Monday, October 24, 2011

Seppi


Do jornalista inglês Nigel Roebuck:

Siffert tinha a pole position, mas fez uma péssima largada e seu companheiro Gethin assumiu a liderança, perseguido por Fittipaldi. Do pelotão intermediário, porém, Seppi começou a ganhar posições, e na volta 12 disputava duramente com Stewart pelo terceiro lugar. Eu estava na [curva] Druids na largada, após a qual andei de volta à Paddock. De lá olhei para a pista e fiquei atônito ao ver a densa e negra fumaça na área da Pilgrim's Drop, e depois com o pior de todos os sons de uma corrida de carros: o silêncio. Retornando à sala de imprensa, corri para onde estava Philip Turner, do "The Motor", e fiz a pavorosa pergunta daqueles dias: "Quem é?". "Siffert", disse, "e temo que esteja morto".

Era o dia 24 de outubro de 1971, em Brands Hatch, onde fazia um lindo dia de outono inglês. Naquele ano, o GP do México havia sido cancelado na última hora e, no lugar, foi organizado às pressas a World Championship Victory Race, corrida que não contava pontos para a Fórmula 1, no autódromo de Kent. Mesmo sem a presença das Ferrari e das Matras, a prova foi bem-sucedida no número de inscrições.

Era um pista que trazia boas memórias para Jo Siffert, suíço, 35 anos, na Fórmula 1 desde 1962. Foi lá que ele venceu o primeiro de seus dois GPs, em 1968, a bordo de uma Lotus pertencente a Rob Walker - o piloto fez a maior parte da sua carreira correndo nos times independentes.

Em 1971, porém, estava na BRM. Era um dos pilotos de ponta de uma equipe que, não raro, chegava a inscrever cinco carros em uma única prova. Foi um ano de sucesso para ele, que ganhou o GP da Áustria e chegou em segundo em Watkins Glen, três semanas de largar na pole, em Brands Hatch.

De volta a Roebuck:

No mergulho logo após a [curva] Hawthorn a BRM virou inexplicavelmente demais à esquerda, bateu na proteção, deu uma cambalhota e explodiu. Apesar de Seppi ter sofrido apenas uma quebra de tornozelo, ele morreu por asfixia em meio à fumaça e às chamas.

Foto: Jo Siffert durante o GP de Mônaco de 1971


Friday, October 21, 2011

Museo Ferrari, parte 2: a sala dos campeões


No último post, coloquei algumas impressões sobre o Museo Ferrari, que a própria equipe mantém em Maranello. Não é algo "aqui na esquina" para boa parte dos leitores, mas recomendo a visita. Afinal, é uma oportunidade de ter uma experiência mais direta com um esporte que, na esmagadora maioria das vezes, nos chega de maneira ultramediada.

Do ponto de vista museológico, e até histórico, porém, a galeria é decepcionante. Há defeitos flagrantes, muitos indesculpáveis - por exemplo, da única equipe em atividade que corria nos anos 50 e boa parte dos 60, há apenas um modelo de monoposto dessa época em exibição.

Mas os pontos mais falhos se concentram na chamada "sala dos campeões", uma das mais cobiçadas pelos visitantes. Não é por acaso que eles perdem tanto tempo lá: há um sem-número de troféus, carros e relíquias para entretê-los.

Lá estão expostos exemplares de todos os modelos Ferrari que ganharam o campeonato desde 2000, diversos troféus de 'winning constructor' (o mais antigo que vi foi de 1998), capacetes originais de campeões pela marca, de Fangio a Raikkonen - não me lembro de referências a Ascari.

Até aí, ok. O problema é a montagem. É uma sala escura, dominada por uma trilha sonora triunfalista tocada em looping que contamina o ambiente. Em algumas telas é exibido um vídeo de algumas conquistas da equipe, cortadas em forma de videoclipe. As cenas passam tão rápido que um especialista precisa de muita atenção (quando não algumas repetições) para identificar personagem e lugar de muitas das cenas.

