Wednesday, September 16, 2009

Fiat iustitia et pereat mundus – parte 2/4


Continuação

Talvez os campeões mundiais nos causem mais empatia. Talvez nos sintamos mais dispostos a nos projetar em alguém que chegou ao topo do que em um jovem segundo piloto. Mas isso ainda me soa algo superficial. Aprofundemos.

1989: Senna crescia rapidamente no retrovisor de Prost já há algumas voltas. O francês havia pilotado como raramente se viu ele fazer, e mesmo assim uma ultrapassagem parecia iminente, o que levaria ao adiamento e possível derrota no campeonato. Ver Senna colocando seu carro por dentro talvez tenha sido demais até para o frio professor.

1990: No ano seguinte, a situação se inverteu. Era Prost quem precisava da vitória. Senna havia pedido a troca das posições de largada, antes dos treinos, para que o pole saísse do lado mais emborrachado. No domingo soube que Balestre vetara sua proposta. No briefing, uma piadinha entre os pilotos: alguém fingiu perguntar se a pista de serviço da chicane valeria como traçado. Prost largou do lado mais emborrachado da pista, em segundo, e chegou na curva 1 à frente de Senna. Todo o necessário era apenas continuar acelerando.

1994: Schumacher liderou até a volta 35, quando saiu da pista, e o título parecia escorrer entre seus dedos, após uma série de punições e desclassificações durante a temporada. Foi quando Damon Hill terminou surgiu atrás da curva.

Impulso x Premeditação
Acredito que a descrição de 1997 se faça desnecessária. Em todos os casos havia uma situação colocada de pressão extrema, de derrota iminente. Todos os quatro movimentos foram a última tentativa, desesperada, irracional, de preservar uma conquista – ou ao menos podem ser tomadas como tal. Em muitos outros esportes, esta tentativa é até institucionalizada: no futebol, por exemplo, o zagueiro pode tentar rasgar o joelho do atacante adversário antes que ele chute a gol. Se fizer bem feito, o árbitro sequer notará o pênalti, e tudo acabará por isso mesmo.

No futebol como no nazismo, a violência sistemática se justifica em nome da coletividade, do interesse do time.

Sabemos racionalmente que quando a situação é transposta para uma tonelada de metal com gasolina dentro em alta velocidade, a questão se torna mais séria. Mas nosso inconsciente (talvez pelo fato de vermos jogos e corridas sentados em um sofá confortável, pela tv) não se dá muita conta da diferença. Um acidente proposital e um pênalti são condenáveis, mas não imperdoáveis.

Além do mais, quem jamais se colocou numa situação de tudo-ou-nada? Empiricamente ou instintivamente, todos sabemos o que é isso. E todos sabemos que somos propensos a agir da mesma forma, ainda que condenável. E qual motorista brasileiro nunca passou no sinal vermelho, mas que tinha ‘acabado de fechar’?

(Continua)

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