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Sunday, November 6, 2011

A melhor corrida dos últimos 16 anos

Vettel conquistou seu bicampeonato e ainda faltavam quatro corridas para o fim da temporada. Após duas dessas, a Fórmula 1 vive dias de tédio. Convenhamos, os GPs da Coreia e da Índia foram uma tortura de se assistir.

Este último até gerou certo interesse, pelo choque cultural que o país provocou no mimado círculo da categoria. Dentro da pista, em que pese certos encontros desfortunados entre Hamilton e Massa, ao insone espectador nada mais foi oferecido que um par de intermináveis procissões.

Inevitável comentário: agora que o título está decidido, para que se dar ao trabalho de ligar a TV? Estranho... desde meados de maio já era mais ou menos óbvio que, salvo catástrofe, a taça de 2011 tinha as mãos de Vettel como endereço.

Em todo caso, não culpo quem prefira ignorar o resto do campeonato. Mas o fato de o campeão já estar definido, por si só, não é motivo para tantos bocejos após a largada.

Porque uma das melhores corridas das últimas duas décadas aconteceu justamente quando a temporada já tinha seu campeão e não havia mais nada em jogo. Estou falando do GP da Austrália de 1995.

Corrijo-me: nada em jogo? Muito pelo contrário! Aqueles 23 bravos que aceleraram ao sinal verde (22, na verdade, pois a Minardi de Badoer quebrou antes disso) tinham muito a provar naquelas 81 voltas programadas.

Schumacher já era (bi)campeão, mas, em sua última prova pela Benetton, podia quebrar o recorde de vitórias em uma temporada. Damon Hill, vice e pole, depois de um ano marcado por braço-durismos, só tinha mais uma chance de limpar sua reputação.

Jean Alesi era um caso à parte. Vivia seu melhor momento como piloto. Jamais engoliu ter perdido o GP da Europa para Schumacher. Em Suzuka, deixou o mundo inteiro de boca aberta ao andar de silcks no molhado, fazer ultrapassagens por fora e enfileirar melhores voltas como se não houvesse amanhã - mas a transmissão da Ferrari não durou 25 giros.

De forma que o grid em Adelaide era um barril de pólvora. Hakkinen havia batido nos treinos e chegado em coma ao hospital, mas isso não impediu alguns pilotos de largarem com a faca nos dentes. Os atritos não demoraram a acontecer. Schumacher, que já sobrevivera a uma fechada de Berger, não conseguiu passar por Alesi ao final do retão. Francês e alemão abandonaram, com as respectivas suspensões torcidas.

Coulthard liderou as primeiras voltas. Saía tanto de traseira que sua Williams mais se comportava como um kart. Num dos momentos mais constrangedores de sua carreira, bateu no muro interno do pitlane e ficou ali mesmo.

A horas tantas, Frentzen se viu em segundo lugar na prova. Mas havia uma pedra no meio do caminho. Ela atendia pelo nome de Mark Blundell e era retardatária. O inglês tentava (sem sucesso) impressionar algum chefe de equipe para fechar um contrato para o ano seguinte. Ao ver uma Sauber atrás de si, provavelmente achou que disputava posição - e fechou o pobre alemão por duas longas voltas. Ao ultrapassar, a gentileza foi retribuída à altura:



Frentzen abandonaria, incrédulo, poucas voltas depois. Blundell ainda colocaria sua honra no pé direito até o fim, no intuito de tomar (mais uma vez sem sucesso) para si a terceira posição. Por muito menos, hoje em dia, qualquer um teria levado um drive-through.

De resto, a prova foi um show de quebras - sim, tempos estranhos aqueles, em que os carros quebravam - e batidas e rodadas. Cortinas de fumaça e despistes se sucediam à proporção de quase um por volta. Pedro Lamy chegou a girar mais de 720 graus (!) antes de retomar a direção certa da corrida. Taki Inoue disse adeus à Fórmula 1 após errar um ponto de freada e quase levar Schumacher consigo. Roberto Moreno também se despediu ao bater na mesma entrada dos pits que vitimara Coulthard. Poucas voltas depois, Herbert evitou colisão parecida, mas teve que adiar em uma volta o pit stop.

