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Thursday, August 5, 2010

Weber e o Safety Car

Acalme-se, pequeno gafanhoto, não falta nenhuma letra no título do post. Pois em nenhum momento ele vai falar de um certo piloto australiano que anda líder de um campeonato mundial. O Weber daqui é o Max, sociólogo alemão (1864-1920), e o que ele tem a nos dizer sobre as corridas de automóvel.

Ainda é famosa, mesmo entre leigos, sua obra "A ética protestante e o espírito do capitalismo", que usa a religião para explicar um comportamento econômico. Mais especificamente, o comportamento econômico da sociedade norte-americana.

Como se sabe, a sociedade estadunidense foi uma das responsáveis pela expansão e manutenção do capitalismo, tornando-se, também, a maior potência econômica, e não apenas econômica, da atualidade. Eis, em linhas muito gerais, a explicação de Weber para o fenômeno.

A sociedade norte-americana foi fundada por protestantes - puritanos calvinistas, para ser mais exato. Foram eles que chegaram no primeiro navio e tiveram que construir um ambiente social próprio, do zero. Ora, um dos mais importantes traços do calvinismo é a teoria da predestinação:de acordo com Calvino, os homens já nascem escolhidos se vão para o reino do céu ou para o inferno.

Porém, Calvino explica que, caso o trabalho do homem frutifique e ele enriqueça, isso é um sinal de que ele é predestinado. Isso incutiu no colono americano a moral do trabalho. Não sou economista, mas desde Adam Smith (e apenas desde Adam Smith) nós sabemos que a riqueza é criada a partir do trabalho.

Há, portanto, uma "afinidade eletiva" entre a moral protestante e o capitalismo. Por isso ele se desenvolveu tão bem nos EUA, e por isso, como Tocqueville havia previsto, a terra do Tio Sam se tornou a potência que é hoje.

Agora vamos falar do que interessa, as corridas. Tanto a Europa quanto os EUA desenvolveram, a partir do fim do século XIX, um interesse especial por corridas de automóvel, embora com algumas diferenças. A diferença que interessa aqui é a das bandeiras amarelas.

Antes da Fórmula 1 acolher as bandeiras amarelas com Safety Car em suas provas (isoladamente em 1973, e com frequência a partir de 1992), os europeus costumavam zombar do fato delas surgirem em tanta profusão do outro lado do Atlântico. De fato, elas surgiram nos Estados Unidos, e acontecem com muito mais frequência por lá: qual foi a última prova em pista oval que você viu sem nenhuma bandeira amarela?

Portanto, há algo nelas que diz a respeito do automobilismo americano, e também, por que não, a sua sociedade.

Mas antes precisamos ressaltar o quanto o automobilismo, como qualquer outro esporte individual, tem a ver, também, com o "espírito do capitalismo". Numa corrida, todos os pilotos são inscritos como iguais. Sem distinção de classe ou origem. A ordem de largada é definida pelo "talento", não pelo título nobiliárquico, por exemplo.

Pode parecer óbvio, mas isso só acontece porque o automobilismmo foi inventado num mundo capitalista. Kant foi um dos primeiros a escrever para reis e burgueses que todos os homens nascem com as mesmas faculdades mentais - algo que a constituição americana de 1776 já admite. Antes disso, ninguém nascia igual: havia os nobres, os padres e os trabalhadores.

O automobilismo é a expressão de uma ideologia que surge com o capitalismo, a democracia.

Ou seja, a posição que um piloto ocupa dentro da pista é, a princípio, um reflexo do seu "talento" (entendido aqui como o trabalho de uma vida para lapidar determinadas qualidades) e dos que montaram o seu carro. Mas aí...

Aí vem uma bandeira amarela e coloca todos os pilotos, outra vez, colados um ao outro, e a diferença que o seu "talento" (= trabalho) fez durante toda a corrida vai pelo ralo. E o resultado final da prova não vai refletir nada disso, apenas a sua sorte.

Não seria uma incoerência? Pois o país que mais prezou, historicamente, a moral do trabalho, admite que, no automobilismo, ela seja, por assim dizer, interditada em momentos específicos.

Pensando bem, os EUA prezam a democracia mais que tudo, desde que dentro de suas fronteiras. Em nome da liberdade dos norte americanos, ditaduras em outros lugares já foram toleradas e até incentivadas. Se você esteve no Panamá em 1910, você sabe o que quero dizer.

