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Sunday, November 13, 2011

Constante e variáveis

Em 2011, nos acostumamos a um domínio tão extenso de Vettel, à certeza convicta de sua liderança, que, no final das contas, sua supremacia o acabava anulando. De forma que, exceto para fins classificatórios, uma corrida sem Vettel deu quase na mesma que uma corrida com Vettel.

Porque desde meados de maio a disputa pelo vice se tornou mais instigante que a disputa pelo campeonato. Vettel era a constante. As variáveis vinham logo atrás.

Hoje, depois da primeira volta, o alemão não estava mais na pista. Mas o ano inteiro foi assim: era como se estivesse correndo em sua própria categoria, inalcançável, fazendo uma prova que, com a prova dos outros, só tinha em comum a hora e o local.

Perdemos a ilustre presença do campeão na pista. Em compensação, ganhamos um jovem agitado nos boxes, que a câmera não parava de perseguir. Curioso como uma criança, ele ouvia as explicações do mecânico sobre a roda danificada. Alheio, vasculhava algo desimportante no notebook. Deslocado, trocava algumas palavras com Horner.

Enquanto isso, a corrida seguia sem muito a ser visto - prova disso é o tempo gasto pela transmissão com disputas no fundão. Button, Webber e Massa criaram uma zona de indefinição logo atrás do segundo lugar, e só. À frente, Hamilton, correndo não só pelos pontos, mas para reencontrar a si mesmo. Funcionou. Alonso, mais atrás, esperava um erro ou desatenção que nunca veio da McLaren ou de seu piloto.

Poucas pessoas, Lewis entre elas, puderam chamar o que houve em Abu Dhabi de corrida. A grande maioria (nós) já deve ter percebido que Yas Marina não é um lugar para se ver automobilismo: é um suntuoso complexo feito com o propósito maior de se assistir à fama, ao jet set, à circulação do capital e à circulação de celebridades. Vettel que o diga.

Saturday, November 20, 2010

O vermelho e o negro


E o ano da Ferrari terminou numa parada nos boxes.

Quer dizer, terminou algumas dúzias de voltas depois, mas os planos da Scuderia caíram por terra, já que não era possível dizer, via rádio: "Vitaly, Alonso is faster than you. Can you confirm you understood this message?"

Mas, afora o teatrinho do espanhol depois da corrida, reclamando de Petrov e se recusando a cumprimentar o novo vencedor, convenhamos, não foi lá que os italianos perderam o campeonato. Afora a surpreendente reação do time, do final da temporada europeia para a frente, os grandes erros foram cometidos antes, bem antes. Pelo próprio Alonso.

Largada queimada na China, um toque desnecessário na largada em Melbourne... Os erros do espanhol no início de temporada obrigaram-no a fazer corridas de recuperação de encher os olhos, mas que, na prática, lhe roubaram pontos preciosos. Um paradoxo, portanto: provar ser um bom piloto e conquistar um campeonato podem ser fenômenos excludentes.

Mas ninguém vai se lembrar da Ferrari, este ano, por causa de ultrapassagens e brigas por posição, muito pelo contrario: Maranello sai de 2010 com uma imagem que não poderia estar mais enfraquecida.

A Ferrari, agora temos em mente, é aquela equipe que passa por cima do esporte em nome da vitória. Que está interessada nos troféus e não no que eles significam. De 2002 para cá, mudaram os pilotos, os dirigentes, o regulamento. Da Ferrari que mandou Barrichello ceder a vitória para Schumacher, só restou a cor vermelha - e também, agora sabemos, a ideologia.

O ano de 2010 custou muito mais à Scuderia do que um simples campeonato.

Monday, November 15, 2010

GP de Abu Dhabi 2010 - O homem que salvou o ano

Vettel conseguiu; apesar das quebras, de alguns erros, sim (mas não tantos), a Fórmula 1 tem um novo campeão.

O piloto da Red Bull era o terceiro na tabela quando largou. Seu companheiro de equipe, Mark Webber, já desde o dia anterior dava sinais de haver capitulado da disputa. E, não fosse uma série de circunstâncias bastante específicas, estaríamos aqui discutindo sobre a validade de jogos de equipe, sobre "talk to pass", sobre ética. Sobre Fernando Alonso ter sido campeão por causa de uma manobra fundamentalmente ilegal.

Não foi o caso. O caso foi Alonso ter sido excessivamente conservador na largada e perder o terceiro posto para Jenson Button. E, mais do que isso, o caso foi que a Ferrari errou feio.

Ao ignorarem que, chamando Alonso para o box cedo demais, ele retornaria atrás de Petrov (da Renault, única equipe com motores 0 km) e de Nico Rosberg, numa pista com poucas oportunidades de ultrapassagem.