Enquanto isso, Hill se encaminhava para o que talvez tenha sido a vitória mais tranquila de sua vida. Cruzou a linha de chegada a tenebrosas duas voltas do segundo colocado, Olivier Panis. O francês, por outro lado, não teve o mesmo sossego: seu motor rateava no ritmo da valsa do adeus quando cruzou a quadriculada. Foi sorte não ter parado de vez alguns metros antes.

Um improvável Gianni Morbidelli completou o pódio. Lamy viveu para chegar em sexto. O ponto que somou para a Minardi, o único de Faenza na temporada, economizou US$ 4 milhões ao time: graças a ele, a FIA pagaria todo o frete de seus equipamentos para as provas fora da Europa em 1996. Dizem que o velho Giancarlo nunca tomou outro porre igual.

A Fórmula 1 terminava o ano com o coração na garganta. E tudo isso sem chuva e sem Safety Car. E tudo em frente a 200 mil pagantes embasbacados, que lotaram Adelaide antes de a pista ser aposentada. E que pista, que pista...

Sunday, March 27, 2011

GP da Austrália 2011 - Nada de novo na linha de frente

Nem asa móvel, nem kers, nem pneus menos duráveis tornaram Vettel alcançável. Muito pelo contrário: o alemão foi pouco mais que um pontinho azul no horizonte para qualquer um dos seus adversários, mesmo os mais próximos, como as McLaren. Hamilton foi quem chegou perto dele ao permanecer na pista algumas voltas a mais após o primeiro pit stop do líder, mas tudo o que conseguiu foi perder ainda mais terreno ao fazer a sua parada.

Albert Park foi o primeiro campo de teste da série de novidades técnicas introduzidas a fórceps pelo regulamento este ano. A maioria delas, porém, fez pouco mais do que acrescentar algumas luzinhas a mais nos infográficos da transmissão. Ultrapassar continuou tão difícil que Button teve que usar um atalho para concretizar a manobra sobre Felipe Massa, apesar de nitidamente mais rápido - o que lhe valeu um drive through e acabou com sua corrida. Ele encontraria o brasileiro à frente dezenas de voltas depois, finalmente realizando a passagem.

O fato mais impressionante da prova talvez não tenha ocorrido na pista, mas na tabela de classificação: uma mancha negra chamada Vitaly Petrov ocupando o terceiro posto com uma Renault (que pode ou não ser Lotus). Uma largada assertiva e um trem de corrida consistente deram ao russo a posição, á frente de outros muito mais bem cotados, como a Ferrari de Fernando Alonso. O resultado ratifica o poder da máquina de Enstone, aquela que seria pilotada por Robert Kubica, caso este não tivesse quase perdido a mão no mês passado.

Por falar no espanhol, atrapalharam seus planos o parco rendimento no apagar das luzes, mas é fato que a Ferrari se mostrou aquém do que se esperava, incapaz de oferecer perigo a concorrentes que pareciam carta fora do baralho, como a própria McLaren.

O sabor da novidade coloriu (ainda mais) o belo pôr do sol de domingo em Melbourne. Mas quem ousou ficar acordado na madrugada brasileira não viu nenhuma nova Fórmula 1; apenas o mesmo espetáculo, requentado.

Wednesday, August 25, 2010

Os 300 de Barrichello (número 200)

Prosseguindo com o cálculo de GPs inscritos, devemos dizer que os números redondos não são de todo ruins para Barrichello. Seu GP número 200 (incluem-se aí os três em que não conseguiu largar) foi o da Austrália de 2005. Foi a primeira corrida do talvez mais mal feito sistema de classificação de todos os tempos, que somava o tempo de duas flying laps - e o brasileiro, com o azar de encontrar a pista molhada, foi apenas o décimo primeiro, com o tempo de 3m16s822 (!!).

A fortuna, porém, lhe sorriu durante a corrida e ele terminou em segundo, entre as duas Renault. Sua melhor posição de chegada naquele ano.

Tuesday, March 30, 2010

Robert Kubica, o merecedor


O segundo lugar do polonês não lhe saiu barato no GP da Austrália: fez uma largada impecável, tomou nos boxes a posição de Felipe Massa e teve de segurar carros muito mais bem acertados e potentes que o seu por dezenas de voltas, sem descanso. Ok, ele teve alguma sorte ao contar com as dificuldades de Hamilton, Alonso, Webber, Rosberg e do próprio Massa durante a corrida – mas que foi merecido, isso foi.