Claro que boa parte da multidão de embasbacados (muito deles falando português) se contenta com isso. Mas ora, a Fórmula 1 é tão bem documentada, e aquilo lá é um museu... não seria mais interessante fazer algo mais didático, algo que desse mais conteúdo aos visitantes? Porque aquele vídeo (uns 5 minutos, em looping com a música triunfalista) só serve, se muito, para desaprender. Nem o nome dos pilotos, alguns dos quais morreram naqueles cockpits, eles se dignam a escrever.

Mas há coisas piores. Num momento de extremo mau gosto, o vídeo revela o ferrarista Patrick Tambay levantando a taça de vencedor do GP da Alemanha de 1982.

Para quem não sabe, poucas horas antes, a bordo de uma Ferrari, Didier Pironi havia se envolvido num acidente que o deixou meses no hospital e o afastou da F1 para sempre. Um acidente que o deixou com mais de 50 peças de metal incrustadas nas pernas, que o dr. Sid Watkins retirou em uma cirurgia realizada em plena pista.

A Ferrari prefere passar a borracha em seu funcionário a um passo da morte e editar o vídeo do pódio dando a entender que aquele foi um dia glorioso para a 'scuderia'.

Gostaria muito mais se a sala dos campeões fosse, ao invés, a sala dos mártires. Que tal colocar em exibição os modelos retorcidos que acabaram com a carreira de alguns e a vida de outros tantos? Se não instrutivo, seria ao menos mais respeitoso. Ou, melhor, coloque-os ao lado dos vencedores. Alguns acidentados merecem tanto ou mais a consideração.

Enfim, às fotos.

Visão geral das prateleiras de troféus de do público

Alguns dos capacetes, originais: Lauda (note as marcas), Scheckter, Schumacher, Raikkonen

Detalhe com alguns dos troféus

De uma época em que os carros tinham muito mais.. antenas. Detalhe do F2002, de 2002

... e mais alguns troféus

ATUALIZAÇÃO: Vendo as fotos de um amigo, me dei conta de que há, sim, uma menção (com capacete original e tudo) a Alberto Ascari na galeria dos campeões.

Wednesday, October 19, 2011

Museo Ferrari, parte 1: como chegar, o que ver

Mês passado, no domingo 25/9, estive em Maranello, sede da Ferrari, visitando seu museu. Achei que seria útil compartilhar algumas dicas e impressões neste espaço, e aí vão elas.

A primeira delas, aprendi da pior forma: evite ir no domingo. De Modena (onde o turista chega de trem) é preciso pegar um ônibus a Maranello, mas estes escasseiam e os horários de saída ficam mais esparsos. Por outro lado, em Modena, próximo à pista de jóquei (perto do terminal de ônibus), acontece uma feira de antiguidades todo último domingo do mês, que vale o passeio: moedas antigas, livros, objetos de decoração e revistas podem ser encontradas - adquiri, inclusive, duas "Quattroruote" dos anos 60.

O ônibus custa 5 euros (ida e volta) e o percurso leva em torno de meia hora. É possível comprar o bilhete com o motorista, e este lhe dirá quando descer - ou apenas siga o batalhão de turistas que fazem o mesmo percurso que você.

Dica importante: se possível, na ida, sente-se à direita do ônibus. Após uns 20 minutos, ao atravessar o viaduto, você terá uma vista impressionante do circuito de testes de Fiorano.

Descendo no ponto, vire na primeira esquina à direita, caminhe um pouco e, no meio de uma praça, você verá o Museo Ferrari.

Perto dele, há uma loja chamada Warm-up, ótima para comprar souvenirs após o passeio (fica aberta até as 19h). Há uma loja oficial lá dentro, mas tem preços altos e poucos itens - por exemplo, apenas um ou dois modelos de miniaturas 1:43.

A entrada do museu, que abre quase todos os dias do ano, custa 13 euros. Há visitas guiadas à fábrica e à pista de Fiorano em horários determinados e não muito caras - informe-se no site oficial.

