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Sunday, June 5, 2011

Terry Fullerton, o piloto que Senna queria ter sido

O que talvez seja o único troféu que Senna um dia cobiçou e jamais conquistou, hoje, serve como peso de papel na residência dos Fullerton, na pequena Norwich, Inglaterra.

É o troféu de campeão do mundo de kart, que o piloto inglês conquistou na década de 70. Terry Fullerton, 58, nunca foi a celebridade que Ayrton se tornaria. Até hoje, trabalha assessorando jovens kartistas para pagar as contas. Mas, em uma entrevista recuperada pelo recente documentário "Senna", ele é citado pelo brasileiro como o adversário que mais admirava.

No Brasil, o longa-metragem já entrou e saiu de cartaz. Mas, na Grã-Bretanha, só estreou nos cinemas nesta semana. Estive em Londres no mês passado e pude ver que o Sunday Times fez um pequeno perfil de Fullerton, falando sobre os dias que passou como companheiro de equipe de Senna na DAP.

E o inglês não era qualquer um. Aos 25, ganhava 10 mil libras (que hoje equivelam a 45 mil libras) por ano e viajava pelo mundo fazendo aquilo que gostava.

Senna, então com 17, não era tão experiente, e era constantemente batido por Fullerton - embora não sempre.

Visto como o melhor kartista de sua época, ele explica por que não tentou voos mais altos: "O momento perfeito para eu ter me mudado para as corridas de carro teria sido em 1973, logo após ganhar o mundial. Mas eu já era pago para viajar pelo mundo e correr e não queria começar do fundo do pelotão outra vez".

Há outra razão, também. Seu irmão Alec morreu aos 21 correndo de moto, e, numa época em que entrar em fórmulas não era nem um pouco seguro, a família resistiu em apoiá-lo. Não que o pai, professor, fosse lá uma pessoa rica. Por isso mesmo, enquanto a família de Senna bancava parte de suas aventuras na Europa, Fullerton era muito mais dependente do patrocínio que arrecadava.

Fullerton abandonou o volante em 1984. Assistia às provas de Fórmula 1 pela TV, "honrado", de acordo com suas palavras, "por alguém que eu conhecia estar se dando bem por lá".

Mas não pense que as mãos de Fullerton não se fazem sentir ainda hoje na categoria: Anthony Davidson, Allan McNish e até Paul di Resta, hoje na Force India, receberam instruções dele no início de suas carreiras.

A última vez que Senna se encontrou com o ex-rival foi num paddock da Fórmula 3 britânica, em 1983. Conversaram sobre amenidades, rapidamente. Antes que a reportagem do Sunday Times mostrasse a declaração de Ayrton, citando-o nominalmente, Terry jamais teve conhecimento daqueles elogios.

Foram rivais, mas não inimigos. Fullerton olhava a vida de Senna com certa inveja, talvez, mas sem rancor, certamente. De forma que a morte do brasileiro o abalou como um raio. "Alguém muito especial havia sido retirado de nós. Eu estava num Ferry, no canal da Mancha, quando ouvi alguém comentar a notícia. Senna era o tipo de piloto que surge uma vez a cada geração. Eu corri contra Mansell e Prost e ele estava com a cabeça e o ombro à frente dos dois."

"Era como se ele fizesse tudo aqulo que eu poderia ter feito", confessa.

Saturday, October 2, 2010

Vídeo: Senna explica vitória em Detroit, 1987



É interessante procurar material, hoje em dia, sobre os GPs de Detroit dos anos 80. POdemos traçar inúmeros paralelos com Cingapura.

Vamos ao vídeo: os três primeiros colocados - Senna, Piquet, Prost - estão em um carro aberto sendo levados para o pódio ou para a sala de imprensa ou sabe deus onde. Um repórter os entrevista para a tv local.

Senna fala da decisão de não parar para trocar pneus -o único que apostou em seguir com os mesmos durante todo o percurso. Foi inteligente, mas arriscado: em determinado momento, ele era 20s por volta mais lento que o segundo colocado. Mas afirma que o carro correspondeu bem, a suspensão ativa funcionou, e seu único grande problema foi o pedal do freio, cujo curso estava irregular.

Por fim, ele conta como conseguiu a bandeira do Brasil - a segunda vez que ele a empunhou numa volta de desaceleração; a primeira também havia sido em Detroit, no ano anterior.

Prost não estava muito interessado em falar. E Piquet fala do cansaço e de como não gosta de pistas travadas.

Wednesday, April 21, 2010

Tudo o que você não sabia sobre o GP de Portugal de 1985

No dia que marca os 25 anos da primeira vitória de Ayrton Senna na Fórmula 1, resolvi juntar uma série de fatos curiosos que marcaram o GP de Portugal de 1985. O título talvez seja exagerado, por isso, se você sabe algo peculiar sobre esta corrida, não hesite em postá-la nos comentários.

Retirei a maior parte das informações abaixo do Anuário 85/86 de Francisco Santos, dos sites de estatística e de uma cópia em dvd da transmissão original da corrida, com imagens e áudio da Rede Globo. Vamos a ela, portanto:

- Talvez não haja nenhuma prova de 1985 mais lembrada do que o GP de Portugal, em que Senna conquistou a primeira vitória da carreira. No entanto, ela registrou o menor público da temporada, com apenas 18 mil ingressos vendidos. Alguns fatores talvez expliquem o fenômeno. Primeiramente, o GP de Portugal de 1984, o primeiro em Estoril, aconteceu em 21 de outubro - apenas seis meses antes, protanto. Os portugueses talvez tenham sido encorajads a ficar em casa pela transmissão televisiva da prova que decidiu o título entre Lauda e Prost ter sido considerada a melhor do ano. Mas o fator principal, certamente, foi o preço da entrada - tabelados pela FOCA (antecessora da FOM), estavam caros demais para a realidade de Portugal nos anos pré-União Europeia.

- Nenhum treino da prova, nem o warm up, aconteceu em pista molhada, de forma que os pilotos alinharam no grid com um acerto feito completamente 'às cegas' para a condição de pista molhada.

- Com a pista molhada, os pneus Pirelli tiveram um desempenho mais do que vexatório. Os pilotos que tentavam acompanhar os Goodyear invariavelmente saíam da pista. Dos calçados com os italianos, Philippe Alliot (RAM-Hart), Pierluigi Martini (Minardi-Ford), Jacques Laffite (Ligier-Renault), Mauro Baldi (Spirit-Hart), Nelson Piquet (Brabham-BMW) e Andrea de Cesaris (Ligier-Renault) abandonaram por batidas ou saídas de pista.