No pódio de Melbourne, Kubica me pareceu diretamente saído da caixa de brita da curva Abbey, em Silverstone.

Foi no dia 6 de julho de 2008. Chovia por sobre o GP da Grã-Bretanha. Ele havia largado em décimo (teve problemas após o Q2 e não marcou tempo no Q3), mas se recuperava com talento. Parecia firme na terceira posição, atrás apenas de Hamilton e de seu companheiro, Heidfeld, quando foi tragado para fora do asfalto e abandonou.

Um mês antes, após vencer o GP do Canadá, era o líder do campeonato, com 42 pontos. Na prova seguinte, era o vice: 46 pontos, atrás apenas de Massa, com 48. O brasileiro fez uma de suas piores corridas em Silverstone e não marcou pontos. Ao fim dela, ele dividia a liderança com Hamilton e Raikkonen.

Kubica era o quarto colocado, estacionado nos 46. Ou seja, não estava de forma alguma fora da briga pelo título. O problema é que sua equipe, a BMW Sauber, não pensava da mesma forma.

Aqui é preciso abrir parênteses. Desde quando entrou, rompida com a Williams, em 2006, a BMW Sauber, Mario Theissen à frente, estabelecia metas a cumprir ao longo de cada ano. Queria se acomodar na categoria em 2006, pontuar em 2007, vencer uma corrida em 2008 e disputar o título em 2009.

Até 2007, a equipe superou todas as suas metas. Em 2008, resolveu cumpri-la à risca: vencido o GP do Canadá, passou a trabalhar no carro de 2009, que haveria de se ajustar a um regulamento técnico diferente e traria embutido o que acreditava ser seu grande trunfo: o sistema kers.

Ao alentar a oportunidade de concorrer ao título, Kubica tentou convencer seu time a alterar suas previsões, mas foi voto vencido: após o deslize em Silverstone, perdeu o apoio da BMW.

O tempo provaria que Kubica estava certo: o kers foi um fracasso, o carro não andava e a equipe afundou. Três meses antes do fim da temporada, anunciou o desligamento da categoria.

O polonês, na segunda metade de 2008, ainda conquistou três pódios. No ano seguinte, o segundo lugar no Brasil veio como um feito isolado e inútil.

Agora a situação é diferente. Kubica provou seu valor de possível futuro campeão mundial. Provou, acima de tudo, que a Renault deste ano não é carro para ele. Inclusive, num mundo ideal, alguns pilotos que hoje ocupam os cockpits das “quatro grandes” não estariam por lá agora...

Por isso eu pergunto: você concorda? onde você acha que Kubica merecia estar? No lugar de quem?

Sunday, March 28, 2010

GP da Austrália 2010 – Bem vinda de volta, Fórmula 1


PODEM DIZER QUE FOI GRAÇAS à chuva que a corrida foi emocionante. Digo apenas que com reabastecimento, nem a chuva seria capaz de produzir uma situação tão perfeita: carros em diferentes posições com desempenhos irregulares ao longo da prova, desgaste, prova decidida na tática e não na estratégia. Mais do que isso: pilotos loucos para mostrar do que são capazes.

Houvesse reabastecimento, e os pilotos seriam obrigados a pensar duas vezes antes de abrir fogo, o percurso se encheria de não-me-toques e engenheiros falando ‘ele vai parar daqui a duas voltas, não o ataque’. Finalmente, a Fórmula 1 saiu do enfadonho pit lane e ganhou seu lugar merecido, que é a pista. Bem vinda de volta, Fórmula 1! Já estávamos com saudade.

Há tanto para se falar de cada piloto em particular que não vale a pena colocar tudo num post. Isso vale em especial para Kubica e Alonso, que se provaram mais uma vez – como se o gênio de ambos necessitasse de mais provas.

Massa foi não menos brilhante, por manter na pista um carro desequilibrado desde o primeiro minuto do treino livre, corrigindo derrapagens, alterando o traçado de algumas curvas, segurando adversários.

Hamilton e Webber pagaram caro a prova irregular, mas entraram na pista como pilotos, não como funcionários aborrecidos de escritórios kafkianos, função que um automobilista exercia na maior parte do tempo, na Fórmula 1 dos últimos dez ou doze anos.