Este ano os reabastecimentos foram proibidos e, por isso, a estratégia desempenha um papel muito menos importante numa corrida do que no ano passado. Por isso, somos levados a esquecer o quanto a Ferrari, na "gestão Domenicali", tem se notabilizado por falhas graves neste departamento. No último GP, essa questão voltou à tona.

Nada disso tira o mérito de Sebastian Vettel, o imberbe alemão que pilota com uma maturidade notável. Que foi muito mais rápido que seu companheiro ao longo do ano, mas sofreu mais com alguns percalços técnicos.

Vettel é rápido, consistente, agressivo e inteligente. Mas esta jóia encontrada por Helmut Marko (que, não por coincidência, subiu ao pódio para pegar o troféu da Red Bull) ainda não está completamente lapidada. Vide alguns pequenos erros durante o campeonato e sua performance ainda aquém, por exemplo, nos dois últimos GPs de Mônaco.

Este ano, sua pouca experiência bastou para levar o título. Merecidamente.

Foto: Clive Mason/Getty Images

Monday, January 25, 2010

O rio das lágrimas de Tadashi Yamashina

Em um post da semana passada, usei a história do Japão para desconstruir algumas explicações sobre a saída da Honda, da Toyota e da Bridgestone da Fórmula 1. Uma das imagens mais reveladoras desse processo de “êxodo japonês” da Fórmula 1, colocada acima, é o choro de Tadashi Yamashina. Também podemos aprender muito sobre a terra do sol nascente com este registro.

Até o ano passado, Yamashina desfilava pelo paddock (incógnito, diga-se de passagem) como o chefe da Toyota na Fórmula 1. Quando a equipe convocou uma coletiva de imprensa para anunciar que estaria fora da categoria, não foi capaz de se conter.

Podemos supor que a situação era tão delicada e embaraçosa quanto para, por exemplo, Mario Theissen em agosto último, ao fazer anúncio semelhante. No entanto Theissen não chorou. E se chorasse, talvez não tivesse desabado tal qual Yamashina.

Onde está, afinal, a nascente destas lágrimas? Uma pista valiosa pode ser encontrada em um artigo de Contardo Calligaris, psicanalista e colunista da Folha de S. Paulo, datado de fevereiro de 2006.

Intitulado “Culpa e vergonha”, Calligaris discorre: “Num livro famoso, ‘O Crisântemo e a Espada’, de 1946, uma grande antropóloga americana, Ruth Benedict, tentou entender a sociedade japonesa.”

“Ela chegou a uma conclusão que se tornou clássica: há sociedades em que o comportamento moral é regulado pela vergonha (por exemplo, o Japão) e outras em que ele é regulado pela culpa (por exemplo, as sociedades ocidentais modernas). Em cada tipo de sociedade, ambos os afetos estariam presentes como motivações e deterrentes, mas um deles seria dominante.”

“A vergonha parece ser um regulador perfeito para as sociedades tradicionais, em que, acima da lei, vigem os códigos de honra, a fidelidade ao legado dos ancestrais, o sentimento de uma missão simbólica da estirpe e da casta - ideais que permitem medir nosso valor e nossa dignidade.”

Já a culpa, escreve o colunista, teria uma origem na doutrina cristã “de que o indivíduo deve pouco ou nada a seu passado e aos grupos aos quais ele pertence, mas é contável diante de um Deus que sabe tudo e, em última instância, julgará e punirá ou recompensará”.

Em tese, tanto a culpa quanto a vergonha produziriam efeitos semelhantes. Eis o problema, pois, como adverte Calligaris, “a culpa é um péssimo regulador moral”.

“À primeira vista, que a gente acredite ou não nas penas do inferno, pareceria lógico que evitássemos as ações que (como sabemos sempre de antemão) não nos deixariam dormir tranqüilos. Mas qualquer terapeuta sabe que não é assim: a culpa funciona como uma espécie de pagamento antecipado. Autorizo-me a fazer algo que me parece errado justamente porque sei que me sentirei culpado, e meu sofrimento futuro compra, desde já, o perdão para meu ato”.

“A vergonha é um regulador moral muito mais eficaz que a culpa porque meu sofrimento por perder a face não repara minha honra. Enquanto a própria culpa absolve o sujeito culpado, a vergonha mancha, e sentir vergonha não restitui a dignidade de ninguém. A única cura da vergonha está nos atos futuros do sujeito”.


A foto de Yamashina chorando correu o mundo – ao menos, diga-se, o mundo ocidental moderno -, perplexos que ficamos com uma manifestação tão comovente de reconhecimento do fracasso.