- Dos nove classificados, apenas Piercarlo Ghinzani (Osella-Alfa Romeo) usava os Pirelli.

- O rápido desgaste sofridos pelos compostos italianos pode ser visto pela tabela de voltas mais rápidas. Numa época em que os reabastecimentos eram proibidos - e, portanto, os carros largavam muito mais pesados do que chegavam -, nenhum piloto com Pirelli fez sua volta mais rápida depois da quinta volta de corrida.

- As condições do tempo eram tão perigosas que os pilotos, mesmo os de Goodyear, não arriscaram demais: quase todos os pilotos já tinham marcado suas melhores voltas até o décimo quinto giro, após o qual as condições da pista se deterioraram. Apenas Mansell (Williams-Honda) e Derek Warwick (Renault) marcaram suas melhores voltas no fim da corrida: voltas 62 e 63, respectivamente, o que sugere que o asfalto começava a secar. Mesmo assim, poucos se arriscaram.

- Um dos pilotos mais prejudicados pelos pneus foi Nelson Piquet. Nos treinos em pista seca, ele registrou a maior velocidade ao final da reta: impressioantes 319 km/h com o motor BMW. Na corrida, porém, não pôde repetir o desempenho. Parou diversas vezes no box, por causa de inúmeros problemas. Em uma das paradas, teve tempo até de trocar de macacão.

- Mas é inegável que Senna (Lotus-Renault) esteve acima de todos os outros naquele fim de semana, e não apenas por causa do pneu Goodyear: ele foi pole provisório na sexta-feira, pole definitivo no sábado, venceu de ponta a ponta e fez a melhor volta.

- Para a Lotus, a vitória foi importantíssima: não apenas a primeira após a morte do fundador Colin Chapman, como a primeira após a contratação do projetista Gérard Doucarouge.

- A volta mais rápida de Senna é um indício de seu domínio: sua marca de 1m44s121 foi mais de sete décimos melhor que a de Michele Alboreto, dono do segundo melhor tempo.

- Ayrton não aproveitou apenas a pole e a liderança para fugir do pelotão, enquanto os outros se debatiam em meio ao spray. Até as 40 primeiras voltas (mais da metade da corrida), Senna tinha sido o mais rápido em 38 delas. Apenas na 22a e 39a passagens, Alboreto havia feito melhor tempo que o brasileiro.

- As câmeras não mostraram, mas em uma dessas duas voltas Senna marcou um tempo muito ruim, porque saiu com as quatro rodas na grama. Caso não tivesse conseguido retornar, toda sua superioridade não teria contado para nada.

- Cabe informar que Alboreto também fez uma ótima apresentação: foi segundo colocado e o único a terminar na mesma volta do líder.

- A final, Alboreto se tornava o líder do campeonato: desde Bandini após o GP da Bélgica de 1966 um italiano não ocupava a mesma posição.

Monday, March 22, 2010

Vocês, os vivos


Há um ou dois anos esteve em cartaz, no Brasil, um maravilhoso filme sueco chamado “Vocês, os Vivos” (Du Levande), do diretor Roy Andersson. Infelizmente, a rarefeita distribuição privou boa parte do público de assistir uma obra pouco convencional e de humor corrosivo, frente à avalanche de lugares-comuns que marca a atual fase do cinema comercial norte-americano.

Por alguma razão obscura, nestes dias passou pela minha cabeça que não haveria título melhor para um post sobre o cinqüentenário do nascimento de Ayrton Senna. Cinquentenário de nascimento, precisamente, porque mortos não fazem aniversário.

Voltando ao filme, que não vem ao caso comentar, ele explica logo de cara a inspiração para seu título. Uma citação epigráfica surge na tela, retirada das Elegias Romanas de Goethe: “Bem aventurados vocês, os vivos, em suas confortáveis camas aquecidas, antes que a gelada onda do Lethe venha molhar os seus pés” (tradução livre e sujeita a erros). O Lethe, segundo a mitologia grega, é um dos cinco rios de Hades, que levam ao reino dos mortos. A tradução literal do nome seria ‘esquecimento’.

Senna, famoso por sua velocidade nas pistas enquanto vivo, permanece notório em morte, pela lentidão sem paralelos com que caminha em direção ao esquecimento. Nada mais natural, no entanto, para quem foi submetido à exposição de tantas lentes fotográficas e câmeras de TV.

Quando alguém morria nos tempos de Goethe, tudo o que dela restava eram as lembranças nas memórias de terceiros e as obras, talvez um ou outro retrato feito a mão. Talvez a morte de uma celebridade contemporânea seja mais difícil de elaborar porque sua imagem e seus gestos permanecem, intensamente documentados, a um “google” de distância. E, se Debord estava certo, produzir imagens era a finalidade última das vidas destas pessoas no capitalismo tardio.

E se há duzentos anos os europeus subjugavam as culturas indígenas, por exemplo, porque estes acreditavam poder falar com os mortos ou receber conselhos antepassados, hoje já não podemos mais nos dar a este direito: a concepção cristã de que as almas vão para um lugar onde permanecem incomunicáveis parece tão ou mais absurda. No Youtube, Ayrton Senna, Jim Clark, Michael Jackson e Brittany Murphy estabelecem conosco um intenso diálogo.

E assim Senna chega aos 50 anos, sem os traços da idade, sem cabelos brancos, com o frescor no olhar de quem mal chegou à idade da razão. Dizem seus detratores que ele fez um bom negócio, e não estão de todo errados. Em compensação, suas imagens mais recentes já estão amareladas pelo distante ano de 1994. A moda da época, os assuntos da época, a música da época, tudo o que mudou em 15 anos começa a gritar aos nossos olhos.

Mais gritante, porém, que o mundo em volta de Senna, seja talvez o próprio Senna – um Ayrton que nasceu há quinze anos, destinado a ser o herói da nação ou um filantropo, mas quase nunca piloto: o Ayrton Senna mito.

Senna mito, sorrateiramente, se esgueira por entre as imagens, contamina as fotos, surge na delicada edição dos vídeos, e começa a ocupar o lugar onde antes estava um homem, um piloto, um talento. O mito impregna de tudo com o brilho que nos ofusca a visão e nos impede de ver o verdadeiro gênio.

Por trás do mito, dos confins obscuros da memória, Ayrton Senna fala a nós, os vivos: que a lembrança pode ser a forma mais cruel de esquecimento.

