas.

“Não fiquei muito impressionado quando Adrian Reynard foi a Ockham falar conosco, então decidi me aposentar”, contou Neil à revista MotorSport. “Ele nos disse que jamais a Reynard havia desenhado um carro que não conquistou uma pole. ‘Cara, isso é Fórmula 1, você vai se surpreender’ eu pensei”.

Dessa forma, a maior parte do quadro de 202 funcionários da BAR vieram da Williams, incluindo postos-chave como o de Jock Clear, engenheiro de pista de Villeneuve. Antigos empregados da Benetton, Ferrari e da McLaren passaram a frequentar Brackley. “Quero ter a equipe mais profissional da categoria”, afirmou Pollock.

Mas o tempo começou a provar que Neil Davies, Ken Tyrrell e seus antigos funcionários tinham razão. Com um motor Supertec, um chassi Reynard de desenho conservador, feito a partir de soluções já testadas, segundo o projetista Malcom Oastler e mais de US$ 100 milhões de orçamento anual, a BAR amargou um ano de estréia sem um ponto sequer. Ironia, a melhor colocação no ano foi um sétimo lugar, conquistado em San Marino por Mika Salo, o piloto de testes.

Os anos seguintes foram de desempenho oscilante entre o acima do esperado e o limbo. Os mais maldosos diziam que se usassem o dinheiro para de desenvolver o carro ao invés de pagar US$ 16 milhões de salário a Villeneuve, a equipe decolaria. Coincidência ou não, em 2004, primeiro ano sem o canadense, a BAR foi vice-campeã de construtores.

À época, o motor já era Honda, os pilotos eram Button e Sato, e a Reynard se empenhara em copiar as fabulosas soluções dos carros da Ferrari.Ingressaram em 2005 esperançosos, apenas para terem um início de temporada desastroso: após punições e os eventos do GP dos Estados Unidos, Jordan e Minardi se colocam à frente da BAR no campeonato de construtores. A situação volta a se ‘normalizar’ no fim do ano.

Em 2006, com o banimento das propagandas de cigarro, a Honda assumiu o nome da equipe, para figurar no meio do grid na primeira metade do ano. Num chuvoso GP da Hungria, finalmente Brackley reporta sua primeira vitória. O fim da temporada é arrasador. Tanto que, se apenas os seis últimos GPs deste ano contassem pontos, Button teria sido o campeão.

Os anos seguintes não precisam de descrição. A Honda se afunda de forma tão humilhante quanto inexplicável. Craig Pollock, porém, já não é o diretor desta equipe, que ele ajudou a construir. Saiu dela em 2002 para dar lugar a David Richards. Richards saiu para dar lugar a Nick Fry e Gil e Ferran, que saiu e deixou apenas Fry no comando.

No início de 1999, a equipe de Brackley era jovem, ambiciosa e rica. Dez anos depois, estava na iminência de um colapso.

Quando Pollock comprou a Tyrrell, ela ao menos tinha um passado de glórias e de projetos ousados. Os últimos dez anos foram uma sarcástica resposta ao comentário jocoso de Pollock. Vamos ver como Brawn se sai daqui pra frente.

Tuesday, March 17, 2009

Hoje é dia

Hoje é dia de sentir raiva.

Hoje é dia de cair na farra.

Hoje é dia de bizarrices.

Hoje é dia de agradecer ao Pandini pela publicação de uma contribuição na qual empenhei algum tutano e tempo. Quem quiser, vai lá conferir!

Hoje era o dia que eu tinha um post pronto há semanas para publicar. Fica pra amanhã, sem falta.

Monday, March 16, 2009

Nota da redação - Nova York

Foi onde estive nos últimos dias. Apesar de ter uma das vidas culturais mais intensas do mundo, a cidade é um agrupamento de 8 milhões de habitantes que don't give a nickle para o automobilismo, o que me desautoriza a falar sobre ela neste espaço - porque ele se chama Cadernos do Automobilismo, caso se chamasse Blog do Daniel Médici, NYC seria o assunto por dias a fio.

Dito isto, não sobra muito paraa falar nesse post. Melhor dizendo, não sobra nada.

