Não tenho acompanhado de perto os lançamentos dos novos carros da Fórmula 1. Por razões profissionais, meu foco, na última semana, tem sido em passarelas, modelos, roupas - estou envolvido na cobertura da São Paulo Fashion Week.
Apesar de serem dois mundos completamente diferentes, há estranhos paralelos. Há expressões parecidas: "fazer a curva", por exemplo, é entrar na passarela. O próprio local do desfile se assemelha a um autódromo, com as arquibancadas dispostas longitudinalmente ao 'traçado' que as modelos percorrem.
Para quem não sabia nada sobre o mundo "fashion" há um punhado de semanas, até que estou bem informado. Tive a ajuda de um livro que comecei a ler por acaso, "A Linguagem das Coisas" de Deyan Sudjic. A obra fala sobre o design no mundo contemporâneo, mas há um capítulo inteiro dedicado a moda.
"O sistema da moda", diz o autor, "depende de todo tipo de engenhosidade: técnicas de produção em massa, fabricação e tintura do tecido, (...) criatividade dos designers. (...) Exige a criação de uma plataforma apropriada para apresentar as roupas, e noção de psicologia. Mas a moda ainda é tratada como se fosse essencialmente frívola".
Mais do que isso, lembra Sudjic, foi a indústria de tecidos, na Inglaterra do século XVIII, que disparou a revolução industrial e criou o modelo econômico no qual vivemos. A moda emprega milhões de pessoas ao redor do mundo e as integra em um mesmo sistema de produção.
Se você está vestido da maneira que está agora, é porque algum estilista assim determinou.
Da forma como se desenvolveu, tal indústria se viu obrigada a criar um aparato de glamour que culminou nas fashion weeks da vida. Nos desfiles, não interessa tanto aquilo que as modelos estão vestindo, mas a solidificação de uma marca - e isso envolve desde as cores usadas na coleção até qual a celebridade que está sentada na primeira fila. O espetáculo também mistura música e um jogo complexo de luzes. Em vinte minutos, tudo acabou.
Luciano Benetton, nos anos 80, teve diversas ideias geniais que inovaram o universo da moda, no sentido de trabalhar sem estoques e abastecer as lojas com produtos novos. Num mundo que valoriza tanto a imagem, sua sacada de entrar na Fórmula 1 não pode ser encarada como uma inovação menor.
Grandes patrocínios estampados nos carros e, em 1986, surge a equipe que leva seu nome (na foto, Gerhard Berger durante o GP de Mônaco daquele ano). O casamento estava consumado.
O que Luciano Benetton sacou não foi apenas uma nova plataforma de divulgação, mas que o mundo fashion e o automobilismo são muito próximos.
Se a vestimenta estava por trás da primeira revolução industrial, o carro foi o impulso da segunda, em fins do século XIX. Por caminhos diversos, a indústria automobilística usa as corridas também para o fortalecimento de suas marcas - também para a pesquisa de novas tecnologias, mas este é um papel bem secundário.
Sudjic explica com enorme clareza o ponto em que carros e roupas se articulam: "O processo de fazer carros, eletrodomésticos ou computadores tem muitas das características do processo de fazer moda - um processo que não dá sinais de desaceleração. A moda é a forma mais desenvolvida de obsolência embutida, a força motriz da mudança cultural".
Não á toa fashionistas e automobilistas usam tanto uma palavra em comum: "temporada". No modelo econõmico em que vivemos, é preciso criar objetos de consumo numa velocidade impressionante. Dessa forma, o que é a maior inovação em um dia deve ser descartado no outro. Os carros apresentados em Valência nesta semana devem ser obsoletos em novembro ou antes, da mesma forma que o carro na sua garagem não estará mais lá daqui a cinco anos, com quase toda a certeza. Modelos e pilotos 'tops' têm a função de atuar como o combustível dessa roda de consumo.
Tuesday, February 1, 2011
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