Abaixo, um pouco do que encontrei por lá.

Uma 126CK (1981), de Gilles Villeneuve

Um modelo de protótipo-turismo 512M, dos anos 70

Uma vitrine com capacetes, macacões, luvas etc. de ex-pilotos. Aqui, de Gilles Villeneuve e Didier Pironi...

... mas também de Alesi, Prost e Mansell (canto inferior esquerdo). Este visto parcialmente à direita, pasmem, é de Gianni Morbidelli, datado de 1997, quando era piloto de testes do time

Uma réplica (mambembe) de um box da equipe em GPs. Também há a reprodução daqueles monitores montados no pit lane, de onde os chefes acompanham as corridas

Uma 375 do início dos anos 50 (todas as fotos dela saíram desfocadas, mal aê, leitores)

A sessão de carros de passeio não me inspira muito. Mas tá aí, pra registrar

Reproduções e dioramas são um capítulo à parte. Aqui, a primeira oficina da Ferrari, de 1934, ainda em Modena. Atrás dela (não é possível ver nesta foto) há uma instalação em tamanho real que reproduz o escritório de Enzo Ferrari (1898-1988) como ele o deixou antes de morrer

Também imperdíveis são as miniaturas de todos os F1 da marca

Uma sala contém maquetes de todas as instalações da equipe. A famosa Ferrari Enzo também está em exposição. Diversos motores, dos anos 50 até os dias de hoje, estão espalhados pelo espaço. No mais, há a sala dos campeões, com F1 mais atuais e outras relíquias, que virá em um post à parte.

Somos todos fãs, mas é evidente que o museu não é isento de problemas. A ausência de modelos dos anos 60, por exemplo, entristece.

Quer comprar um bom livro na saída? Desista. São todos caríssimos. Há livrarias em Milão mais completas, não hesite em adquiri-los lá.

A lanchonete do local quebra o galho. Além do mais, há uma televisão que passa os Grandes Prêmios, caso estejam ocorrendo.

Mais dicas e impressões em breve.

MUSEO FERRARI
Via Dino Ferrari, 43, 41053
Maranello, Modena
, IT

COMO CHEGAR: é preciso ir primeiro a Modena, que fica 40km a oeste de Bolonha. Há trens constantes desta para lá, bem como um trem direto de Florença (informe-se aqui). Saindo da estação de Modena, vá reto e depois à direita, seguindo até o final da Viale Monte Kosica. Lá, há um terminal de ônibus de onde saem partidas regulares para Maranello. Informe-se também sobre horários de volta, especialmente aos domingos e feriados.

Tuesday, October 18, 2011

Anvelopele MS sunt anvelope de iarna ?

Cauciucurile MS ( Mud, adica noroi & Snow, adica zapadă ) sunt cauciucuri de iarna ? Fiindca sunt in dubiu, am vorbit cu cativa agenti rutieri "face 2 face" si spunea ca ori nu stiu, ori ca daca au fulgul pe ele, doar atunci sunt de iarna, ori ca nu sunt cauciucuri de iarna.

Ideea e ca am vazut aseara o emisiune la B1 Tv cu Robert Turcescu, in care un sef al Politiei ( nu stiu care, oricum de la Bucuresti) spunea ca MS chiar sunt anvelope de iarna, din acelea de care sunt obligatorii de la 1 noiembrie 2011.


Exista undeva vreo lege sau vreun articol in care sa scrie exact acest lucru si sa o pot prezenta agentului rutier care doreste sa ma amendeze pe motiv ca anvelopele mele MS nu sunt de iarna ?

Monday, October 17, 2011

Well done, Wheldon


Ele tinha uma Indy 500 e um campenato da categoria para ostentar em seu currículo ao final de 2005. Recebeu uma ligação de Mario Theissen, então chefe da BMW-Sauber. Queria oferecer-lhe uma vaga na Fórmula 1 no ano seguinte. Como piloto de testes. Enfatizou, porém, que era possível que competisse em um GP já em 2006. Wheldon, cansado de ouvir que não se deve acreditar em tudo o que diz o pessoal da Fórmula 1, recusou.