A muito custo, encontrei F1 Racing perdidas no alto de uma prateleira de uma revistaria da Grand Central, além de uma Sporting News especial da Nascar: não gosto e critico, mas respeito culturas diferentes. A minha primeira aquisição, no entanto, é uma das melhores que fiz: só para dar um exemplo, tem uma matéria sobre os bastidores das filmagens do filme Grand Prix. Quem sabe o blog lucre um pouquinho, afinal, com essa passagem pela Big Apple...

Friday, March 6, 2009

Nota da redação - Semana de férias

Caros,

Visto que ao menos outros 35 blogs postaram hoje sobre a Brawn GP, creio que minha opinião sobre ela não fará diferença. Comunico que o blog não deverá sofrer atualização até o dia 16 de março. Também não devo estar presente nas páginas de comentários que costumo frequentar.

Sou suspeito para dizer, mas prometo voltar com ótimos posts. Quem continuar acompanhando o Cadernos do Automobilismo não se arrependerá.

O motivo do recesso, conto dia 16.

Thursday, March 5, 2009

Será que a nova equipe americana vai se parecer com isso?


Chamava-se Haas Lola e nasceu no fim de 1984, quando Carls Haas propôs à patrocinadora de seu time na CART, a Beatrice Foods, a idéia de uma equipe para a Fórmula 1. Dado o sinal positivo, pôs as mãos à obra. Contratou Teddy Mayer, ex-McLaren, para co-dirigir a empresa, estabeleceu uma fábrica em Colnbrook, Inglaterra, e criou a FORCE, espécie de estúdio de design que teria Neil Oatley como chefe.

O patrocinador previa três anos de contrato e, a partir de 86, a equipe receberia os novíssimos motores Ford Cosworth Turbo. Em fevereiro, encomendaram a construção do carro à Lola. Esta, por sua vez, nunca se envolveu no projeto. Haas, porém, increveu “Lola” como nome do construtor porque era o importador oficial da fábrica nos Estados Unidos, aumentaria a visibilidade do seu negócio.

O Team Haas (USA) Ltd estreou no GP da Itália de 1985, com o Lola THL1, um motor Hart e o re-ressucitado Alan Jones ao volante.

Os ianques sempre tiveram uma queda por Jones. Sua última vitória foi em Las Vegas e a vergonhosa primeira vez em que tentou retornar às pistas ocorreu em Long Beach (depois conto melhor essa história).

Em Monza, no entanto, o conjunto não parece ter dado muito certo. Aliás, o conjunto não: um componente. “Parece que os motores duram menos que os pneus de qualificação”, declarou o piloto. De fato, o Hart quebrou depois de seis voltas na corrida, após incontáveis problemas durante os treinos.

Até o fim do ano, só houve abandonos, todos pela mesma causa. A primeira classificação veio na segunda corrida de 86, com o companheiro de Jones, Patrick Tambay: oitavo e último no GP da Espanha. O novo motor Ford e o novo Chassi, o THL2, estrearam apenas na prova seguinte, em Imola.

A partir daí, sofreram mais problemas ainda. Até a metade do campeonato, haviam cruzado a linha de chegada apenas três vezes. No GP da Alemanha, finalmente, ambos os carros terminaram. Na Áustria, o que parecia impossível: Jones chega em quarto e Tambay em quinto. O australiano ainda marcaria mais um ponto, na Itália

Nos bastidores, porém, o fim da equipe começa a se desenhar. Uma troca de administração da Beatrice no fim de 85 faz com que a empresa desista do patrocínio da equipe de Haas. No fim de 86, ela anuncia que não apoiará a equipe no ano seguinte. Haas tem os carros, os motores, os pilotos, mas ninguém para bancar. E assim acaba a última empreitada estadunidense na categoria. As instalações da FORCE são vendidas à Brabham, Oatley vai para a McLaren, Mayer e seu sócio voltam aos EUA. A Lola, agora sim com projeto próprio, se associa a Gérard Larousse. Jones e Tambay nunca mais retornam à Fórmula 1.

Mais de 20 anos depois, uma equipe estadunidense com ares ufanistas quer construir um carro na Europa para correr na Fórmula 1. Para isso, pretendem contratar um piloto experiente, sondando inclusive Rubens Barrichello. Nada de novo sob o céu.

Tuesday, March 3, 2009

Quem disse que Amon não venceu?


