Saturday, August 1, 2009

O legado do fogo


No turbilhão de notícias atuais, não pude deixar passar o evento com o qual iniciei o ano de 2009.

As chamas que consumiram a Benetton de Verstappen no GP da Alemanha encarnam, de certa forma, as chamas que tomaram de assalto a Fórmula 1 em 1994, há 15 anos (e um dia): um ano de regulamentos desastrosos, uma avalanche de decisões extra-pista, polêmicas, acidentes, tudo consubstanciado na descrença e deslegitimação da Fórmula 1.

Ao pit stop de Verstappen, credita-se o mérito da concisão. Em poucos segundos, acende todas estas questões. A começar pela força da sua imagem, característica das tragédias que permearam o ano, particularmente as ocorridas em Imola, todas imagéticas, transmitidas ao vivo, de cores vivas e de significados que quase dispensam legendas.

Também há vítimas, embora os quatro mecânicos transferidos para o hospital de Heidelberg, mais o piloto, não tenham sofrido ferimentos graves – ora, todo resumo há de ser um pouco redutor.

Naquele ano, o reabastecimento havia sido permitido pela primeira vez desde 1983 – e ao contrário de onze anos antes, agora ele vinha mais ostensivo, mais presente, tal qual o é nos dias de hoje. As próprias roupas anti-chamas evidenciam isto. A regra foi modificada pela FIA, com o aval das equipes. Cogitou-se voltar atrás após o acidente, com o qual todos concordaram, menos a Ferrari, que naquela época estava comprometida historicamente com motores V12, mais pesados e beberrões, óbvios beneficiários do regulamento.

Posteriormente constatou-se que a Benetton havia retirado uma válvula de segurança no equipamento que bombeava combustível para o tanque do carro. Isso deixava os pit stops da equipe mais rápidos. A equipe declarou que tal alteração era ratificada por Charlie Whiting, delegado técnico da FIA, jogando a culpa para a Intertechnique, fabricante única do equipamento. A empresa rebateu imediatamente: todas as modificações teriam que passar por ela, o que não ocorreu.

A Benetton já enfrentava nos tribunais a ação que impediria Schumacher de correr duas provas, por ter ultrapassado carros durante a volta de formação. Era uma pena exagerada que, especula-se, seria uma forma de puni-la pelos dispositivos eletrônicos proibidos embutidos em seus bólidos, que os comissários técnicos não eram capazes de provar. No imbróglio, jamais houve uma punição declarada pela irregularidade no reabastecimento.

Um acidente impune, cujas medidas preventivas jamais foram tomadas. Também neste ponto o episódio de Verstappen condensa toda aquela temporada de 1994: o desmedido, o desnecessário, a impressão amarga de que todos os martírios não serviram para nada.


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