Theissen chamou Kubica e Vettel para lugar de Wheldon. Em julho de 2006, quando Jacques Villeneuve fora demitido, o polonês entrou em seu lugar, e Vettel como piloto de testes, e o resto é história.

A Fórmula 1 havia sido o sonho daquele inglês que competiu roda a roda com Jenson Button em seus tempos de Fórmula Ford, e que se mudou para os EUA porque não tinha dinheiro para ingressar na Fórmula 3.

Mas não havia tanto motivo assim para se arrepender de suas escolhas. Aprendeu a correr em ovais e estes acabaram se tornando sua especialidade. Vivia em uma bela casa na Florida com a mulher e os filhos.


Outras decisões mal sucedidas nos bastidores marcaram sua carreira, como a saída da Ganassi em 2008, que o levou para a Panther e para o fundo do grid. No início deste ano, perdeu a vaga na Panther para o 'rookie' JR Hildebrand. Curiosamente, era Hildebrand que liderava a Indy 500 em maio passado, quando bateu, na última curva da última volta, deixando caminho livre para a vitória de Wheldon.

É difícil tolerar mortes no esporte que aprendemos a gostar, especialmente quando elas são estúpidas e levam consigo profissionais talentosos. Embora seja cedo demais para apontar culpados, colocar 34 pilotos - parte dos quais não têm preparo suficiente para tais condições - numa pista veloz e curta como a de Las Vegas certamente foi uma insanidade. E cobrou um preço alto.

Friday, October 14, 2011

Vettel, um pequeno ensaio sobre a juventude

De repente, a juventude se tornou um assunto importante. Pelo menos na Fórmula 1, na semana seguinte à conquista do bicampeonato de Sebastian Vettel, 24 anos. Venho falando disso ultimamente. No último post, considerei que as condições determinantes que levaram o piloto alemão a tantos êxitos tão cedo não deve se repetir no futuro próximo.

Mas a Fórmula 1 é um universo um tanto restrito para tais discussões. A juventude está em pauta em questões muito mais amplas. Acabo de voltar da Europa, onde meus contemporâneos estão em situação crítica.

Na Europa de Vettel, a crise econômica tirou o emprego de todos, mas especialmente dos jovens, por uma série de fatores. Mas pensemos, primeiro, no piloto: que questões passaram por sua cabeça quando escolheu o automobilismo como carreira, num país em que o acesso ao ensino superior de qualidade (sublinhe-se o 'de qualidade') é um direito efetivo? Se Sebastian quebrasse o pé em uma batida qualquer na Fórmula BMW, o que seria de sua vida? Teria de passar a vida num subemprego pelo resto da vida?

Apesar de um susto em Spa-Francorchamps em 2005, Vettel chegou ao topo e inteiro. Nestes dois anos em que passou conquistando troféus, muita gente da sua idade e de seu continente, certa feita o mais rico de todos, tem saído das mais prestigiosas universidades sem chance de emprego em suas áreas.

Na Itália, é normal ver jovens da elite intelectual como garçons em restaurantes. Muitos até abrem mão da faculdade e, mal terminam o liceu, começam a aprender algum ofício (marcenaria, mecânica) na prática, para que comecem a juntar dinheiro e experiência mais cedo.

É uma época difícil para ser jovem, a atual. Não à toa estes exercem certo protagonismo nos protestos contra o sistema que se espalham por Atenas, Nova York, Santiago do Chile - onde um outro "Sebastian", Piñera, tenta vender barato o ensino público de seu país (como fizeram os verde-oliva, aqui no Brasil) no melhor estilo Pinochet.