Se você esteve em El Mozote, em 1981, você sabe o que quero dizer.

Se você esteve em Santiago em 1973, e no Chile desde ano a 1989, você sabe o que quero dizer.

Se você esteve no Brasil entre 1964 e 1985, você sabe o que quero dizer.

Se você esteve no Iraque em 1982, você sabe o que quero dizer.

E se você viu a Nascar ou a Indy alguma vez na sua vida, talvez você também saiba.

Sunday, July 11, 2010

GP da Grã-Bretanha 2010 - Novo traçado, jovem Vettel, velho Race Control

Grande sensação do fim de semana, o Silverstone Arena, traçado com uma nova seção que substitui o que antes havia entre a Abbey e a Brooklands, foi relegado a coadjuvante neste domingo. Ao menos dois outros eventos fizeram sombra ás ondulações do asfalto.

Em primeiro lugar, a punição a Fernando Alonso por ter ultrapassado Kubica supostamente cortando caminho. Ou estaria ele se esquivando do polonês, que jogou o carro em direção à sua Ferrari? Os comissários, Nigel Mansell entre eles, decidiram, décadas depois, pela primeira alternativa. Um Safety Car incidental transformou as 5 posições que os espanhol perderia em 15, e lá se foi a corrida da Ferrari. Vale lembrar que o drive through que Hamilton levou em Valência, também décadas depois da infração que ele cometeu, apontado justamente por Alonso, não fez o inglês perder qualquer posição na prova.

Após um início de ano relativamente tolerante, o Race Control vem aumentando a distribuição de punições desde o GP do Canadá. A se observar tal tendência daqui para a frente.

Além disso, a Red Bull se defronta agora com uma guerra declarada entre seus próprios pilotos. A preferência do time por Vettel não agradou nada a seu companheiro, que não só venceu após disputa mais ou menos intensa com Hamilton, como viu o 'número 1' da equipe amargar o sétimo lugar e uma prova de recuperação. Vettel tem um talento inegável, que por vezes se faz sentir sem margem alguma de dúvida sobre Webber, como no GP da Malásia deste ano. Mas - marca indelével de sua geração, como atestam Lewis e Sutil - o alemão parece sofrer do mal de ser sempre 'jovem demais', principalmente quando tem de lidar friamente com o favoritismo no campeonato.

Após anos recentes obliterados por espionagens e brigas internas, a McLaren parece ter aprendido a lição: que para ganhar o campeonato, a melhor estratégia é se manter longe do noticiário.

Sunday, June 27, 2010

GP da Europa 2010 - As ideias (e os carros) fora do lugar

Não tenho nada, a princípio, contra corridas chatas. Existem as chatas e as legais, assim como nos jogos de futebol, nos de hóckey, e até mesmo no esqui alpino existem as competições mais ou menos espetaculosas, divertidas.

O problema da corrida de Valência é que ela foi mais do que chata, foi indigesta. O estômago acusou o golpe de uma reviravolta estranha após o acidente de Webber (este sim, espetaculoso, até demais), da entrada do Safety Car que separou o pelotão entre aqueles que poderiam chegar aos boxes e aqueles que não poderiam - a vitória de Vettel, que se desenhava desde a primeira volta, se tornou quase certa após o infortúnio de seu companheiro de equipe.

A suposta manobra irregular de nove carros, investigada após a corrida, revela também a 'zona cinza' das regras quanto ao procedimento da entrada do Safety Car. Os pits estão abertos, mas é preciso que os carros diminuam o ritmo quando as letrinhas 'SC' espocarem das guaritas dos comissários. Mas afinal, o que é 'diminuir o ritmo'? Andar um segundo mais lento? Dez segundos? Um décimo de segundo?

Numa corrida tão aberta a questões subjetivas, apenas a Red Bull foi capaz de pisar no chão concreto dos fatos. Sebastian Vettel, por confirmar a incólume superioridade da equipe, e Mark Webber, por ter resvalado na concretude das leis da física.