Vettel desapareceu na frente do pelotão e não foi mais achado. Mal se notou sua presença enquanto esteve em pista, o que não torna menos inexplicável por que ele foi parar fora dela. Falha nos freios? Erro humano? Infelizmente para o alemão,
a caixa de brita, como a Fortuna, é cega.

MUITA GENTE BRILHOU no breu do crepúsculo de Melbourne, mas no fim das contas, subiu ao alto do pódio o sumido Jenson Button. Campeão atual, orgulhoso guardião do badalado número um, mas que não liderava uma corrida desde o último GP da Turquia. Que ocorreu em junho de 2009!

Button venceu porque arriscou. Quando foi ultrapassado pelo prestigiado companheiro, foi aos boxes para colocar slicks. Nas três curvas seguintes foi o mais patético condutor. Uma hora depois estava levantando o troféu.

De quebra, o inglês foi o primeiro vencedor de GP da Austrália a repetir o feito em sete anos – intento no qual Coulthard (2003), Schumacher (2004), Fisichella (2005), Alonso (2006), Raikkonen (2008) e seu companheiro Hamilton (2008) fracassaram. Button reencontra a vitória, e nós reencontramos o esporte. Que este venha para ficar.

Saturday, March 27, 2010

Reflexões pessoais sobre os treinos para o GP da Austrália


VOCÊ SABE QUE É JOVEM quando assistir as etapas asiáticas e australiana da Fórmula 1 é mais fácil do que as da temporada européia. No Brasil, as corridas européias exigem que se acorde antes das 9h da manhã, um tormento para quem quer curtir as noites de sexta e sábado.

Já para assistir aos treinos de ontem, bastou, para mim, encerrar a noitada mais cedo. Liguei a TV uns cinco minutos antes da transmissão começar. Quando a bandeira quadriculada desceu sobre Alonso no Bahrein, 23 anos de idade pesavam sobre mim. Agora, assisto o GP da Austrália com 24 anos recém-completos. Mesmo assim, ainda posso me vangloriar de guardar comigo um pouco de juventude.

AO CONTRÁRIO DE MIM, espero que os especialistas de plantão tenham assistido sóbrios aos treinos desta madrugada. O pouco que retive dele foram as escapadas de traseira que os carros teimavam em dar na curva 13, uma ou duas voltas mais interessantes, e as minhas próprias preocupações.

O crítico
Fredric Jameson diz que os prédios altos e espelhados são típicos da arquitetura pós-moderna, pois ao se refletirem, retratam também os fluxos informativos e a inter-relação entre as multinacionais típicas do capitalismo tardio. Os arranha-céus que crescem ao fundo de Albert Park são um contundente testemunho de quanto tempo passou desde que a Fórmula 1 aportou por lá da primeira vez – ainda lembro de ter tentado, inutilmente, aos dez anos de idade, permanecer acordado até o final da prova, em 1996. Um acidente múltiplo que catapultou Martin Brundle obrigou a bandeira vermelha na primeira volta, e adormeci antes da segunda largada. Acordei com a TV ligada, passando o compacto da corrida.

POR TRÁS DAS NUVENS CARREGADAS DA MINHA MEMÓRIA, ainda pude ver a volta imperfeita de Vettel que lhe garantiu a pole position. Ao sair do carro, eufórico, apontou raivosamente o dedo indicador para a câmera. Acredito que, na verdade, o alemão queria ter mostrado era o dedo do meio, como se afirmasse sua condição de postulante ao título mundial deste ano.

Vettel derrapou, entrou errado na curva 13, ainda assim marcou a pole. Na segunda tentativa, não conseguiu chegar nem perto da primeira marca nas parciais. Ele é pouco mais novo que eu. Ele está louco pra mostrar a que veio. Teremos uma boa corrida amanhã.

Monday, February 15, 2010

Pedro de la Rosa, GP da Austrália, 1999


O catalão Pedro Martinez de la Rosa chegou em sexto logo na sua primeira corrida, em Melbourne, 1999. Atrás dele, seu companheiro Tora Takagi, Michael Schumacher em uma corrida problemática e uma legião de pilotos que bateram, quebraram, saíram de pista ou sequer lagaram.