Como Calligaris explica em um artigo posterior, a vergonha desempenha alguma regulação em sociedades como a nossa, não relacionada ao débito com nossos antepassados ou com nosso legado, mas com a imagem que os outros têm de nós. No entanto, o pensamento japonês, que enfatiza a dimensão simbólica do trabalho, estará a partir de agora ausente da Fórmula 1.

Da próxima vez que uma equipe encerrar as operações, provavelmente teremos que nos contentar com discursos decorados de executivos com voz empostada tentando nos convencer de que estão fazendo o bem. A ausência japonesa se fará sentir então numa Fórmula 1 cada vez mais homogênea.

Wednesday, November 18, 2009

McLaren-Mercedes, 1995-2009


A última corrida da parceria McLaren-Mercedes pode ser definida nos seguintes termos: Lewis Hamilton largou da pole, abriu uma boa diferença para o segundo colocado e abandonou em seguida. Difícil imaginar um epitáfio melhor.

Ambas continuarão aparecendo juntas na geração de caracteres das transmissões, já que os alemães permanecem como fornecedores de motores de Woking. A diferença é que agora a Mercedes não possui mais ações da McLaren Group, a relação de parceria foi desfeita.

Assim como a corrida de Hamilton há algumas semanas, fica a sensação do que poderia ter sido e não foi, de que terminou sem a missão cumprida. Talvez os números ajudem a explicar: Do GP do Brasil de 1995 (o início da parceria) até Abu Dhabi, A McLaren foi a segunda equipe mais vencedora, com 60 triunfos (obviamente apenas atrás da Ferrari, com 106). Foi também a segunda em pole positions, marcando 66 delas (Ferrari, nesse período, em primeiro lugar com 90).

No mais, em 15 temporadas a equipe conquistou não mais que três títulos de pilotos e um único de construtores, há mais de uma década.

Já havia escrito sobre o tema no ano passado, mas agora, com os números fechados, o retrospecto é ainda mais desolador. A McLaren já foi parceira da Porsche e da Honda, e em ambos os casos a equipe de Woking acumulou muito mais títulos em muito menos temporadas. Cabe ressaltar que a cooperação entre o construtor e as marcas se limitava à esfera técnica – ao contrário da Mercedes, que por sua vez era dona da McLaren. Por outro lado, nos anos 80 e início dos 90 não era comum que uma multinacional comprasse para si participação acionária em uma equipe – manobra que e tornou regra posteriormente.

Nos dois momentos em que a Mercedes havia participado de competições de Grand Prix, seu domínio havia sido quase total: tanto nos anos 1930 quanto em 1954 e 1955. Seu retorno aos monopostos, a partir dos anos 90, foi gradual; primeiro comprando a Ilmor, posteriormente juntando-se à Sauber (sua parceira nas provas de turismo) para entrar na Fórmula 1, para desistir em seguida e recomeçar com a McLaren.

Separadas, McLaren e Mercedes mantinham cada uma um retrospecto muito mais vitorioso do que unidas. Juntas, tudo que resta é o gosto amargo de ter ficado aquém. Um fracasso que os números quase não são capazes de demonstrar.


Sunday, November 1, 2009

GP de Abu Dhabi 2009 – O GP de Abu Ghraib e o triunfo do capital investido


Tantos especialistas debruçados sobre a corrida, e foi de um leigo (ao menos, não profissional) que recebi o comentário mais espirituoso e certeiro do fim de semana: “Esse prêmio de Abu Ghraib é uma tortura: não tem as curvas mortais de Suzuka e Spa-Francorchamps”.

O autor da frase é Claudio Júlio Tognolli, um dos mais famosos anônimos que já conheci. Jornalista veterano e prolífico, colecionador de palavras e meu professor na faculdade, que ultimamente vem se dedicando a criticar os blogs e a
twittar febrilmente. E sim, foi no Twitter que ele escreveu seu comentário.

As curvas travadas de Yas Marina, tal como
Abu Ghraib, são uma prisão que contrasta com a imensidão e o vazio do deserto. Dentro de seus limites o automobilismo se apequena frente à pujança do capital financeiro que se movimenta nas curvas pós-modernas das arquibancadas, dos iates e do hotel acima.

Foi comum ouvir as vozes habituais (de blogueiros a Galvão Bueno) se referirem ao Yas Marina como um “espetáculo”, que talvez designassem as instalações faraônicas ou o dinheiro colocado para erguer uma obra no meio do nada. “Espetáculo”, essa palavrinha que usamos mais ou menos frequentemente e que raramente conseguimos definir esconde uma definição bastante precisa do GP de Abu Dhabi.