Friday, March 5, 2010

De volta à Abertura Senna


‘Abertura’, no vocabulário do xadrez, se refere à sequência inicial de movimentos que um jogador faz, de modo a organizar suas peças no tabuleiro para o chamado meio-jogo. Os enxadristas profissionais escolhem a dedo uma entre as incontáveis possibilidades de abertura (cada uma com suas variantes) com base em uma estratégia de jogo pensada em função de seu estilo e das deficiências do adversário.

As mudanças de regulamento que entrarão em voga na Fórmula 1 a partir deste ano obrigarão uma revisão das estratégias de corrida. E um dos pontos mais afetados será justamente a ‘abertura’: o período da largada às primeiras voltas em uma prova.

Na última década e meia, em que os reabastecimentos eram permitidos, a ‘abertura’ foi subvalorizada – muito importante, pela dificuldade de se ultrapassar, mas ainda assim subvalorizada. Isso porque a estratégia de uma corrida era pensada a partir do combustível, com quantos litros o piloto iria largar, quantas paradas iria realizar e como elas se distribuiriam na prova. Isso era pensado tanto em função dos adversários diretos quanto de fatores exógenos, como a hora prevista para se encontrar retardatários, chuva etc.

Dessa forma, o resultado de uma largada era uma contingência de um conjunto de variáveis. E assim estamos acostumados a ver a Fórmula 1 há 15 anos.

Com a proibição do reabastecimento, a dinâmica da prova mudará substancialmente e, com ela, uma boa execução da Abertura Senna se fará essencial. Segue a explicação.

Explicação
Dá-se o nome de Abertura Senna a uma estratégia de corrida baseada em um início de corrida que estabeleça uma grande vantagem entre o piloto e seus adversários, e que será administrada ao longo do percurso. Os mais variados relatos dão conta de que ela foi criada pelo piloto brasileiro Ayrton Senna; daí o nome.

Senna correu a maior parte da vida com a proibição do reabastecimento em vigor. Isso significa que os carros largavam em condições longe do ideal: pesados demais, fora do acerto adequado, com pneus frios, traçado pouco emborrachado etc. Ayrton sabia que possuía inegável talento para pilotar em condições difíceis, e resolveu lançar mão de seu diferencial justamente no início das provas.

Nas primeiras voltas, enquanto os pilotos se empenhavam em ‘amaciar’ a máquina, o brasileiro era pródigo em abrir segundos de diferença, pois tinha mais facilidade em tirar o maior proveito do equipamento sem, no entanto, desgastá-lo.

Importante notar que esta estratégia coexistia com outras: a de Prost, por exemplo, era a de não abrir grande vantagem em relação ao segundo colocado, ou não ultrapassar o primeiro até dois terços da prova completados, poupando os componentes. Ele se utilizava de seu reconhecido talento para a regularidade, não tão presente em muitos de seus contemporâneos. Com um carro mais ‘sadio’ aos 70% de corrida completados, partia para o ataque.

A estratégia de Prost talvez não seja mais tão eficiente numa Fórmula 1 com a feroz aerodinâmica atual, com suas dificuldades de ultrapassagem.

A Abertura Senna, por outro lado, parece a melhor opção nos dias de hoje. Em
um post recente do jornalista britânico James Allen em seu blog, Jenson Button corrobora: “As primeiras voltas serão as mais importantes”, sobre a próxima temporada.

“É como uma corrida de endurance. O rendimento do carro varia muito do carro pesado para o leve em termos de estabilidade. É uma maneira de pilotar diferente da temporada passada”, afirmou o atual campeão mundial.

Ele chama a atenção para o cuidado necessário no início da corrida. “Se você danificar os pneus na terceira volta, você estragou todo stint. Então é preciso ser suave com o carro”.

Saturday, November 7, 2009

Cartazes - GP da Austrália 1993

Dentre os muitos marcos históricos que o GP da Austrália de 1993 nos deixou, o cartaz de divulgação certamente não é um deles: uma colagem de fotos sem sentido, num formato padronizado, uma avalanche de informação confusa e uma atenção mínima à paleta de cores.

Mesmo assim fica o registro. Ayrton Senna venceu lá a última prova, até o momento, sem reabastecimento. O GP seguinte caberia a Michael Schumacher, em Interlagos, em 1994, o primeiro em dez temporadas com reposição de combustível.

O destino tem das suas eloquências.



Friday, October 23, 2009

GP do Japão 1989 – A genealogia do acidente (parte 2/2)


A McLaren demorou 7s86 para colocar carro número 2 no chão. Prost parecia ter agido com sua famigerada sensatez outra vez: deixando Senna em meio aos retardatários e, agora, com pista livre para aproveitar os pneus novos. A equipe, mal o francês saíra, já aprontava outro jogo de pneus. Neste preciso momento, algo interessante (e talvez determinante) ocorreu: segundo os locutores brasileiros, engenheiros da Goodyear se dirigiram ao box da McLaren, e momentos depois o jogo de pneus já aprontado para Senna foi recolhido e trocado por outro.

Poderíamos conjecturar horas sobre o fato, que a história tratou de silenciar. Mas não há dados objetivos que nos permitam ir além. Fica apenas o registro. Além disso, Ayrton não foi aos boxes na volta seguinte, o que lhe custou uma volta com pneus velhos e mais retardatários à frente.

Senna apontou no pit lane na volta 23. A equipe trabalhou mal, numa parada de 9s89. No vigésimo quarto giro, a diferença se encontrava em 4s6. O que ninguém entendeu de imediato foi a queda para 3s2 logo na passagem seguinte. Prost cometeu algum erro? Nada que a transmissão tenha captado, ao menos. Senna, por outro lado, fez a melhor volta, o que se repetiu na 27. Entre a 26 e a 28 as McLaren enfrentaram muitos retardatários, dos quais o brasileiro se saiu melhor. Nas quatro passagens seguintes os corações dos torcedores pararam: de 2s7, a diferença chegou a 1s8. Na volta 3, Prost jogou-a de volta para acima dos 2s0. Em seguida, Piquet surgiu como retardatário. O francês passou a Lotus com mais facilidade e na passagem 35 as McLaren estavam separadas por 3s3.