Ao longo de sua carreira cumpriu duas temporadas completas na Arrows e duas na Jaguar, após a qual foi dispensado. Arrumou-se como piloto de testes da McLaren, que acabou lhe concedendo mais algumas oportunidades de alinhar no grid: no GP do Bahrein de 2005, cobrindo parte da 'licença médica' de Montoya; e do GP da França de 2006 até o fim da temporada, seguindo a demissão do colombiano.

Conseguiu o melhor resultado da carreira, segundo, no asfalto encharcado do GP da Hungria do derradeiro ano. Mas voltará ao circo em 2010, a bordo da nova BMW-Sauber, sabe-se lá por qual motivo.

Saturday, November 7, 2009

Cartazes - GP da Austrália 1993

Dentre os muitos marcos históricos que o GP da Austrália de 1993 nos deixou, o cartaz de divulgação certamente não é um deles: uma colagem de fotos sem sentido, num formato padronizado, uma avalanche de informação confusa e uma atenção mínima à paleta de cores.

Mesmo assim fica o registro. Ayrton Senna venceu lá a última prova, até o momento, sem reabastecimento. O GP seguinte caberia a Michael Schumacher, em Interlagos, em 1994, o primeiro em dez temporadas com reposição de combustível.

O destino tem das suas eloquências.



Sunday, November 1, 2009

GP de Abu Dhabi 2009 – O GP de Abu Ghraib e o triunfo do capital investido


Tantos especialistas debruçados sobre a corrida, e foi de um leigo (ao menos, não profissional) que recebi o comentário mais espirituoso e certeiro do fim de semana: “Esse prêmio de Abu Ghraib é uma tortura: não tem as curvas mortais de Suzuka e Spa-Francorchamps”.

O autor da frase é Claudio Júlio Tognolli, um dos mais famosos anônimos que já conheci. Jornalista veterano e prolífico, colecionador de palavras e meu professor na faculdade, que ultimamente vem se dedicando a criticar os blogs e a
twittar febrilmente. E sim, foi no Twitter que ele escreveu seu comentário.

As curvas travadas de Yas Marina, tal como
Abu Ghraib, são uma prisão que contrasta com a imensidão e o vazio do deserto. Dentro de seus limites o automobilismo se apequena frente à pujança do capital financeiro que se movimenta nas curvas pós-modernas das arquibancadas, dos iates e do hotel acima.

Foi comum ouvir as vozes habituais (de blogueiros a Galvão Bueno) se referirem ao Yas Marina como um “espetáculo”, que talvez designassem as instalações faraônicas ou o dinheiro colocado para erguer uma obra no meio do nada. “Espetáculo”, essa palavrinha que usamos mais ou menos frequentemente e que raramente conseguimos definir esconde uma definição bastante precisa do GP de Abu Dhabi.

Em 1967, quando a Fórmula 1 tinha muito mais graxa e muito mais graça, e muito menos câmeras ao redor, um enigmático incendiário chamado Guy Debord lançou um livro chamado “A Sociedade do Espetáculo”, cujas definições parecem cair como uma luva no automobilismo praticado hoje em dia. Segundo ele, o “espetáculo” não é apenas uma corrida ou um filme ou um programa de tv, mas sim um estágio do capitalismo em que nós, sujeitos, não mais possuímos a mínima relevância na vida econômica e social. Não somos mais atores do processo, somos meros espectadores assistindo os desdobramentos do capital.

Muitos autores comparam “A Sociedade do Espetáculo” à “Indústria Cultural” de Theodor Adorno, que escreveu sua obra em 1947, mas que ainda conserva uma atualidade desconcertante. O trecho abaixo se aplica a qualquer filme feito por Hollywood em tempos recentes:

“É com razão que o interesse de inúmeros consumidores se prende à técnica, não aos conteúdos teimosamente repetidos, ocos e já em parte abandonados. O poderio social que os espectadores adoram é mais eficazmente afirmado na onipresença do estereótipo imposta pela técnica do que nas ideologias rançosas pelas quais os
conteúdos efêmeros devem responder”.

Em outras palavras, ele afirma que as pessoas são mais atraídas em um filme pelos efeitos especiais que ele contém do que pelo conteúdo batido e bobinho da narrativa, que aprendemos a tolerar. Jamais exigiremos conteúdos novos, atuais e fascinantes enquanto houver explosões, batidas e cores vibrantes desfilando na tela.