Hoje podemos ver a eleição de Ayrton Senna como símbolo nacional, mais de duas décadas atrás, como a personificação de um Brasil que vencia, apesar de mergulhado na inflação, na incompetência política, na pobreza e numa desigualdade social africana. É difícil dizer se Vettel conseguirá cumprir papel semelhante, como imagem, para sua geração. (Aliás, eu mesmo apostaria que não). Mas não deixa de ser curiosa a emergência deste alemão como um vencedor em meio a um mundo onde pessoas da sua idade e de sua terra ainda não conseguiram encontrar seu próprio lugar.

Wednesday, October 12, 2011

Como fazer um jovem recordista

O mais jovem campeão mundial. O mais jovem bicampeão mundial. O mais jovem tri? O maior número de vitórias? De campeonatos?

As projeções para a carreira de Vettel não excluem nenhuma quebra de recorde, mesmo dos mais inatingíveis: pois, além de talentoso, ele também é jovem, muito jovem. E é o centro da equipe mais bem estruturada do momento.

O céu é o limite para quem conquistou seu segundo título mundial aos 24 anos de idade. Mas como surgem esses prodígios? Certamente não é a água que eles bebem.

Vettel é talentoso, mas é também um fenômeno. Um fenômeno historicamente determinado e que dificilmente poderá ser repetido. Ou seja, destreza à parte, há outras forças em jogo necessárias para produzir um jovem recordista.

Voltemos a 2006. Naquele ano, para compensar a restrição a testes particulares, as equipes do fundo do grid tinham o direito de alinhar um terceiro carro nos treinos de sexta-feira de cada GP. A BMW-Sauber, devido à colocação de sua antecessora, também tinha esse direito, apesar de ter um carro capaz de disputar pódios, e mandava o também jovem e também talentoso Robert Kubica para a pista no terceiro carro. Quando Jacques Villeneuve rompeu com o time, o polonês já estava confortável no carro e na categoria a ponto de obter um pódio em sua terceira prova.

No lugar de Kubica, a BMW puxou das categorias de base Sebastian Vettel, muito jovem, mas já muito bem assessorado, e o submeteu ao mesmo intensivo das sextas-feiras, estreando no ano seguinte ainda mais confortável no carro e na categoria.

Abraçado pela estrutura da Red Bull, e com Helmut Marko a lhe dar conselhos, e com todo seu potencial, o caminho para o título mundial estava pavimentado.

Em 2008, a regra do terceiro carro foi suprimida, enquanto os testes continuaram limitadíssimos. Resultado: a geração mais recente de ingressantes na Fórmula 1 não tem mais meios fáceis de adaptação à categoria. Caso precisem mostrar resultado rapidamente, é mais fácil ainda que sucumbam à pressão e sejam demitidos após um par de meses. Enquanto isso, Vettel já está mais do que seguro dentro do circo e de um dos melhores cockpits. E os recorde não param de se aproximar.

Monday, October 10, 2011

Vettel, o legado de um piloto quando jovem

Afinal, Vettel mereceu o campeonato que acabou de ganhar? Essa é a pergunta que a maior parte dos textos que tenho lido nas últimas 24 horas tenta responder, quase sempre de forma positiva.

Isso indica, por outro lado, que há muita gente que acompanha o esporte e que não vê o piloto como merecedor de seus números. Cansei de ouvir, no último ano e nas mais diversas línguas, que Vettel ainda é imaturo, que só ganha porque tem um carro de ponta e que ainda não provou sua capacidade de vencer largando atrás da segunda fila, entre outras críticas.

Sou o primeiro a relativizar números. Sou o primeiro a me levantar contra quem acha que o automobilismo pode ser entendido com uma tabela de Excel. Mas, frente às nove vitórias e quatro segundos lugares em 15 provas, não tem como soar estranha qualquer discussão sobre o "merecimento" de um título.

Ao falar com a equipe pelo rádio, após cruzar a linha de chegada em Suzuka, Vettel deu uma resposta cabal aos críticos: "Nada nos foi dado de presente".