Se a intenção de Prost era fazer Senna errar pelo nervosismo ou desgastar seu carro em excesso, não havia dado certo. E se podemos apontar um momento exato para que a corrida do francês saísse do seu controle, este seria a volta 37. Senna arrancou uma melhor volta, e depois outra. Na 39 Prost pareceu sucumbir de vez à pressão, virando uma volta ruim. O capacete amarelo está agora a 1s7. Retardatários na volta 40 e apenas 0s4 os separam. Senna gastaria as sete voltas seguintes estudando a ultrapassagem.

Prost pilotara até então como um monstro. É lícito colocá-la entre as melhores das 199 corridas que disputou, e obviamente ele não entregaria fácil. Senna tinha tudo a perder. Qualquer resultado que não a vitória daria o campeonato ao rival. Há muito o brasileiro não era mais um jovem afobado em busca de um campeonato mundial, capaz de cair no jogo de Prost, como no GP da França de 88, por exemplo. Por certo que a batida com Mansell algumas semanas antes no Estoril o transtornara, e uma vitória em Suzuka não seria apenas um baque terrível em Prost, mas a sua própria redenção num campeonato irregular.

No início da volta 43 Prost encontrou meio segundo para respirar um pouco mais. Senna recuperou décimo por décimo, e na 46a passagem ensaiou uma manobra na entrada da chicane. Talvez ele tenha encontrado finalmente o lugar para ultrapassar. Na volta seguinte ambos percorrem cinco quilômetros e meio grudados. O público acompanha de pé o desfecho. Uma curva rápida à direita da qual Senna sai com mais ação. Ele tira o carro do traçado, a chicane cada vez mais perto, e o resto é silêncio.


Thursday, October 22, 2009

GP do Japão 1989 – A genealogia do acidente (parte 1/2)


Os últimos vinte anos foram tempo mais do que suficiente para que o acidente entre Senna e Prost naquele fatídico GP do Japão, que definiu o campeonato de 1989, se tornasse um dado concreto, consolidado. Tão consolidado, aliás, que eclipsou boa parte da própria corrida na qual se deu e que, em última instância, determinou a batida. Dessa forma, gostaria de convidar o leitor (em que pese a ressaca do campeonato atual recém-decidido) a recuar vinte “22 de outubros” no tempo, para assistir outra vez às primeiras 47 voltas daquele GP sem o véu da batida iminente.

É um exercício um tanto revelador. Veremos um Alain Prost longe do seu conservadorismo típico, além de uma disputa psicológica entre dois dos pilotos mais geniais que a transmissão via satélite fez o mundo conhecer.

Tudo começa, como seria de esperar, na largada. Ayrton Senna, na pole, alinhado pelo lado de dentro do traçado, com Alain Prost em segundo, pelo lado de fora. Nunca saberemos se o francês foi favorecido por largar de um lado mais emborrachado, mas é fato que despontou logo na primeira curva, relegando seu rival, que precisava vencer para se manter vivo no campeonato, em segundo.

Desde o início de sua carreira, era comum ver Prost vencer a partir do segundo terço de uma corrida. Antes disso, escoltava calmamente o líder – ou era parte do pelotão que liderava – até decidir se impor na liderança, com um carro menos desgastado do que seus rivais. Essa tática lhe permitiu alcançar o recorde absoluto de vitórias. O jovem Senna, por outro lado, desafiava a experiência de Prost por seus próprios meios: se aproveitava das primeiras voltas, com a pista suja, os pneus e freios frios e os carros muito próximos para abrir uma vantagem confortável, a qual administrava no restante da prova.

Isso talvez fizesse muitos indagarem, em Suzuka, se por acaso Senna e Prost não haviam largado com capacetes trocados. O líder passou já com 1,4s de vantagem para Senna na primeira volta. Após três voltas, a diferença imposta era de 3s2 em três voltas, 3s8 após cinco e 4s5 após sete voltas.

(Desnecessário dizer que, se a distância entre Prost e Senna crescia em p.a, entre as McLaren e os outros ela crescia em p.g.)

Sabia-se que os pneus, na pista japonesa, se desgastariam com facilidade, tornando necessária ao menos uma troca de pneu. Prost, geralmente econômico com o equipamento, pilotava como se não houvesse amanhã. Senna o seguia, mas não de perto. Levantou-se a hipótese de que o francês, ao forçar logo nas primeiras voltas, pretendia forçar um desgaste no carro de Senna.

Muitos podem ter pensado que Senna e Prost largaram com capacetes trocados

Apenas na nona passagem o brasileiro registrou uma volta mais rápida que a do líder. A diferença entre ambos, a partir de então, tende a se manter estável. Se Ayrton registra uma melhor volta no 12o giro (1m45s3), Prost devolve duas passagens depois (1m45s200). O ponteiro já abria 17s para o terceiro colocado, Berger - três voltas depois, o austríaco se encontrava 20s atrás.

Certa vez, Jo Ramirez comentou que a distinção entre Prost e Senna era que o primeiro, com um carro imbatível era inalcançável, enquanto o segundo, em um equipamento indócil ou condições difíceis de pilotagem, venceria com facilidade. Talvez por isso o desgaste dos pneus estivesse fazendo a diferença entre os dois encolher.

Na volta 15, Senna é o primeiro a baixar de 1m45s. Em seguida, gira 0s4 mais rápido que Prost. Na 17, pela primeira vez, a distância abaixa de 4s0 na prova. O francês se recupera logo depois, mas começam então a surgir retardatários. A diferença oscilou até a volta 21, quando Prost foi para o box.

(continua amanhã)

Friday, October 2, 2009

Por que não me ufano

Poderia citar razões perfeitamente objetiva. Poderia falar que o Pan Americano de 2007 custou R$3,5 bi aos cofres públicos enquanto o previsto era que se gastasse R$ 400 mi. Poderia falar que o orçamento público previsto para a Copa e as Olimpíadas é maior do que o investimento do Brasil em educação nos último dez (sim, dez) anos.

Apenas digo: Jacarepaguá sumirá do mapa e não deixará rastros.

Foto: Ayrton Senna no Rio, em 88.

Wednesday, September 16, 2009

Fiat iustitia et pereat mundus – parte 2/4


Continuação

Talvez os campeões mundiais nos causem mais empatia. Talvez nos sintamos mais dispostos a nos projetar em alguém que chegou ao topo do que em um jovem segundo piloto. Mas isso ainda me soa algo superficial. Aprofundemos.

1989: Senna crescia rapidamente no retrovisor de Prost já há algumas voltas. O francês havia pilotado como raramente se viu ele fazer, e mesmo assim uma ultrapassagem parecia iminente, o que levaria ao adiamento e possível derrota no campeonato. Ver Senna colocando seu carro por dentro talvez tenha sido demais até para o frio professor.