Em Yas Marina, a corrida foi disputada no crepúsculo para que os milhões gastos em iluminação artificial pudessem revelar-se em pirotecnia. Vimos o pôr-do-sol, vimos os refletores acesos, vimos, acima de tudo e de todos, a cobertura do hotel trocando de tonalidades de novo e de novo e de novo.

Afinal, o circuito “moderno” e “de última geração” reproduz a mesma lógica da qual Adorno falava há 60 anos: uma pista tola revestida por uma “espetaculosa” camada de razão técnica. “A Indústria Cultural é o triunfo do capital investido”, dizia Adorno. Os bilhões de petrodólares gastos por Abu Dhabi apenas confirmam este raciocínio.

E já que estamos falando em corrida
Quase ia me esquecendo, houve uma corrida por lá. Dentro dos limites dos guard rails, a última corrida do ano provou cabalmente tudo o que já sabíamos. Em primeiro lugar, que a McLaren tinha o melhor carro, de longe, em circuitos de mentira.

Segundo, que a Red Bull tinha o melhor caro do ano. O azar deles foi ter descoberto isso tarde demais. Claro que isso se deve ao mérito da Brawn, que pode pendurar 2009 na parede e colocar seu nome em cima.

Terceiro, que esta corrida não valia nada. O que é muito positivo, pois traz de volta a leveza dos anos em que a Fórmula 1 tinha diversos eventos fora do campeonato. Na maior parte do ano, as tabelas e classificações nos tiram a atenção do “aqui e agora” (‘hic et nunc’) do automobilismo, e os pilotos são levados a acelerar com mais desapego. Isso se torna claro quando lembramos das corridas em Adelaide, que fecharam as temporadas de 1985 a 1995.


Assim sendo, a perseguição de Button a Webber nos metros finais recapitulou algumas disputas em GPs da Austrália de outrora, como Lafitte versus Streiff (1985), Piquet versus Mansell (1990), Berger versus Schumacher (1992) e tantos outros.

Yas Marina tem a grana que Adelaide nunca viu, mas não a paixão e o desafio que aquelas ruas australianas apresentavam. Infelizmente.

Tuesday, July 14, 2009

Cartazes - GP da Austrália 1986 e 1987

E como o hino australiano voltou a tocar num pódio após tanto tempo, nada mais oportuno.

Confesso: sou fã incondicional das ruas de Adelaide, que receberam o GP da Austrália entre 1985 e 1995. Meu apreço por suas corridas aumentou com a bem-vinda colaboração de Paulo Teixeira, o Speeder do Continental Circus, para esta seção. A esta altura, cartzes de divulgação já eram relativamente padronizados, o que não impediu os australianos de criarem duas peças bastante originais.

Em primeiro lugar, porque não estampam o nome oficial da prova , mas o relegam a uma linha fina. Preferem dar mais importância ao "Adelaide Alive", reivindicando o evento à cidade e imprimindo a marca de algo vivo, efervescente. E quem vai dizer que eles estão errados?

Chama a atenção no cartaz e 1986 o primeiro plano não ser dado aos carros, como seria "natural". Os passarinhos emergem e delimitam a pista, como se a imagem quisesse nos dar o ponto de vista deles para que assistíssemos a prova. Também salta aos olhos o otimismo dos locais ao pôr uma Haas Lola em segundo lugar, disputando posição com Prost e Senna. A explicação: era o carro do único aussie inscrito, o campeão Alan Jones. Justa homenagem, por sinal, naquela que seria sua última corrida.


No ano seguinte, a "vivacidade" que era natural agora assume contornos mais humanos: a massa, a multidão, a popularidade do evento é a protagonista. Podemos viajar um pouco e dizer que eles se inspiraram nos belgas, quarenta anos antes. Ou podemos apenas arriscar que a equipe de criação devia estar lendo "Onde está Wally?" em excesso.




Tais cartazes não poderiam vir sem uma justa homenagem ao blogueiro Paulo, que completou mais um ano de vida no último domingo. Obrigado pela colaboração, Speeder!