O torcedor, sentado em sua poltrona, costuma ter uma visão limitada do funcionamento de um esporte. É fácil apontar o dedo e dizer que ele tinha o melhor carro, de longe, que Adrian Newey lhe entregou uma jóia e que 'Seb' não fez mais do que a obrigação. Mas não vemos as intermináveis reuniões com engenheiros e mecânicos das quais o piloto participou, a cada fim de semana, para espremer o maior rendimento possível do equipamento. Não vemos a exaustiva rotina de condicionamento físico. Não vemos que, muitas vezes, a diferença entre excelência e obsolescência não é, assim, tão grande.

Para se ter uma ideia, das 12 pole positions de Vettel neste ano, cinco foram conquistadas com uma diferença menor do que 0,2s para o segundo colocado. Pisque seus olhos e você verá o motivo de tantas horas de trabalho de uma equipe inteira.

Mas a excelência, o carro melhor, uma equipe mais bem estruturada, tudo isso tem um preço, e este foi a falta de dimensão heroica da conquista. Por um lado, se o esforço existiu (e existiu de fato), ele não foi encenado dentro da pista, para as câmeras de TV. Por outro, o esforço não prova, por si só, que Vettel foi o melhor piloto da temporada. O olhar desconfiado que seus críticos lançam agora é o mesmo olhar desconfiado com o qual deveríamos olhar para qualquer campeão e até para nós e nossos próprios feitos.

Ele precisou ser inteligente para vencer o campeonato? Ele precisou ser valente ou destemido alguma vez neste ano? Precisou arriscar, jogar todas as fichas quando o bom senso recomenda o contrário? Não, talvez não - e talvez por isso este blog tenha falado mais de Jenson Button do que de Sebastian Vettel ultimamente. Mas, se este último estiver disposto a permanecer mais uma década ou uma década e meia na Fórmula 1, oportunidades não vão faltar para ele dar provas de seu talento.

A Fórmula 1 atual anda muito econômica em propiciar situações-limite ultimamente, exceto a situação-limite inerente a alguém entrar num foguete de meia tonelada de metal e tentar ser mais rápido do que outros 23 corajosos. Isso não é culpa de Vettel. Deixemo-lo erguer a taça em paz.

Sunday, October 9, 2011

Vitória de cabeça

Não, não passou despercebida a conquista do campeonato de Vettel e sua importância histórica e blá-blá-blá. Mas, antes de expor qualquer comentário sobre o assunto, talvez seja mais interessante falar sobre a corrida de ontem em Suzuka e sobre seu vencedor, Jenson Button.

Para quem tem reservado um olhar mais detido às últimas corridas do inglês, chega a ser estranho se dar conta de que esta é a sua primeira vitória com a McLaren em pista seca. Porque, se em seus primeiros dias na equipe ele parecia pouco mais do que um segundo piloto de luxo que sabia se aproveitar de pistas lisas, recentemente seu desempenho tem sobressaído seja qual for o clima, o tipo de traçado ou o fuso horário.

Sem chuva, mas com inteligência. As últimas voltas em Suzuka foram uma aula. Após a última rodada de pit stops, mesmo na liderança, Button não apresentava um rendimento tão bom quanto no início. Isso não foi um problema enquanto Vettel, terceiro, importunava Alonso, segundo. Até que uma boa alma da Red Bull deve ter lembrado seu piloto de que correr tais riscos a um ponto de distância de um campeonato mundial era, além de imaturo, uma estupidez. E, agora sem ter que olhar o retrovisor, Alonso percebeu que a vitória não estava assim tão distante.

Ao ver que o espanhol se aproximava, Button poderia ter tentado responder pisando mais no acelerador. Poderia, mas não o fez. Preferiu fazer o contrário: a poucas voltas do fim, e numa situação de rápido desgaste de pneus, diminuiu o ritmo e deixou que Alonso encostasse.

Alonso assentiu e manteve a perseguição, até chegar a 1s do líder. De pneus gastos e a dois giros da bandeira quadriculada, ele já não era mais uma ameaça para Button, que, de cabeça fria e calçados mais inteiros, levou o carro até o fim sem ser assediado.