1990: No ano seguinte, a situação se inverteu. Era Prost quem precisava da vitória. Senna havia pedido a troca das posições de largada, antes dos treinos, para que o pole saísse do lado mais emborrachado. No domingo soube que Balestre vetara sua proposta. No briefing, uma piadinha entre os pilotos: alguém fingiu perguntar se a pista de serviço da chicane valeria como traçado. Prost largou do lado mais emborrachado da pista, em segundo, e chegou na curva 1 à frente de Senna. Todo o necessário era apenas continuar acelerando.

1994: Schumacher liderou até a volta 35, quando saiu da pista, e o título parecia escorrer entre seus dedos, após uma série de punições e desclassificações durante a temporada. Foi quando Damon Hill terminou surgiu atrás da curva.

Impulso x Premeditação
Acredito que a descrição de 1997 se faça desnecessária. Em todos os casos havia uma situação colocada de pressão extrema, de derrota iminente. Todos os quatro movimentos foram a última tentativa, desesperada, irracional, de preservar uma conquista – ou ao menos podem ser tomadas como tal. Em muitos outros esportes, esta tentativa é até institucionalizada: no futebol, por exemplo, o zagueiro pode tentar rasgar o joelho do atacante adversário antes que ele chute a gol. Se fizer bem feito, o árbitro sequer notará o pênalti, e tudo acabará por isso mesmo.

No futebol como no nazismo, a violência sistemática se justifica em nome da coletividade, do interesse do time.

Sabemos racionalmente que quando a situação é transposta para uma tonelada de metal com gasolina dentro em alta velocidade, a questão se torna mais séria. Mas nosso inconsciente (talvez pelo fato de vermos jogos e corridas sentados em um sofá confortável, pela tv) não se dá muita conta da diferença. Um acidente proposital e um pênalti são condenáveis, mas não imperdoáveis.

Além do mais, quem jamais se colocou numa situação de tudo-ou-nada? Empiricamente ou instintivamente, todos sabemos o que é isso. E todos sabemos que somos propensos a agir da mesma forma, ainda que condenável. E qual motorista brasileiro nunca passou no sinal vermelho, mas que tinha ‘acabado de fechar’?

(Continua)

Monday, September 14, 2009

Fiat iustitia et pereat mundus – parte 1/4


Prost, Senna, Schumacher

O que há de tão ultrajante na batida de Piquet em Cingapura que faz
alguns nomes do jornalismo especializado pregarem seu afastamento do esporte? A questão parece simples, e não é? Claro que não. Vamos à jurisprudência:

GP do Japão de 1989: Prost joga seu carro em cima do de Ayrton Senna, na volta 44.

GP do Japão de 1990: Senna força uma batida com Alain Prost na primeira curva após a largada.

GP da Austrália de 1994: Michael Schumacher bloqueia Damon Hill após uma saída de pista.

GP da Europa de 1997: Michael Schumacher força uma colisão com Jacques Villeneuve – sem sucesso, porém.

Se tais casos fossem punidos com a mesma severidade que Nelsinho Piquet “merece” (sua exclusão do esporte a motor), a história da categoria que amamos nos seria irreconhecível. Atenhamo-nos aos fatos. O que estes casos têm em comum? Eles envolvem disputas diretas pelo título. Todos menos um foram bem sucedidos – em nenhum houve interferência judicial (no qual o réu foi quem bateu). Todos envolvem campeões mundiais. Todos envolvem pelo menos um piloto considerado muito acima da média.

Não há nenhum dado objetivo que torne mais justificável uma batida proposital para vencer um campeonato do que uma batida proposital instruída por superiores. Pelo contrário, a colisão de Nelsinho foi potencialmente muito menos letal. Mais: pode-se alegar assédio moral, enquanto os quinze títulos listados acima agiram por vontade própria.

Por que perdoamos Prost, Senna e Schumacher com mais facilidade que Nelsinho?

A resposta para tal paradoxo só pode estar em nós mesmos. E, com sorte, nos próximos posts.

O título significa, em tradução livre: “Faça-se a justiça e o mundo perecerá”. Saiba mais sobre ela
clicando aqui (em inglês).


Wednesday, August 5, 2009

Ayrton Senna é pop


Se Schumacher vai ser a sensação em Valência daqui a alguns domingos, ao que tudo indica terá um forte concorrente: porque Ayrton Senna promete dominar todas as outras pistas espanholas neste verão. Pistas de dança, diga-se.

Pois qual não foi a minha surpresa ao ver hoje na coluna do Thiago Ney, na Folha de S. Paulo, o nome do piloto brasileiro em destaque. Trata-se do mais recente álbum de uma banda espanhola chamada Delorean.

Delorean é formada por quatro bascos, residentes em Barcelona, vindos de uma sólida reputação na cena indie pop local. Com "Ayrton Senna", impressionaram os críticos da coisa e ganharam um punhado de resenhas positivas ao redor do mundo.

"Ayrton Senna" é pop, descartável até. Superficialidade, nesse caso, não é defeito de caráter- é pré-requisito.

Das cinco faixas que o álbum contém, é possível ouvir duas na página da banda no MySpace: "Seasun" e "Deli", calcadas em sitetizadores, a segunda notavelmente de mais fácil apreensão.

Mas o súbito interesse deste blog pelo dance não vem da música em si. O mistério é por que cazzo uma banda indie espanhola tomou o nome do piloto brasileiro para seu álbum.

O colunista do Guardian esboça uma resposta: "obviamente soa mais glamouroso e exótico que Graham Hill". A explicação pode funcionar o bastante para um inglês. Não para nós.

A que Senna, depois de mais de 15 anos, remete a um jovem espanhol em Barcelona? Ou a um jovem europeu em Ibiza? O que ainda leva seu nome aos Pachás ou a um obscuro clube madrilenho?

E a nós, típicos entusiastas de corrida, na maioria brasileiros? Certamente não tanto ao bon vivant que o piloto se permitiu ser em certos momentos, quanto ao compenetrado piloto sério nos boxes, agressivo nas pistas e impenetrável pouco antes da morte. Para alguns, talvez até maioria, basta ouvir seu nome para ver à frente aquela Williams azul e branca pela qual sequer disputou três GPs completos. Outros se põem a listar fatos cujo sentido mal apreendem: "aquela primeira volta", "aquela sexta marcha", "aquela batida com o Prost".

