Em linhas gerais, “devir” é uma concepção de mundo baseada na eterna mutabilidade das coisas. Em outras palavras, que nada ‘é’, mas ‘está’; o estado das coisas é transitório; e que qualquer tentativa de se afirmar algo categoricamente é uma mentira ou uma forma reducionista de se lidar com o mundo.
O primeiro a considerar o devir seriamente neste fim de semana foi Heikki Kovalainen. Apesar de pole position, suas declarações foram sóbrias – lembremos quantas corridas nos últimos anos a gente disse que ‘foram decididas aos sábados’, e mesmo assim o pole se mostra apreensivo.
E, tão logo as luzes vermelhas se apagaram, o GP da Grã-Bretanha se mostrou num devir exemplar. Basta notar a fragilidade da posição de cada piloto ao longo da corrida: algúem contou o número total de ultrapassagens? O número total de rodadas ou saídas de pista? O número total de trocas de posição?
A fragilidade das posições de pista também se estende à própria personalidade dos pilotos. Hamilton, aquele que sempre erra sob pressão, aquele que não sabe lidar com suas emoções, foi o que menos cometeu erros durante a corrida, se é que se pode contar aquela saída de pista na Abbey, no momento de chuva mais intensa, como um erro.
Kubica, líder do campeonato por algumas voltas, viu sua corrida calculada desabar como um castelo de cartas, atolado na caixa de brita. Barrichello e seu treino vergonhoso: com Ross Brawn na Honda e com os pneus certos, se tornou o melhor piloto da prova – e, se seu cockpit estava ameaçado para o ano que vem, agora parece mais verossímil que o brasileiro aposente Button.
Heidfeld, tão apagado pela enorme sobra do polonês com quem divide a equipe, hoje teve uma performance infinitamente mais brilhante que o outro piloto da BMW. Massa, que parecia ter se reconciliado com a chuva em Mônaco, foi atropelado pelo clima. Vejamos, então, o pódio: o pressionado e afoito em primeiro, o desmotivado em segundo, o carro-decepção do ano em terceiro.
Nem tudo mudou, porém: vale dizer que Alonso, Kovalainen, Webber e Raikkonen, alguns mais do que outros, outra vez provaram ser gênios.
E por que esta foi uma corrida assim, tão escorregadia a previsões? Pegue uma pista de curvas rápidas, carros de Fórmula 1 sem controle de tração e misture com água, muita água, que varia de forma desigual ao longo do tempo.
A essa ‘variação desigual’, a essa espécie de caos um historiador italiano chamado Carlo Ginzburg (pense nele como o Tazio Nuvolari da micro-história) deu o nome de Paradigma Conjectural – já falei disso antes, chamando-o erroneamente de “paradigma do caos”. Se a modernidade se sustentava no poder da dedução, do cálculo racional, ela começou a romper-se quando se notou a importância do saber indiciário, do pormenor revelador.
Em Silverstone, a melhor estratégia de box programada antes da corrida, deduzida pelos engenheiros e seus computadores, foi destruída pelas menores gotas de chuva que caíram no circuito. Da mesma forma, o melhor acerto de um carro deduzido pela equipe técnica mais bem paga foi arrasado pela menor variação da velocidade do vento sobre a pista.
Ironia das ironias, o devir se faz presente quando se nota que mesmo Silverstone, uma pista tão simbolicamente forte no calendário da Fórmula 1, está com seus dias contados na categoria. Se há poucos anos ela tinha um calendário quase imóvel e uma hierarquia de carros inabalável, hoje vimos carros rendendo de forma muito diferente ao longo da mesma prova (Ferrari ultrapassada por Honda!), posições de pista variando quase aleatoriamente, identidades móveis... Fórmula 1, bem-vinda de volta à pós-modernidade!
O primeiro a considerar o devir seriamente neste fim de semana foi Heikki Kovalainen. Apesar de pole position, suas declarações foram sóbrias – lembremos quantas corridas nos últimos anos a gente disse que ‘foram decididas aos sábados’, e mesmo assim o pole se mostra apreensivo.
E, tão logo as luzes vermelhas se apagaram, o GP da Grã-Bretanha se mostrou num devir exemplar. Basta notar a fragilidade da posição de cada piloto ao longo da corrida: algúem contou o número total de ultrapassagens? O número total de rodadas ou saídas de pista? O número total de trocas de posição?
A fragilidade das posições de pista também se estende à própria personalidade dos pilotos. Hamilton, aquele que sempre erra sob pressão, aquele que não sabe lidar com suas emoções, foi o que menos cometeu erros durante a corrida, se é que se pode contar aquela saída de pista na Abbey, no momento de chuva mais intensa, como um erro.
Kubica, líder do campeonato por algumas voltas, viu sua corrida calculada desabar como um castelo de cartas, atolado na caixa de brita. Barrichello e seu treino vergonhoso: com Ross Brawn na Honda e com os pneus certos, se tornou o melhor piloto da prova – e, se seu cockpit estava ameaçado para o ano que vem, agora parece mais verossímil que o brasileiro aposente Button.
Heidfeld, tão apagado pela enorme sobra do polonês com quem divide a equipe, hoje teve uma performance infinitamente mais brilhante que o outro piloto da BMW. Massa, que parecia ter se reconciliado com a chuva em Mônaco, foi atropelado pelo clima. Vejamos, então, o pódio: o pressionado e afoito em primeiro, o desmotivado em segundo, o carro-decepção do ano em terceiro.
Nem tudo mudou, porém: vale dizer que Alonso, Kovalainen, Webber e Raikkonen, alguns mais do que outros, outra vez provaram ser gênios.
E por que esta foi uma corrida assim, tão escorregadia a previsões? Pegue uma pista de curvas rápidas, carros de Fórmula 1 sem controle de tração e misture com água, muita água, que varia de forma desigual ao longo do tempo.
A essa ‘variação desigual’, a essa espécie de caos um historiador italiano chamado Carlo Ginzburg (pense nele como o Tazio Nuvolari da micro-história) deu o nome de Paradigma Conjectural – já falei disso antes, chamando-o erroneamente de “paradigma do caos”. Se a modernidade se sustentava no poder da dedução, do cálculo racional, ela começou a romper-se quando se notou a importância do saber indiciário, do pormenor revelador.
Em Silverstone, a melhor estratégia de box programada antes da corrida, deduzida pelos engenheiros e seus computadores, foi destruída pelas menores gotas de chuva que caíram no circuito. Da mesma forma, o melhor acerto de um carro deduzido pela equipe técnica mais bem paga foi arrasado pela menor variação da velocidade do vento sobre a pista.
Ironia das ironias, o devir se faz presente quando se nota que mesmo Silverstone, uma pista tão simbolicamente forte no calendário da Fórmula 1, está com seus dias contados na categoria. Se há poucos anos ela tinha um calendário quase imóvel e uma hierarquia de carros inabalável, hoje vimos carros rendendo de forma muito diferente ao longo da mesma prova (Ferrari ultrapassada por Honda!), posições de pista variando quase aleatoriamente, identidades móveis... Fórmula 1, bem-vinda de volta à pós-modernidade!
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