Tuesday, April 6, 2010

O 'ballet' de Lewis e Vitaly

A FÓRMULA 1 TEM ALINHADO muitos novatos este ano, alguns melhres, outros nem tanto, mas de longe, o que tem apresentado a personalidade mais forte é Vitaly Petrov. Pudemos ver no GP da Malásia o quanto este russo que vive saindo da pista tem de empedernido em disputas de posição. Ainda mais quando o adversário é o também empedernido Lewis Hamilton.

De motor Mercedes e carro 'no chão', Lewis teve que suar para conseguir a posição. Mas o lance da corrida aconteceu logo depois de conquistá-la: na imensa reta de Sepang, para evitar 'xis' de Petrov, o inglês bloqueou suas investidas ao menos três vezes para cada lado, em um 'ballet' que seria aplaudido de pé no teatro mais aristocrático da São Petersburgo czarista.

NÃO SERIA DE SE ESPERAR, porém, o mesmo senso estético da Fórmula 1. É certo que foi uma manobra arriscada, mas o automobilismo parece ter esquecido que é, ou ao menos já foi um dia, um esporte de risco. Eliminar a infinitesimal chance de tudo acabar em tragédia, no esporte a motor, é como colorir Chaplin, dublar Woody Allen, traduzir Joyce, resumir Proust ou transformar a Suite Quebra-Nozes de Tchaikovski em toque de celular.

Voltemos à pista. Hamilton não foi punido, apenas 'advertido'; o que nos leva a um tema muito caro a este blog, o Race Control. Afinal, as punições, 'penalties' no grid, que costumavam ser distribuídas a rodo nos últimos tempos, não têm aparecido com tanta frequência em 2010.

Como muitos dos leitores devem saber, a FIA mudou um pouco o modus operandi do Race Control. Ou seus dirigentes leem este blog... ou o autor afinal não falou tantas bobagens assim nos últimos dois anos. O fato é que, alguém na Place de la Concorde notou que delegar a responsabilidade de punir os pilotos e equipes para um comissariado orwelliano de Big Brothers sem rosto (pelamor, sem piadinhas com o Bial nos comentários) não estava agregando credibilidade à Féderation.

Por isso, resolveram colocar no comitê algumas figuras públicas, inclusive ex-pilotos, que sabem o que é ético e o que não é dentro de uma pista de corrida. O do último GP, salvo engano, foi Johnny Herbert.

A QUESTÃO DO 'ZIGUE-ZAGUE' para defender posição é, por incrível que pareça, recente. Havia os que achavam válido e os que achavam temerário, mas nunca se discutiu quais seriam os limites aceitáveis de tal manobra. Isso teve que mudar no mundo pós-94. No fim dos anos 90, chegou-se a uma convenção: vale lançar mão do recurso uma vez para cada lado. Mais do que isso é contra a etiqueta.

Durante algum tempo, a discussão não fugiu muito da esfera da etiqueta, até Race Control intensificar sua atuação. Ver uma atuação mais 'low-fi' destes homens de terno é sempre uma boa notícia. A Fórmula 1 pode até ser considerada um esporte, de vez em quando, quando as coisas são resolvidas na pista.

Saturday, December 12, 2009

Por que a nova pontuação tende a diminuir abandonos – e por que isso é ruim


Gilles Villeneuve contornando a curva Tarzan, em Zandvoort, em seu traçado típico: fora da pista; durante o GP da Holanda de 1981.

No
post anterior, tentei traçar um percurso lógico que ligase a alteração na atual pontuação com o desencorajamento de disputas em pista e abandonos. Alguns devem ter achado estranho bater tão enfaticamente na tecla dos abandonos. Contudo, acredito que eles sejam um aspecto importantíssimo do esporte a motor e que seu desaparecimento paulatino é um movimento consciente dos dirigentes.

Mas em primeiro lugar, pretendo defender o novo sistema de pontuação do rótulo de ‘nascarizada’. Considerando que a Fórmula 1 terá 26 carros em 2010, o sistema pontuará algo em torno de 40% do grid, na mesma proporção que o sistema em vigor de 2003 a 2009 o fez. Durante os anos 70 e 80, apenas seis carros pontuavam entre até 40 inscritos.

A distorção, porém, não está no sistema atual, mas sim durante os anos 70 e 80. Pois a zona de pontuação com seis posições foi criada durante os anos 60, nos quais os grids da Fórmula 1 raramente ultrapassavam os 20 carros. Em alguns casos extremos, como em 1969, as largadas ocorriam com 15 participantes, ou até menos.