Não devemos esquecer de uma fatia que se compraz em "destecer o mito", frequentemente usando o termo "Rede Globo" como justificativa. Subitamente, sabe-se lá de onde (certamente de onde a Globo não pega) "Ayrton Senna" ressurge. Se há algo que Delorean nos faz ouvir é que talvez, em nossa superficialidade cotidiana, nossa pressa em descartar, alguma dimensão do piloto tenha nos escapado.

Ayrton Senna é pop - agora sem aspas.

Tuesday, July 28, 2009

Massa, outra vez Senna


No excelente texto Comunicação de Massa (atualizado), publicado em seu blog, Alessandra Alves aborda o acidente de Felipe Massa através do flerte com o sensacionalismo com que a mídia trata o caso.

Ela também deixa transparecer uma outra questão. As condições misteriosas do acidente, o atendimento médico, a agitação nos boxes. Galvão Bueno diz e repete: “Nunca pensei que teria de dizer isso novamente: vá com Deus, meu amigo...”.

Em 2001, em meio a uma temporada vencedora na Fórmula 3000 Europeia, a Autosprint estampou Massa em uma capa que perguntava: “È il nuovo Senna?”. O acidente de sábado é a irônica resposta. Pois tudo parece recapitular aquele outro acidente, de quinze anos atrás.

Outra vez um acidente, outra vez com um brasileiro. Outra vez o piloto não reage. Outra vez um helicóptero, um hospital. Um capacete com as mesmas cores desfigurado. O registro ao vivo, a imagem explorada, passada mais uma vez e mais outra.

Como em uma relação especular, alguns sinais aparecem trocados. O mais óbvio: ao invés do óbito, a recuperação.

No entanto, podemos estendê-las. Rubens Barrichello, por exemplo exerceu um protagonismo singular em ambos os casos. Em Imola, ele foi a vítima do primeiro acidente, aquele que saiu esanguentado do carro. Ayrton Senna pulou o muro do hospital e saiu para dizer aos repórteres que Rubinho passava bem.

Em Budapeste, é do seu carro que sai a peça a atingir Felipe. Tal como Senna, agora é ele a ter acesso ao hospital, a demonstrar zelo em relação ao colega.

E de repente, aquela sua tia que não gosta de Fórmula 1 ficou parada em frente à tv, enquanto a repórter falava à frente de inscrições em húngaro. A manchete de capa dos jornais estampa o acidente. O telejornal deixa de abordar o futebol para falar da corrida.

Eis a relação especular mais estranha entre Senna e Massa. O trauma deixado pelo primeiro afastou a opinião pública da Fórmula 1. O trauma causado pelo segundo, pela primeira vez, faz o automobilismo sair da esfera dos entusiastas para restituí-lo ao público amplo. Ao menos por algum tempo.




Tuesday, May 12, 2009

Pequeno inventário de pilotos vitimados em 1994


As lembranças ao 1o de maio de 1994 já se passaram, mas tomo como obsessão, neste ano, tentar produzir o tanto quanto possível de discurso em relação ao fatídico ano. Ainda estou no início da empreitada; nada mais justo que começar pelo básico: pequena lista de ocorrências e eventos significativos do período.

Interessante notar que as fatalidades não começaram nem terminaram com o famigerado GP de San Marino. Caso você sinta falta de alguma menção no inventário, deixe registrado. Prometo atualizar e citar a fonte.

JJ Lehto
21 de janeiro. Lesões no pescoço obtidas em acidente durante seu primeiro teste com a Benetton, em Silverstone, na pré-temporada. O choque ocorreu a 225 km/h. Foi submetido a uma cirurgia na coluna. Afastou-se das duas primeiras provas da temporada, regressando no GP de San Marino com uma proteção na cervical.

Jean Alesi
30 de março. Lesões nas costas decorrentes de acidente em Mugello, no qual o piloto colidiu a mais de 200 km/h com as barreiras de proteção na curva Arrabiatta. Permaneceu alguns instantes inconsciente e com um braço temporariamente paralisado. Não pôde disputar os GPs do Pacífico e de San Marino.

Rubens Barrichello
29 de abril. Uma saída de pista que se transforma em voo na Variante Bassa, em Imola, o deixa inconsciente por alguns momentos. Um nariz quebrado e outras lesões menores o impede de correr o GP de San Marino. (corrigido / indicação de André Rozaboni)

Roland Ratzenberger
30 de abril. Morto em consequência de uma batida na curva Villeneuve, durante os treinos para o GP de San Marino.

Ayrton Senna
1o de maio. Morto após batida na curva Tamburello, durante o GP de San Marino.

- 1o de maio. Uma roda de Michele Alboreto se solta no pit lane, ferindo levemente três mecânicos da Ferrari e um da Lotus.

Karl Wendlinger
12 de maio. Batida em Mônaco, na saída do túnel, durante os treinos de quinta-feira, deixa o piloto da Sauber em estado de coma, no qual permanece durante 15 dias.

Pedro Lamy
24 de maio. Choque durante testes da Lotus em Silverstone quebra as duas pernas do piloto. Afasta-se das competições até o GP da Hungria de 1995.

Andrea Montermini
28 de maio. Sofre traumatismo craniano e ruptura do tornozelo em decorrência de choque contra muro de proteção em Montmeló, durante treinos livres para o GP da Espanha. Retorna ao automobilismo apenas no ano seguinte.

Friday, May 1, 2009

Há 15 anos, um primeiro de maio

“Os bons e os maus resultados dos nossos ditos e obras vão-se distribuindo, supõe-se que de uma forma bastante uniforme e equilibrada, por todos os dias do futuro, incluindo aqueles, infindáveis, em que já cá não estaremos para poder comprová-lo, para congratular-nos ou pedir perdão, aliás, há quem diga que isso é que é a imortalidade de que tanto se fala”.
Saramago, Ensaio sobre a cegueira

Considero já escrito – por mim e por outros – o necessário sobre os quinze anos dos eventos do GP de San Marino de 1994. Falo hoje por meu silêncio e pela citação acima.