Em 1967, quando a Fórmula 1 tinha muito mais graxa e muito mais graça, e muito menos câmeras ao redor, um enigmático incendiário chamado Guy Debord lançou um livro chamado “A Sociedade do Espetáculo”, cujas definições parecem cair como uma luva no automobilismo praticado hoje em dia. Segundo ele, o “espetáculo” não é apenas uma corrida ou um filme ou um programa de tv, mas sim um estágio do capitalismo em que nós, sujeitos, não mais possuímos a mínima relevância na vida econômica e social. Não somos mais atores do processo, somos meros espectadores assistindo os desdobramentos do capital.

Muitos autores comparam “A Sociedade do Espetáculo” à “Indústria Cultural” de Theodor Adorno, que escreveu sua obra em 1947, mas que ainda conserva uma atualidade desconcertante. O trecho abaixo se aplica a qualquer filme feito por Hollywood em tempos recentes:

“É com razão que o interesse de inúmeros consumidores se prende à técnica, não aos conteúdos teimosamente repetidos, ocos e já em parte abandonados. O poderio social que os espectadores adoram é mais eficazmente afirmado na onipresença do estereótipo imposta pela técnica do que nas ideologias rançosas pelas quais os
conteúdos efêmeros devem responder”.

Em outras palavras, ele afirma que as pessoas são mais atraídas em um filme pelos efeitos especiais que ele contém do que pelo conteúdo batido e bobinho da narrativa, que aprendemos a tolerar. Jamais exigiremos conteúdos novos, atuais e fascinantes enquanto houver explosões, batidas e cores vibrantes desfilando na tela.

Em Yas Marina, a corrida foi disputada no crepúsculo para que os milhões gastos em iluminação artificial pudessem revelar-se em pirotecnia. Vimos o pôr-do-sol, vimos os refletores acesos, vimos, acima de tudo e de todos, a cobertura do hotel trocando de tonalidades de novo e de novo e de novo.

Afinal, o circuito “moderno” e “de última geração” reproduz a mesma lógica da qual Adorno falava há 60 anos: uma pista tola revestida por uma “espetaculosa” camada de razão técnica. “A Indústria Cultural é o triunfo do capital investido”, dizia Adorno. Os bilhões de petrodólares gastos por Abu Dhabi apenas confirmam este raciocínio.

E já que estamos falando em corrida
Quase ia me esquecendo, houve uma corrida por lá. Dentro dos limites dos guard rails, a última corrida do ano provou cabalmente tudo o que já sabíamos. Em primeiro lugar, que a McLaren tinha o melhor carro, de longe, em circuitos de mentira.

Segundo, que a Red Bull tinha o melhor caro do ano. O azar deles foi ter descoberto isso tarde demais. Claro que isso se deve ao mérito da Brawn, que pode pendurar 2009 na parede e colocar seu nome em cima.

Terceiro, que esta corrida não valia nada. O que é muito positivo, pois traz de volta a leveza dos anos em que a Fórmula 1 tinha diversos eventos fora do campeonato. Na maior parte do ano, as tabelas e classificações nos tiram a atenção do “aqui e agora” (‘hic et nunc’) do automobilismo, e os pilotos são levados a acelerar com mais desapego. Isso se torna claro quando lembramos das corridas em Adelaide, que fecharam as temporadas de 1985 a 1995.


Assim sendo, a perseguição de Button a Webber nos metros finais recapitulou algumas disputas em GPs da Austrália de outrora, como Lafitte versus Streiff (1985), Piquet versus Mansell (1990), Berger versus Schumacher (1992) e tantos outros.

Yas Marina tem a grana que Adelaide nunca viu, mas não a paixão e o desafio que aquelas ruas australianas apresentavam. Infelizmente.

Wednesday, October 14, 2009

As primeiras voltas em Yas Marina

O jornalista e comentarista britânico James Allen, graças a seu bom trânsito com fontes no circuito de Abu Dhabi, recebeu em primeira mão o link do vídeo. São as primeiras voltas de um carro de Fórmula 1 (de dois lugares) em Yas Marina. Bruno Senna é o piloto.

Confesso que tinha uma ideia diferente da aparência da pista. Parece tudo, menos que foi construída onde há dois anos e meio era um deserto (mais precisamente, um banco de areia no meio do mar). O monte de edifícios pós-modernos e os postes gigantes de iluminação fazem o local se assemelhar mais a uma pista de pouso de ovnis. Atentem para a saída dos boxes, que na verdade é um túnel, e para o fim da grande reta, onde uma arquibancada se encontra suspensa acima da área de escape.