Anhembi, segundo e último dia. Após três horas e meia de completo tédio salpicado de chuva leve mas constante, o humor dos torcedores que foram acompanhar a Indy não era dos melhores. Havíamos visto umas nove voltas de corrida, duas delas em bandeira verde, antes que um toró despencasse sobre nossas cabeças nuas (ou seja, protegidas por aquelas capas plásticas baratas), inviabilizando qualquer prática automobilística no circuito em questão.
Os carros voltaram á pista, apenas para dar mais algumas voltas em bandeira amarela e retornarem aos boxes, dando a entender que a chuva, naquele momento leve, continuava inviabilizando qualquer prática automobilística no referido local.
Claro que o pobre diretor de prova, sua bandeira vermelha em punho, ouviu uma série de impropérios após a última interrupção. Ainda bem que, provavelmente, ele não possui tão vasto conhecimento do luso vernáculo.
Não foi culpa dele. De onde eu estava, era possível ver como o "S do Samba" (talvez o pior nome dado a uma curva desde a invenção da escrita) havia virado um lago que nem meia dúzia de carros de serviço conseguiu secar. Na primeira volta, Oriol Servia passou reto nesta chicane, mas retornou ao traçado. Durante esta manobra, passou em cima de uma poça épica. Algo mais comum em corridas de lanchas do que de carros.
E isso não era o pior: na reta da marginal Tietê, com novo asfalto e tudo, dois pilotos alegaram em entrevista terem aquaplanado em segunda marcha - se-gun-da mar-cha.
A rede Bandeirantes, promotora e transmissora da corrida, insistia, na narração radiofônica, que a garoa era um "dilúvio", que o evento era um "sucesso" e que a pista estava em condições "perfeitas". Mentira.
Saí do autódromo encharcado, tremendo de frio. Parecia que minhas pernas pesavam 80 kg cada enquanto as arrastava para a saída. Mas isso não me deixou irritado. O que mais irritou foi a hipocrisia do discurso oficial.
Prefeito e governador se derramavam em elogios à organização, pouco antes de cair a primeira gota do céu. E de fato, como disse em post anterior, isso era verdade; em termos. Houve um erro fundamental. Único, mas catastrófico.
O erro foi montar aquele circuito improvisado. Sabíamos, em 2010, que seu projeto havia sido concluído ás pressas. O sambódromo é estreito demais, o escoamento de água é deficiente demais e, apesar de a estrutura de arquibancadas, restaurantes, estacionamento etc. já estar montada, aquilo não é lugar para se fazer corrida de uma categoria de automóvel de ponta.
Leio agora no blog do Flavio Gomes a definição perfeita do problema: os promotores trataram a prova como um evento social, ignorando as mais básicas peculiaridades de uma corrida de carros. Com isso, a Band conseguiu irritar as milhares de pessoas que compunham o público pagante do evento, que saiu do Anhembi molhado, cansado e sem aquilo que lhe havia sido prometido. Embora não haja registro, o humor dos demais patrocinadores deve ter sido semelhante.
Agora a corrida está marcada para segunda-feira; amanhã. Boa parte dos pagantes não poderão comparecer. Os corajosos que se arriscarem terão que chegar ao Anhembi sem nenhum esquema especial de transporte ou segurança. Os cidadãos comuns de São Paulo estarão privados por mais um dia de ruas vitais para o funcionamento do de-resto-já-enlouquecedor trânsito local.
Algo me diz que testemunhei a última prova da Fórmula Indy nesta cidade. Em alguma outra oportunidade, conto mais sobre como foi.
Foto: Will Power (Penske) corre no circuito de rua do Anhembi enquanto motoristas param seus carros na Marginal Tietê para acompanhar o evento. Crédito: Daniel Médici
Sunday, May 1, 2011
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