Tuesday, January 27, 2009

O que faltava dizer sobre a carreira de Ron Dennis


Pois é, Ron Dennis vai deixar o cargo de chefão da McLaren após quase 30 anos. Não é pouca coisa. Recém-sessentão, nasceu no subúrbio londrino de Surrey, “em uma família tão burguesa quanto a fama desse condado”. Não teve medo, porém de correr riscos ou botar a mão na graxa. Começou na Fórmula 1 como mecânico de um carro de um jovem igualmente aventureiro, que utilizara a herança da família para comprar um carro e um trailer que o levava às pistas da Europa. Seu nome era Jochen Rindt.

De mecânico da Cooper a mecânico da Brabham, e daí à fundação de uma pequena equipe chamada Project Four, e daí à compra da McLaren, e daí à transformação desta numa das maiores equipes de todos os tempos, é uma história conhecida.

Por pura coincidência, dez anos antes de anunciar seu adeus aos boxes, Ron Dennis deu uma entrevista, na pré-temporada de 1999, ao repórter François Granet da L’Automobile, publicada no Brasil pela revista Carro (ambas faziam parte do grupo Motorpress). Também foi uma visita guiada à fábrica de Woking. Naquela época, a McLaren já era uma gigante, recém-parceira da Mercedes, mas ainda relativamente independente desta.

Chamava-se McLaren International, agregava seis empresas no total e fazia parte da Techniques d’Avant-Garde, a TAG, de Mansour Ojjeh. Mas, dentro da fábrica, que mandava era Ron Dennis. “Eu ficaria envergonhado se não conhecesse todas as peças dos meus carros”, declara ele, na legenda de uma foto em que suas mãos seguram um cilindro dentado, a engrenagem do eixo piloto do câmbio.

Era uma fábrica monstruosa em seu artesanato, produzindo, exceto o motor, 99% das peças do carro de Fórmula 1. O 1% restante contém itens como porcas e parafusos, que um lugar tão especializado não conseguiria fazer com tanta agilidade.

Não é a regra, porém.“Em alguns setores, como a eletrônica, nós tivemos que investir pesado e montar uma estrutura impressionante, e acabamos superdotados para nossas exigências. Para equilibrar a receita, desenvolvemos projetos para terceiros”. Estes ‘terceiros’ são mantidos em absoluto segredo, mas não tão absoluto assim. Sabia-se, na época, que a Peugeot comprava da TAG o sistema de gerenciamento eletrônico de motor e a caixa de câmbio, que equipavam os carros da Prost, o que causava uma situação deveras bizarra.

Senhor de seus domínios
“Atualmente, por causa dos trabalhos que desenvolvemos para adversários da McLaren, eu mesmo sou impedido de circular em certas áreas da minha própria fábrica. O meu crachá não está habilitado para abrir todas as portas da companhia. Se eu quero ir a um certo laboratório ou oficina, tenho que solicitar uma autorização por escrito ao diretor desse departamento”. Não tão senhor de seus domínios, porém, a reportagem mostra Ron Dennis como um chefe eu trata seus empregados com muita austeridade, um pouco de paternalismo, salários mais altos que a média (somando-se gratificações exorbitantes, em caso de vitórias) e disciplina. Por exemplo, a contrário do que ocorria na Ferrari ou Benetton naqueles fins de anos 90, ao invés de pôsteres de mulheres pouco vestidas e música nos auto-falantes, as oficinas de Woking são silenciosas e as paredes, decoradas com cronogramas e capôs de modelos antigos, estes últimos apenas no escritório do chefe.

A McLaren costuma tratar com deferência os cronogramas até nos momentos de lazer. “Em Suzuka, na rodada decisiva do último campeonato do milênio, Ron Dennis imaginou que seria um bom estímulo dar à sua equipe uma cópia de um cronograma de eventos da equipe dos anos sessenta. A ideia era fazer com que rissem, para alivia a pressão. Funcionou”, escreveria Tony Dodgins, ao fim de 99.

A língua do paddock
Apesar de uma longa entrevista, a matéria da ‘Automobile não mostra uma das marcas mais famosas de Dennis no paddock, o ‘Ronspeak’. Trata-se de uma prática, inventada por este, de usar frases longas e complexas para exprimir coisas simples.

Apesar de seu principal baluarte, Ron não é mais o único a falar em Ronspeak. Basta ler qualquer release de qualquer equipe: todos a falam na Fórmula 1. Ajuda o fato de os paddocks de hoje esbanjarem dinheiro e economizarem informação. Diferente, aliás, daqueles tempos em que um desconhecido Ron apertava parafusos no carro de Jochen Rindt. O amadurecimento de Dennis e os desdobramentos da Fórmula 1 são histórias que se confundem.

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