Os interessados nos posts mais recentes sobre o tema podem encontrá-los nos links abaixo:

Os dez anos do GP de San Marino de 1994
GP de San Marino de 1994 – Treinos oficiais de sábado (parte I)
GP de San Marino de 1994 – Treinos oficiais de sábado (parte II)

Thursday, April 30, 2009

GP de San Marino de 1994 - Treinos oficiais de sábado

(continuação)

Reginaldo Leme pergunta a Barrichello qual foi sua reação ao ver as imagens do impacto pela primeira vez, algo que acontecera há poucos minutos. “Foi bem mais impressionante do que quando eu estava guiando o carro”, exclamou. Ele explica que sua memória apagou logo após esterçar o carro à esquerda e perceber que iria sair da pista. “O Geraldo [Rodrigues, empresário do piloto na época] tinha dito pra mim que você perguntou pra ele ‘Quem bateu em mim?’”, emenda Galvão. “[risos] Não, eu sei que ninguém bateu em mim, eu estava fazendo uma volta muito rápida, dando o máximo que eu podia, e acabei na barreira [hesita brevemente] sem problema nenhum, graças a Deus”.

Damon Hill passa um segundo acima do tempo de Ayrton. Pulou da sétima para a quarta posição. Mais uma volta, e fica a seis décimos de seu companheiro. Pouco antes de chegar na Villeneuve, a câmera o flagra passando por uma Simtek. Era David Brabham.

Hill dá mais uma volta, e antes que possa completá-la, a transmissão corta para um carro despedaçado rodopiando. O capacete do piloto pende para um lado. O GC confirma o nome: Ratzenberger.

Paralisação
Poucos notam o heroísmo dos três fiscais que primeiro chegam ao local, cruzando a pista sem que o treino tenha sido interrompido.Finalmente, a bandeira vermelha.

As câmeras captam cada detalhe do socorro, a cara preocupada de um fiscal, o trabalho dos paramédicos para retirar o piloto do cockpit, alguém coordenando a operação. Enquanto isso, Galvão critica o regulamento desportivo, que teria deixado os carros mais inseguros. “Eu até perguntei isso para o Senna ontem e ele ficou quieto (...) Não sei nem se eu estou falando besteira, depois quero até a opinião do Rubinho”. O narrador chega a pedir para os espectadores não olharem ao ver que Ratzenberger estava recebendo massagem cardíaca, e que havia sangue no local.

Barrichello assistiu a tudo da cabine da Globo. Enquanto emitia sua primeira e transtornada opinião, via-se que a Simtek fechava os portões de seu boxe. A massagem cardíaca se estende por um bom tempo. Rubinho toma a palavra. “O que eu acho que deveria existir nas pistas é muita área de escape. Por exemplo, lá na Bélgica em Spa-Francochamps, a Eau Rouge é uma curva que deveria ter uma área maior”.

Galvão lembra que Senna tinha sido o primeiro a conversar com Barrichello no hospital (contrariando, inclusive, indicações médicas), e forneceu inclusive as primeiras informações à imprensa.

O próprio Senna aparece então na tela, negociando uma carona até o local do acidente em um carro oficial. O longo caminho é inteiro filmado, até ele sair do carro, na curva Villeneuve.

Galvão pede as palavras de Barrichello sobre a decisão de Williams e Benetton de não correrem a segunda parte do treino. Foi sua última fala antes de sair da cabine de transmissão. Ele ressalta como os pilotos se sentem mal com um acidente de um adversário. “O Ayrton ontem comigo, se preocupando com acidente, esses momentos são os mais importantes da nossa vida, às vezes receber a bandeirada em primeiro não é o mais importante, mas sim ter um amigo do lado. Principalmente um amigo que para mim é um ídolo há muito tempo”.

Aproximadamente uma hora depois de paralisado, o treino recomeça.

Monday, April 27, 2009

Os dez anos do GP de San Marino de 1994

Foi com uma certa incredulidade, mas não muita, que Button apareceu na pole position. Ninguém sabia ao certo como isso ocorrera, mas a BAR, era fato, tinha o segundo melhor carro do grid. Contudo, a categoria parecia estar mais igual do que nunca. A Fórmula 1 alinhava em Imola para o GP de San Marino de 2004.

2009. Com certa incredulidade, mas não muita, Button aparece como líder do campeonato. As recentes mudanças de regulamento e de hierarquia das equipes dominam a discussão sobre a categoria. Ninguém parece saber o quê ou o quanto exatamente a categoria mudou.

Era dia 25 de abril quando a Lotus preta abriu sua volta, uma bandeira presa ao santantônio, Gerhard Berger ao volante que um dia pertenceu a seu adversário. Cinco anos atrás, a Fórmula 1 reservava alguns momentos para se debruçar sobre seu passado recente e se perguntar: o que foi que aconteceu, exatamente, naquele 1o de maio?

Foi, sem dúvida, o fim de semana que havia transformado a categoria naquilo que ela se tornara: um esporte seguro. Hipocondriacamente seguro. Um investimento seguro.

Em 2004, parecia ter se tornado possível, de repente, ver aquela fatídica temporada de forma mais distanciada. Uma década distanciada, para ser mais exato.

Não que Senna estivesse reduzido a um nome no passado, muito pelo contrário. Um pequeno santuário no muro de proteção da chicane Tamburello, outrora curva Tamburello, se fazia em homenagem a sua mais ilustre vítima. Richard Williams, correspondente do Guardian para aquela prova, relata que o brasileiro era a figura mais falada do paddock no fim de semana. "Dez anos após sua morte, sua ausência nunca foi tão óbvia", afirma.

Presença e ausência
"Em um curto prazo", continua o jornalista, "sua morte exerceu um efeito extraordinário na popularidade do esporte. Como se puxada para o vácuo, a audiência em tv quadruplicou nos oito anos seguintes, estimulada pela lembrança de que as corridas de grand prix são um mundo em que os jovens e glamourosos flertam deliberadamente com o perigo. Agora, após a queda recente, um esporte problemático reza pela emergência de alguém com sua combinação de agressão e refinamento, de brutalidade e gentileza, de ambição e uma graciosidade quase felina".

Logo a seguir, Williams desmente o que não precisa ser perguntado: "Schumacher não é a resposta". E não só ele. Paulo Nogueira, em um artigo para a Quatro Rodas (maio/2004) parece dizer o mesmo:

"Senna, como piloto, não foi tão cerebral quanto o francês Alain Prost. Também não foi tão audaz quanto o leão Nigel Mansell. Nem teve a ventura de Niki Lauda ao sobreviver a um acidente assombroso. E no entanto parece infinitamente maior que todos os seus rivais nas pistas. Nos últimos anos, as sucessivas vitórias do alemão Michael Schumacher contra adversários nanicos inspiram mais tédio e estatísticas que devoção".

