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Curiosamente, li um artigo que não tinha nada a ver com Fórmula 1, mas que jogava toda essa questão para um ponto de vista original e pertinente.
O artigo é assinado por Alexandre Agabiti Fernandez, e foi publicado na Ilustríssima, caderno dominical da Folha de S. Paulo. Apesar de Agabiti ser crítico de cinema, a matéria, intitulada “Uma Epopeia Sobre Pedais”, tratava do Tour de France, a competição ciclística mais famosa do mundo.
Em um certo momento, ele diz:
“O ciclismo de estrada é um esporte individual, mas que se disputa coletivamente. No Tour deste ano, deram a largada 198 ciclistas, defendendo 22 equipes, cada uma com nove atletas. Um deles, o líder, almeja a vitória na classificação geral -vence quem fizer o menor tempo na soma das etapas.
“A cada etapa, o líder da classificação geral veste o ‘maillot jaune’, a camiseta amarela que é o ‘manto sagrado’ do ciclismo. Os outros membros da equipe têm a missão de trabalhar para o líder, o que pode ser dar o ritmo durante a subida de uma montanha, buscar água junto ao carro de apoio, ajudar o líder a voltar ao pelotão no caso de um pneu furado ou problema mecânico. Muitos dos que não têm ambições na classificação geral podem ter como objetivo vencer alguma etapa, o que lhes dá enorme projeção.”
Mais à frente, o autor ns dá uma amostra de como a definição de “melhor” é extremamente frágil nas corridas de bicicleta:
“Os atletas podem ser classificados em três linhagens, segundo suas aptidões. Existem os ‘sprinters’, de grande capacidade anaeróbica e explosão muscular, de enorme potência durante alguns segundos. Eles disputam a chegada das etapas com topografia plana, podendo atingir até 70 km/h. O melhor "sprinter" tem a honra de vestir uma camisa especial, de cor verde. Neste ano, o privilégio coube ao italiano Alessandro Petacchi. Um "sprinter" jamais pode vencer o Tour, pois ele tem mais dificuldade em passar pelas montanhas, que exigem maior capacidade aeróbica.
“Os escaladores têm um biótipo diferente dos ‘sprinters’: em geral são mais baixos, mais leves e se destacam assim que as montanhas entram no percurso. O escalador se caracteriza por uma ótima relação peso/potência. Ao melhor escalador cabe uma camiseta algo espalhafatosa: branca com bolinhas vermelhas. O rei das montanhas do Tour 2010 foi o francês Anthony Charteau.
“O terceiro tipo de ciclista é o passista. Ele é capaz de pedalar longas distâncias em alta velocidade, girando as pernas com muita rapidez. O passista se dá bem nas etapas de contrarrelógio, quando cada ciclista larga e faz a prova sozinho, como acontece em um rali de automóveis. O melhor nesta especialidade é o suíço Fabian Cancellara, que venceu o contrarrelógio em 2010.
“O vencedor do Tour costuma ser o ciclista mais completo; pode não ser o melhor passista ou o melhor escalador. O percurso -que muda a cada ano- é variado, incluindo etapas planas para os ‘sprinters’, montanhas para escaladores e etapas de contrarrelógio para os passistas. Alberto Contador é um excelente escalador e se defende bem no contrarrelógio, sem ser brilhante. Por isso, venceu.”
Voltemos à Fórmula 1. O campeonato chega ao final com um dilema há muito adormecido: afinal, vale jogo de equipe? Ou, em outras palavras: automobilismo é um esporte individual ou coletivo?
Se Alonso for campeão por uma margem pequena, ele terá se beneficiado pela troca de posições em Hockenheim. A Red Bull pode tirar o título do espanhol, mas, para isso, talvez precise dizer a Vettel que Webber está mais rápido que ele, ainda que não seja verdade.
Isso é tão condenável quanto o que a Ferrari fez há três meses? Ou o fato de isso ocorrer na última prova é atenuante o suficiente? A própria equipe austríaca diz que não vai interferir. Mas é possível se manter neutra numa situação dessas?
O ciclismo é um bom ponto de partida para nós, motorizados, pensarmos a questão.
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