Sunday, November 6, 2011

A melhor corrida dos últimos 16 anos

Vettel conquistou seu bicampeonato e ainda faltavam quatro corridas para o fim da temporada. Após duas dessas, a Fórmula 1 vive dias de tédio. Convenhamos, os GPs da Coreia e da Índia foram uma tortura de se assistir.

Este último até gerou certo interesse, pelo choque cultural que o país provocou no mimado círculo da categoria. Dentro da pista, em que pese certos encontros desfortunados entre Hamilton e Massa, ao insone espectador nada mais foi oferecido que um par de intermináveis procissões.

Inevitável comentário: agora que o título está decidido, para que se dar ao trabalho de ligar a TV? Estranho... desde meados de maio já era mais ou menos óbvio que, salvo catástrofe, a taça de 2011 tinha as mãos de Vettel como endereço.

Em todo caso, não culpo quem prefira ignorar o resto do campeonato. Mas o fato de o campeão já estar definido, por si só, não é motivo para tantos bocejos após a largada.

Porque uma das melhores corridas das últimas duas décadas aconteceu justamente quando a temporada já tinha seu campeão e não havia mais nada em jogo. Estou falando do GP da Austrália de 1995.

Corrijo-me: nada em jogo? Muito pelo contrário! Aqueles 23 bravos que aceleraram ao sinal verde (22, na verdade, pois a Minardi de Badoer quebrou antes disso) tinham muito a provar naquelas 81 voltas programadas.

Schumacher já era (bi)campeão, mas, em sua última prova pela Benetton, podia quebrar o recorde de vitórias em uma temporada. Damon Hill, vice e pole, depois de um ano marcado por braço-durismos, só tinha mais uma chance de limpar sua reputação.

Jean Alesi era um caso à parte. Vivia seu melhor momento como piloto. Jamais engoliu ter perdido o GP da Europa para Schumacher. Em Suzuka, deixou o mundo inteiro de boca aberta ao andar de silcks no molhado, fazer ultrapassagens por fora e enfileirar melhores voltas como se não houvesse amanhã - mas a transmissão da Ferrari não durou 25 giros.

De forma que o grid em Adelaide era um barril de pólvora. Hakkinen havia batido nos treinos e chegado em coma ao hospital, mas isso não impediu alguns pilotos de largarem com a faca nos dentes. Os atritos não demoraram a acontecer. Schumacher, que já sobrevivera a uma fechada de Berger, não conseguiu passar por Alesi ao final do retão. Francês e alemão abandonaram, com as respectivas suspensões torcidas.

Coulthard liderou as primeiras voltas. Saía tanto de traseira que sua Williams mais se comportava como um kart. Num dos momentos mais constrangedores de sua carreira, bateu no muro interno do pitlane e ficou ali mesmo.

A horas tantas, Frentzen se viu em segundo lugar na prova. Mas havia uma pedra no meio do caminho. Ela atendia pelo nome de Mark Blundell e era retardatária. O inglês tentava (sem sucesso) impressionar algum chefe de equipe para fechar um contrato para o ano seguinte. Ao ver uma Sauber atrás de si, provavelmente achou que disputava posição - e fechou o pobre alemão por duas longas voltas. Ao ultrapassar, a gentileza foi retribuída à altura:



Frentzen abandonaria, incrédulo, poucas voltas depois. Blundell ainda colocaria sua honra no pé direito até o fim, no intuito de tomar (mais uma vez sem sucesso) para si a terceira posição. Por muito menos, hoje em dia, qualquer um teria levado um drive-through.

De resto, a prova foi um show de quebras - sim, tempos estranhos aqueles, em que os carros quebravam - e batidas e rodadas. Cortinas de fumaça e despistes se sucediam à proporção de quase um por volta. Pedro Lamy chegou a girar mais de 720 graus (!) antes de retomar a direção certa da corrida. Taki Inoue disse adeus à Fórmula 1 após errar um ponto de freada e quase levar Schumacher consigo. Roberto Moreno também se despediu ao bater na mesma entrada dos pits que vitimara Coulthard. Poucas voltas depois, Herbert evitou colisão parecida, mas teve que adiar em uma volta o pit stop.

Enquanto isso, Hill se encaminhava para o que talvez tenha sido a vitória mais tranquila de sua vida. Cruzou a linha de chegada a tenebrosas duas voltas do segundo colocado, Olivier Panis. O francês, por outro lado, não teve o mesmo sossego: seu motor rateava no ritmo da valsa do adeus quando cruzou a quadriculada. Foi sorte não ter parado de vez alguns metros antes.

Um improvável Gianni Morbidelli completou o pódio. Lamy viveu para chegar em sexto. O ponto que somou para a Minardi, o único de Faenza na temporada, economizou US$ 4 milhões ao time: graças a ele, a FIA pagaria todo o frete de seus equipamentos para as provas fora da Europa em 1996. Dizem que o velho Giancarlo nunca tomou outro porre igual.

A Fórmula 1 terminava o ano com o coração na garganta. E tudo isso sem chuva e sem Safety Car. E tudo em frente a 200 mil pagantes embasbacados, que lotaram Adelaide antes de a pista ser aposentada. E que pista, que pista...

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