Não tem sido muito comum ver, ultimamente, uma demonstração tão eloquente de nervos de aço, leitura da situação e noção de timing ao mesmo tempo. Um dos grandes momentos do ano - um ano que já tem o nome de Vettel escrito, mas o qual o piloto inglês tem contribuído mais do que nenhum outro para tornar memorável.

Tuesday, October 4, 2011

A escola japonesa

O GP do Japão se aproxima e, com ele, a iminente definição do campeonato, que irá saturar toda e qualquer discussão sobre o esporte a motor. Por isso, aproveito o momento para falar de algo diferente: do Japão.

Talvez pela distância do ocidente, pilotos japoneses têm uma característica própria, inexistente em nenhuma outra nacionalidade: eles pilotam como japoneses.

Não há outro país que determine tanto a forma de conduzir de seus atletas. Pense nos pilotos britânicos: há os mais agressivos, os que sabem melhor poupar pneus, os que viram mais ou menos o volante nas curvas. Cada um à sua maneira.

Isso vale até para países que colocaram menos pilotos na Fórmula 1. Na Argentina, por exemplo, é possível observar tanto condutores mais cerebrais, frios (Reutemann) quanto mais instintivos, alguns até demais (Mazzacane). Ninguém pilota "como um britânico" ou "como um argentino", pois cada britânico ou argentino tende a encontrar o estilo que mais lhe convém.

Em relação aos japoneses, porém, há uma claríssimo comportamento comum. Quando um deles entra num cockpit, é quase certo que este procurará o limite "de cima para baixo", freando mais tarde primeiro e mais cedo depois, brigando por posição de forma arriscada e não raro estabanada.

Exemplos não faltam, desde a estreia de Satoru Nakajima na Fórmula 1, em 1987, passando por Aguri Suzuki e Ukyo Katayama - visto na foto acima como passageiro de uma Minardi durante o GP da Itália de 1997.

A lista continua, passando por Shinji Nakano, Takuma Sato, Sakon Yamamoto, (seria apelar demais incluir Hiro Matsushita?), Yuji Ide - esqueci de alguém? -, até chegarmos ao atual representante da terra do sol nascente no grid, Kamui Kobayashi.

Nenhum julgamento, a priori: há pilotos japoneses bons e não tão bons - estes últimos, especialmente, geralmente bancados pelas fábricas de automóveis do país. Basta dizer que Sato ostenta no currículo uma vitória no prestigioso GP de Macau de F3.

E justamente ele, involuntariamente, forneceu uma explicação convincente para o fenômeno do estilo japonês. Após uma de suas colisões, não lembro o ano ou o lugar, alguém, durante a transmissão da Globo, falou sobre uma corrida de uma categoria local japonesa que havia assistido. Nela, um piloto tentava ultrapassar outro. A certa altura, este tentou a manobra, mas perdeu o ponto de freada e saiu da pista. A reação dos espectadores japoneses não foi de desaprovação: eles aplaudiram o tal piloto que tentou ultrapassar e colocou tudo a perder.

Eis a lição, portanto. No automobilismo japonês, a atitude importa mais que o resultado final. Eles jamais entram em um carro de corrida para passear, mesmo que isso signifique uma rodada ou uma batida.

Sunday, October 2, 2011

Dez anos de Hakkinen, dez anos depois

Alguns dias atrás completaram-se dez anos da última vitória de Mika Hakkinen na Fórmula 1, obtida no penúltimo GP de sua carreira, transcorrida durante onze temporadas. Certamente um dos melhores pilotos de sua geração, aquele emblemático GP dos Estados Unidos de 2001 é um bom ponto de partida para um olhar mais detido sobre o finlandês.

Não foi uma corrida comum, certamente. Era o primeiro grande evento esportivo que aconteceria em solo estadunidense após o 11 de setembro. Houve conversas sobre o cancelamento da prova.