Quando o grid inchou, o sistema de pontuação não acompanhou o mesmo movimento.

Durante essa época, e desde o começo do mundial, o sistema de pontuação incluía um recurso que estimulava ainda mais a luta pelas primeiras posições: o descarte. Sua aplicação variou ao longo do tempo, mas o princípio permaneceu inalterado: havia um número máximo de pontuações que um piloto podia acumular durante a temporada. Se ela abrangesse 16 provas, por exemplo, e o número máximo de pontuações fosse 11, os cinco piores resultados do piloto seriam desconsiderados. Não importa se fossem abandonos, sextos lugares, segundos ou vitórias.

Portanto, um competidor que estivesse em segundo lugar em alguma corrida e se sentisse em condições de lutar pela liderança o faria sem hesitar: mesmo que a tentativa fosse frustrada, ele quebrasse ou batesse, isto não interferiria na tabela de pontuação – ao menos isoladamente.

Com isso, é óbvio, os pilotos assumiam mais riscos, eram mais inclinados a sair das zonas de conforto e buscarem pontos de freada mais distantes, trajetórias mais arriscada e pontos de ultrapassagem inexistentes.

Como consequência, os abandonos eram mais frequentes. Com os regulamentos técnicos e desportivos atuais, o risco de abandono passou a ser desencorajado: forçar um motor que deve durar quatro GPs é uma atitude irracional, bem como tentar ganhar alguns pontos a mais correndo o risco de perdê-los para mais adversários se algo sair errado.

Por que ligamos a televisão? Para assistir indivíduos corajosos buscando novos limites para a capacidade criativa e intuitiva humana? Ou um desfile de burocratas entrincheirados em suas zonas de conforto como estagiários em suas baias?

Com o atual regulamento, e o que se desenha para a temporada de 2010, um chefe de equipe pensaria duas vezes antes de contratar um Gilles Villeneuve, por exemplo. Um piloto que se arrisca em manobras perigosas, que não tem medo em retardar um ponto de freada ou de arriscar uma ultrapassagem não possui lá o ‘perfil’ desejado pela Fórmula 1.

Mas afinal, por que ligamos a televisão todo domingo de manhã e, cada vez mais frequentemente, em plena madrugada? Para assistir indivíduos corajosos buscando novos limites para a capacidade criativa e intuitiva humana? Ou um desfile de burocratas entrincheirados em suas zonas de conforto e ‘estratégias de pit stop’ como estagiários de grandes empresas escondidos em suas baias, cumprindo ordens de engenheiros?

Aparentemente, os dirigentes do esporte a motor acreditam na segunda opção. Afinal de contas, a diminuição dos abandonos (fenômeno observável desde 2003 na Fórmula 1) é um movimento consciente e planejado.

Ao diminuir e desencorajar atitudes de risco, a Fórmula 1 se torna menos capaz de articular nossa subjetividade.

Não se trata aqui de dizer que “o grande público gosta mesmo é de ver batida”. Acontece que o abandono é uma parte fundamental da gramática do automobilismo. Uma língua é tão complexa quanto necessária para basear as relações e trocas simbólicas de uma sociedade – quanto menos complexa uma língua, mais pobre simbolicamente é a cultura que a utiliza.

Ao diminuir e desencorajar atitudes de risco, a Fórmula 1 se torna menos capaz de articular nossa subjetividade. Como consequência, nos sentimos menos inclinados a ligar a tv para ver a largada.

Por outro lado, menos abandonos significam menos riscos às marcas que estampam os carros,e, claro, um menos risco de morte aos pilotos. Justamente após aos eventos de maio de 1994 (sim, sempre os eventos de maio de 1994) as pessoas e instituições que investem financeiramente na Fórmula 1 tomaram este caminho mais bem definido.

Desde o início do esporte até há poucos anos, uma espécie de auto-regulação sempre controlou os ânimos para que as corridas não virassem carnificinas. Acordos entre pilotos, intermináveis discussões no paddock sempre existiram para que um pacto fosse estabelecido. Por determinação de alguns senhores, no entanto, tudo isso foi descartado e os piloto foram colocados sob a tutela do capital.