Como relatou Richard Williams, no dia do GP funcionários foram instruídos a apagar uma mensagem pintada em letras garrafais no muro da Tamburello, "Ayrton sempre numero 1 - il più grande". Motivo: poderia distrair os pilotos.

A memória
O brasileiro ainda era lembrado pelos seus méritos, suas conquistas, pelo 'tema da vitória'. "Mas nenhuma imagem se compara à de seu acidente", completa Nogueira. "Ela domina, soberana, as recordações. Tantas glórias e no entanto é a visão da morte que emerge vitoriosa". Será a morte a grande responsável pelas conquistas de Senna? Será o piloto apenas idolatrado por ter sido vista sua por milhões ao vivo sua passagem do mundo dos vivos?

Se algo é certo, é que boa parte da memória coletiva parece ter esquecido das manobras controversas, das inúmeras discussões em que ele entrou sem ter razão. Ele não foi um santo, mas é beatificado.

Mitologizado ou não, a categoria, seu público seus dirigentes, pareciam sentir falta de algo. Richard Williams a coloca em palavras:

"Algo em Senna levou as pessoas às corridas de Grand Prix. Ontem [dia da corrida], enquando seus sucessores não-distraídos se balançavam através das curvas da chicane que substituiu a Tamburello após sua morte, motores cortando e retomando enquanto o controle de tração atuava, a Fórmula 1 parecia e soava mais do que nunca como uma cruel paródia de si mesma".

Schumacher se aposentou. Os controles de tração se encontram banidos. A Fórmula 1 não corre mais em Imola e talvez Senna não seja mais tão lembrado. Hoje vivemos outras mudanças, embora o mesmo piloto esteja largando na frente.

No entanto, as mudanças de carros na ponta, regulamentos e circuitos não vieram à toa neste ano. Seja lá qual for seu efeito, elas continuam tributárias desse mesmo GP de San Marino de 1994. Ayrton Senna ainda se faz presente.

Friday, October 17, 2008

Massa não supera Senna nos televisores


Já é uma notícia antiga, mas passou batida na blogosfera (talvez preocupada demais com as páginas esportivas, se esquece de outras mais interessantes). A coluna de Daniel Castro na Folha de S. Paulo, saiu, no dia 22 de setembro, com a manchete “Audiência ignora ascensão de Felipe Massa”.

Resumindo, a medição do Ibope na Grande São Paulo mostrou que a média deste ano nas primeiras 14 corridas da Fórmula 1 foi de 16,5 pontos, ante 16 nas primeiras 14 corridas do ano passado. Cada ponto equivale a 56 mil domicílios, ou 1% das residências da região.

Não é um crescimento expressivo, mesmo comparando-se com anos em que os brasileiros eram figurantes no grid. Em 1998, por exemplo, a média da Globo com corridas foi de 15 pontos.

Até o GP da Itália, Mônaco registrou a maior audiência, com 20,2 pontos. A corrida de Monza foi a segunda mais assistida pelos paulistanos, com 20,1 pontos. Nada comparável à era Senna: em 1993, o GP da Itália marcou 29 pontos. Note-se que o final da temporada daquele ano Senna enfrentava uma fase difícil, sem vencer há meses.

Os números vêm a comprovar a tese de que um piloto brasileiro precisa de muito mais do que uma série de vitórias para fazer sombra, como fenômeno midiático, a Ayrton. Em seu mestrado, o jornalista Rodrigo França ressalta que Senna não foi somente um bom piloto para o Brasil, mas um ídolo que surgiu no exato momento em que o país precisava de um herói.

Em meados dos anos 80, a seleção brasileira de futebol estava em frangalhos. Piquet brigara com a grande mídia. Ayrton surge com sucesso precoce em 1984, quando o país se une para exigir o fim da ditadura militar. No mesmo dia em que é anunciada a morte do presidente não-empossado Tancredo Neves, Senna vence sua primeira corrida.

Quando o Brasil de Zico fracassa definitivamente na Copa do Mundo de 86 no México, contra a França, Ayrton ergue a bandeira nacional ao vencer em Detroit. A seu lado no pódio, dois franceses...

Diretas Já, inflação, Plano Collor. Em meio às turbulências políticas e econômicas do país, o inconsciente coletivo brasileiro se apegou na figura do piloto como imagem de um vencedor, de um campeão, uma certeza de sucesso. Boa parte da auto-estima de um povo estava devotada em uma única figura.

Costuma-se dizer que o ídolo Senna começou a ser construído após sua morte. Está errado. Ele era um herói antes mesmo de ganhar seu primeiro título. A Rede Globo de Televisão não participou diretamente da construção desse ídolo, mas o fomentou. Tampouco está correto dizer que Ayrton Senna piloto é uma persona independente do Ayrton Senna herói.

Como piloto e como ídolo, Ayrton Senna é um fenômeno singular e complexo, que rejeita simplificações e estereótipos. E é ele, e não Hamilton, Raikkonen ou Alonso aquele com quem Felipe Massa deve brigar. Ao menos nos índices de audiência.

Obs: Tive o prazer de escrever uma matéria sobre a tese de Rodrigo França, em 2006. Quem quiser ler, pode clicar aqui.

Wednesday, August 13, 2008

Nem tudo deu certo no Estoril


Quem ouve a história da primeira vitória do Senna ou a viu na televisão deve se recordar do domínio absoluto do piloto na corrida.

Porque ele venceu com larga vantagem sobre o segundo colocado, porque ele foi o pole position, porque o carro dele rendeu bem, porque choveu... E, foi, sim, um domínio absoluto. Não só liderou todas as 67 voltas, como foi o mais rápido em pista em 65 delas (numa das voltas em que ele não foi o mais rápido, saiu da pista e colocou as quatro rodas na grama encharcada, tendo a sorte de voltar ileso à prova).

Segundo o Galvão, foi o mais rápido em todos os treinos.

Mas, como prova a foto, esteve longe de ser um passeio... Em uma das sessões, uma falha mecânica o deixou a pé. Um momento entediante, de fato.

E, por mais que na chuva ele fosse muito superior, não havia caído uma gota no fim de semana inteiro, e a largada foi dada sob pista encharcada, num GP em que não parou de chover. O acerto dos carros, muito antes da telemetria, foi feito às cegas (Estoril tinha sido usada só uma vez antes pela Fórmula 1, seca).

Qualquer coisa poderia ter acontecido na corrida. Talvez por isso tenha sido memorável.