Após uma batida no warm-up e a perda de sua melhor volta no sábado, Hakkinen largou em quarto. O piloto da McLaren brigou com as duas Ferrari pela ponta a partir da metade do percurso e até as últimas voltas, primeiro com Schumacher, mas, sobretudo, com Barrichello, que o perseguiu ferozmente até seu motor estourar, a um giro do fim.

Ao cruzar a bandeira quadriculada, Hakkinen havia provado, em 1h30, todas as melhores as qualidades que demonstrara anteriormente: indiferença aos revezes, frieza ao ser atacado, capacidade de reagir psicologicamente. Mal saiu do carro, foi erguido no colo por Ron Dennis e Norbert Haug; e depois, no pódio, por Schumacher (seu mais tenaz adversário) e por Coulthard (seu mais fiel companheiro de equipe).

Ele ainda correria o GP do Japão de 2001, mas sua despedida simbólica da Fórmula 1 já estava consumada.

"HAKKINENS"
Foi um "adeus" memorável, mas seria uma redução imperdoável dizer que aquela prova resume sua carreira. Em onze anos, o piloto assumiu quase tantos papéis diferentes quanto o teatro do automobilismo pode oferecer.

Deixemos de lado os dois primeiros anos corridos em uma Lotus à beira do abismo. No fim de 93, 'efetivado' pela McLaren, ele foi um prodígio, um futuro campeão, capaz de (oh!) superar Senna em uma sessão classificatória. No ano seguinte, já primeiro piloto da equipe, liderou-a com segurança ímpar, uma segurança desmedida, diga-se, pois não foram poucas as vezes que ele encontrou o muro. Causou tantos acidentes que a FIA o suspendeu por uma corrida. A McLaren, como que por piada, o substituiu por Philippe Alliot, um dos mais estabanados profissionais à época em atividade.

No fim de 95, o finlandês sofreu seu pior acidente, durante os treinos em Adelaide. Saiu da pista para o coma. Achava-se que seria seu fim. Não era: em 96, voltou ao cockpit já na primeira corrida. Nos dois anos seguintes, não era raro vê-lo andando atrás de Coulthard, com quem já dividia a equipe de Woking.

Mas, em 98, graças ao motor Mercedes, ao projeto de Newey e aos pneus com ranhuras, Hakkinen se viu na inédita posição de favorito ao título. Sua primeira vitória havia chegado, tardiamente, no ano anterior: 96 GPs após a estreia (recorde negativo para a época) e dada de presente por Jacques Villeneuve. Sua segunda também foi assim: era líder, mas um erro da equipe o jogara atrás de seu companheiro; após pedido de Dennis, o escocês concordou em trocar as posições.

O campeão de 1998 foi considerado, à altura, mais o fruto de um bom carro do que o dono de uma pilotagem brilhante. O ano seguinte, o do bicampeonato, o viu em posição pior: uma segunda metade de temporada marcada por instabilidade emocional, pontos perdidos por nada e até um abandono na liderança, em Monza, que terminou com lágrimas derramadas à beira da pista. A redenção chegou na última prova, com a frieza já recuperada.

Mas a consagração veio só um ano depois. E não bastou mais do que uma reta, uma curva, um retardatário e a ultrapassagem mais espetacular da década, sobre Schumacher, para encher o finlandês de respeito.

Em 2001, com um carro incapaz de vencer as Ferrari, Hakkinen se viu abatido por uma nuvem negra que o acompanhava aonde quer que fosse. O azar encontrou sua expressão máxima quando o fez abandonar, líder, a 500m da linha de chegada, em Barcelona.

Nada mais difícil que sintetizar a carreira de Hakkinen. É certo que ele jamais foi um piloto completo - era uma negação na chuva e não tinha um preparo físico tão bom quanto muitos de seus pares -, mas mais de uma vez se mostrou arrojado, mais de uma vez deu provas de inteligência e fez uso de uma resistência psicológica estonteante na maior parte dos anos em atividade. Especialmente quando derrotava Schumacher.