Hoje a Fórmula 1 paga o preço da segurança do investimento de alguns senhores de terno e gravata. Os novos Sennas (ok, mau exemplo), Villeneuves, Pironis, Petersons, Schumachers e Moss continuam a nascer, mas são direcionados a outros esportes ou práticas que os permitam vivenciar situações de risco. Os efeitos sutis e indiretos do novo sistema de pontuação fazem a Fórmula 1 dar mais um passo para a inocuidade a irrelevância.

Wednesday, September 30, 2009

A volta (sorrateira) do Race Control


A ultrapassagem mais fantástica vista durante o GP de Cingapura não valeu. Na primeira volta, Mark Webber se aproximou de Fernando Alonso, que deu a ele o lado de fora da curva. O espanhol chegou a iniciar o apex na frente, mas Webber jogou a traseira, quase bateu na proteção e saiu mais acelerado.

O movimento do volante do australiano mostra a precisão da manobra. O lance decisivo se dá logo a partir do ponto B da curva, quando o volante começa a voltar para a linha reta.

Mas não valeu. O piloto foi orientado a devolver a posição ao espanhol (e a Glock, que também passara a Renault), o que ele fez na quinta volta. Neste preciso momento, talvez tenha sido inventado o impedimento na Fórmula 1.

As disputas de dão hoje no cronômetro, não no embate direto. Como diria Adorno, as ultrapassagens se realizam negativamente, e as exceções só confirmam a regra. Webber é o mais recente exemplo.

Os legalistas contra-argumentam: a Red Bull estava fora do traçado delimitado ao realizar a manobra, ainda que do lado de fora, mas mesmo contrariando o regulamento. Há um problema, porém, já que o regulamento jamais se aplicou a
manobras similares na La Source (Exemplo mais antigo aqui).

Infelizmente, a punição em Cingapura confirma a tendência de aumento de intervenções do Race Control na parte final da temporada – talvez, para que penas desproporcionais segurem o ímpeto dos disputantes. Punições questionáveis pontuaram as últimas provas de
2007 e 2008.

Triste contradição que a Fórmula 1 enfrenta. Por um lado, se esmera em estudar formas de reintroduzir a ultrapassagem no automobilismo. Por outro, não aceita manobras em pista.

Desde a devolução das posições de Webber talvez seja válido questionar as intenções dos dirigentes do esporte. Será que as
ineficientes restrições aerodinâmicas não foram pensadas para ser ineficientes? Será que a proibição de reabastecimento para 2010 não passa de mais um matiz do esmalte de seriedade que a categoria introduz para encobrir o business que ainda teimamos em chamar de esporte?

***
Atualização: o trecho do texto que alegava não ter havido letreiro na transmissão alertando sobre a punição foi suprimido.

Sunday, July 26, 2009

GP da Hungria 2009 – Do que escapa ao controle


No momento em que o presente texto é redigido, a Renault está suspensa da próxima corrida, o GP da Europa, devido a uma roda mal apertada durante o pit stop de Alonso. Curioso pensar que tal erro provocou uma punição esportiva por si próprio: a perda de rendimento e consequente abandono de seu piloto mais bem classificado na corrida. Isso leva a crer que a punição aplicada pelos comissários não é esportiva – talvez eles nem saibam o que vem a ser um esporte.

Mais curioso ainda é a não punição da Brawn GP, equipe também responsável pelo desprendimento de um objeto em pista que, embora de dimensão menor que um pneu, causou estragos muito mais significativos.

A volta deste assunto tão batido, o Race Control, é significativa em uma corrida na qual vários aspectos (não apenas objetos) escaparam ao controle. Disso decorre que a travada e pouco amada Hungaroring foi o palco de muitas surpresas, muito mais do que, por exemplo, a beloved Silverstone há um mês.

Surpresa Hamilton no primeiro lugar, bem como dois bólidos equipados com Kers ocupando as duas primeiras posições – pela primeira vez, pode-se dizer que foram eficientes. Surpresa ver Webber superar Vettel na pontuação.

Nada disso, porém, eclipsou em momento algum a maior surpresa de todas, o acidente de Felipe Massa nos treinos de sábado. Explicável, mas incompreensível – talvez porque ninguém sabe ainda qual a dimensão histórica que aquela peça que bateu contra seu capacete assumirá daqui para a frente. Torcemos para que não supere suas ínfimas dimensões físicas, 10cm x 5cm.