Sunday, March 29, 2009

GP da Austrália 2009 - Acidentes esperando para acontecer



"We are accidents waiting/
Waiting to happen"
There There, Radiohead



Foi um pódio de desacreditados. Trulli, porque ninguém acreditava que um bom resultado seria possível saindo da última fila. Barrichello desfrutava de uma dupla desforra: por pensarem que a carreira dele havia terminado e por pensarem que a corrida dele terminaria na primeira curva após a largada. Button era o símbolo do triunfo da Brawn GP, aquela equipe pobre, surgida do espólio de uma equipe horrível.



(Mais tarde foi decidido que a desforra de Trulli caberia a Hamilton, vá lá, esse é outro que está desacreditado na temporada. O italiano teria feito uma ultrapassagem em bandeira amarela- ok Race Control, vou fingir que não estou questionando dessa vez.)



Impossível não sentir apreço por essa equipe que não pode mais ser chamada de ex-Honda, assim como foi impossível não reparar em como Button cumprimentou Barrichello após a prova. Ou como os dois conversavam paralelamente durante a entrevista coletiva. Nota-se que são cúmplices no resultado, que correm como equipe.



No mais, além de uma desforra, o que foi o GP da Austrália?



Foi a prova de que o pacote aerodinâmico funciona. Os carros ultrapassam com mais facilidade, algo tão estranho à Fórmula 1 que por mais de um momento parecia uma corrida de kart.



Se as ultrapassagens voltaram a ser viáveis, a categoria também perdeu um pouco daquele ar racionalista, de jogo de xadrez, e se partiu para o corpo-a-corpo. Que o diga Kubica, com pneus duros, versus Vettel, com pneus de classificação que resolveram chamar de "moles".



E após todos os cálculos, todas as estratégias de pit stop, os dois se encontraram na pista. E a Fórmula 1 voltou a ser o que era. Pois somos todos acidentes, esperando para acontecer.



Race Control

Durante a transmissão da prova, pela primeira vez apareceu uma bancada composta por senhores de terno. O Race Control finalmente ganhou um rosto. Estes senhores de terno decidiram punir Vettel pela colisão entre ele e Kubica com a perda de dez posições no grid mais multa.



Para o Race Control, as batidas são indesejáveis (por destruírem o logotipo dos patrocinadores?) e alheias à natureza do automobilismo. Como postei em um texto recente, Contardo Calligaris diz que após dois séculos higienistas só é dado ao homem civilizado ver a morte de perto em esportes na tv. Mas se a higiene extrema já chegou a Fórmula 1, por que continuaríamos assistindo suas corridas? Para engoradar os bolsos de outros homens de terno?

Saturday, March 28, 2009

Duplo twist carpado, com leve desequilíbrio


Já foi dito que a Fórmula 1 está mais emocionante, que o jogo de forças entre as equipes mudou. Como já disse em um post anterior, não presto tanta atenção nas mudanças repentinas que ocorrem na categoria. As mudanças silenciosas e graduais é que são as mais importantes.


Hoje fui dormir com um grid formado e acordei com outro. Três punições. Não sei se alguém se lembra como as classificações costumavam ser mais simples.


A Fórmula 1, ou melhor, o Race Control pune cada vez mais. Não é um fenômeno novo (basta clicar na tag Race Control, neste blog, para ver como ele já dura algum tempo), mas é um fenômeno crescente.


O resultado é que a Fórmula 1 parece mais um jogo de tabuleiro. Jarno Trulli e Timo Glock jogam os dados e caem em suas respectivas casas, que os obriga a tirar uma carta do monte. "A aerodinâmica do seu carro está fora do regulamento, largue do fim do grid". Hamilton tira a sua carta: "Você trocou seu câmbio, recue três posições".


Desde 2003 a categoria se parece menos com um esporte a motor e mais com uma competição de ginástica olímpica, dependente de um júri para deliberar sobre a validade de pequenos detalhes que escapam aos olhos do espectador.


E isso traz a inevitável pergunta: será que tornar as regras cada vez mais ininteligíveis para o espectador é uma atitude deliberada? Alienar quem está assistindo é uma maneira de deixá-lo menos crítico? De fazê-lo assimilar tudo o que acontece como 'lógico'?


Acompanhe logo mais as 'fantásticas ultrapassagens' que as Toyotas farão em uma 'emocionante corrida de recuperação'.