Aqueles que preferem ver o automobilismo através das tabelas de campeonato sem dúvida não se deterão em Chris Amon. Com um pouco de sorte, encontrarão uma única vitória em seu currículo de Grands Prix disputados, na Argentina em 1971, corrida de Fórmula 1 não-válida para o campeonato.

Não verão porém suas performances brilhantes, como, por exemplo, no GP da Espanha de 1969. E com muita surpresa descobririam, talvez, que Amon detém o título de campeão da Tasman Series deste mesmo ano.

Pode-se se argumentar que a Tasman Series já não estava no auge. Longford havia sido desativada, o campeão do ano anterior, Jim Clark, estava morto e, pior, com os custos crescentes da Fórmula 1, nenhum construtor estava interessado em desenvolver um chassi especial e um motor de 2,5 litros para um campeonato de dois meses de duração.

De fato, no ano seguinte o regulamento da Tasman mudaria para que se adotassem carros de Fórmula 5000, produzidos em série nos EUA e no Reino Unido, e, com isso, a competição perderia toda sua relevância no plano internacional.

Entretanto, Amon ganhou um campeonato no qual alinharam pilotos do porte de Jochen Rindt, Piers Courage, Graham Hill e Jack Brabham. Venceu quatro provas em sete, totalizou seis pódios.

Amon era um jovem nativo, quase anônimo, quando alinhou para sua primeira corrida válida para a Tasman, em 1964, na etapa de Teretonga, na sua Nova Zelândia natal. As vitórias só apareceram, porém, quatro anos depois, em 1968. Não foi um campeonato qualquer. Os quatro maiores construtores de carros de Grand Prix marcaram presença: Brabham, Ferrari (equipe de Amon), Lotus e BRM, sendo que esta última e a Cosworth desenvolveram motores especiais para o campeonato.

Chris faturou as duas primeiras corridas, Pukekohe e Levin (ambas em seu país de origem). A primeira prova foi tumultuada e cheia de acidentes, e marcada pelo abandono de Clark enquanto liderava. Em Levin, também não houve tranquilidade na pista. Amon escoltava os líderes nas primeiras voltas quando herdou a liderança. Atrás dele, Clark descontava uma diferença de 26 segundos rapidamente. O escocês crescia em seu retrovisor quando a suspensão da Lotus quebrou. Sem errar, Amon carregou o carro até a linha e chegada. Alguém acha que estas vitórias não tiveram mérito? Alguma vez na vida Amon tinha que ter a sorte a seu lado...

Monday, March 2, 2009

Novidade do dia: não há novidade


Fantástica a notícia publicada no Grande Prêmio hoje: "Porta-voz da ex-Honda afirma: sem novidade". Irretocável. Em primeiro lugar, como alguém pode ser porta-voz de algo que não existe?

Como se pode ler na matéria, o autor dessa importantíssima afirmação sequer é nomeado. "Não temos nenhum comentário ou atualização a fazer sobre a situação da equipe", disse alguém não identificado. Tem prêmio Esso vindo aí!

A cobertura sobre a ex-Honda, ou melhor, a não-Honda continua a pleno. Alguém disse, hoje, que Barrichello está de contrato assinado com a não-equipe. Esta não-notícia é manchete principal no Grande Prêmio e destaque no Tazio.

Toda a não-informação está repercutindo e já se começa a indagar se Barrichello não tomou a decisão errada de fechar com a equipe, tirando assim a vaga de Bruno Senna. Aliás, por que "tirar" a vaga dele? O Bruno Senna já foi piloto da (não-)Honda? Que eu me lembre, ele realizou não mais que um teste tão farsesco que poucos dias depois a empresa anunciou sua retirada das pistas. Aliás, a melhor volta dele foi inclusive mais lenta que a do di Grassi, com o mesmo carro.

Quem visita este blog com freqüência, desde antes da abolição do trema, deve se lembrar que o Cadernos do Automobilismo não cansa de afirmar ser contra palpites, pitacos e qualquer "notícia" do gênero. Neste espaço, considera-se que esta prática serve apenas para dar respaldo aos críticos dos blogs, que dizem que são veículos sem produção de conteúdo relevante, feita só para que anônimos vomitem achismos e opiniões de boteco.

Temo dizer que eles estão certos em parte. Mas não devem esquecer que, no que diz respeito ao automobilismo, veículos sérios com jornalistas pagos não se cansam de vender boatos como se fosse notícia. Ou pior...