Friday, April 3, 2009

Ginástica Automobilística


Cnossos era rica e próspera há 4 mil anos. Encravada na costa da ilha de Creta, a cidade se aglutinava em torno de um palácio de arquitetura tão complexa que, atualmente, os especialistas consideram tal construção a inspiração para o mito do Labirinto.

Embora o mito diga que o Labirinto era a moradia de um monstro metade homem e metade touro comedor de atenienses, há evidências de que a vida real do lugar era muito mais pacífica. Numa época em que assírios e egípcios pintavam batalhas sangrentas em seus afrescos, os cretenses pintavam mulheres de busto nu colhendo açafrão e eventos comemorativos.

As grandes festas de Cnossos eram realizadas em uma praça localizada no centro do palácio. Uma das atrações dos eventos está representada no afresco acima: jovens pulam longitudinalmente sobre um touro. Por mais que a alegria esteja expressa do rosto das figuras, era uma atividade arriscada, que poderia levar a um tombo e à morte. Talvez por isso essa prática tenha mobilizado o interesse da população. É improvável que fossem eleitos vencedores, mas certamente uns impressionavam muito mais pelo arrojo do que outros.

Depois de alguns milênios, nossa sociedade resolveu reincorporar estas demonstrações cretenses de habilidade e coragem. Nos Jogos Olímpicos Modernos, porém, não se salta mais sobre um touro, mas sobre um “cavalo”, que nada mais é que uma estrutura metálica com a função de servir de apoio para saltos de ginastas olímpicos. Não há grandes riscos de morte num salto moderno. A platéia não verá sangue; talvez algumas contusões, certamente saltos fantásticos, e o grande público não faz idéia de quem é o melhor saltador: o vencedor será dado por uma bancada de juízes, que levarão em conta a complexidade da manobra e falhas de execução. Ninguém no ginásio discutirá o resultado final.

Não vejo um esporte mais distante do automobilismo quanto a ginástica olímpica. No automobilismo, o resultado de uma prova é óbvio e incontestável, mas o mérito discutível. Dois torcedores sentados na Arquibancada A de Interlagos podem passar a tarde discutindo qual piloto contornou melhor o Laranjinha.

No salto sobre o touro em Cnossos, também imagino a opinião pública discutindo qual dos jovens foi o melhor. Afinal de contas, o touro está sempre em movimento, existem várias formas de executar o pulo - da mesma forma que há muitas formas de se contornar uma curva, e nenhuma delas, a priori, é a melhor.

Os jogos de Cnossos são realmente parecidos com o automobilismo...

Mas não é isso o que os dirigentes da Fórmula 1 querem. Ao mesmo tempo em que eles tentam fazer com que saltar sobre o touro mais agressivo da cidade não provoque mortes, eles também querem ter o direito de julgar quem é o melhor saltador.

Trocou de motor? Perca dez posições. Envolveu-se em uma batida? Nós te consideramos culpado, você largará do fim do grid na próxima corrida.

Daqui a cinquenta anos, imagino o automobilismo sendo disputado: um competidor por vez dá uma volta no circuito. O vencedor não é o mais rápido. O Race Control julga as performances: “o piloto cometeu uma leve saída de traseira na curva dois, subiu na zebra da curva sete, freou depois do ponto obrigatório ao fim da reta e gastou mais os pneus do que o permitido. Sua nota será 7.25”.

Wednesday, April 1, 2009

A bandeira amarela como fonte de prazer


Na Fórmula 1, as bandeiras amarelas em toda a pista são eventos indesejados e inconstantes, embora cada vez mais comuns. Por isso, talvez seja melhor pensar na Nascar, ou em qualquer categoria norte-americana, de preferência que corra em ovais.

Nos ovais, a bandeira amarela é institucionalizada. Antes ela não existia. Se um carro batesse no muro, era recolhido sem que a corrida sofresse interrupção. Há fortes indícios para crer que a introdução das bandeiras amarelas nos EUA tenha coincidido com o início das transmissões televisivas ostensivas dos campeonatos automobilísticos.

Não é difícil entender o porquê. Uma paralisação a poucas voltas do final nivela os desempenhos e garante um final mais disputado, um clímax hollywoodiano ao qual o público está mais acostumado, o que mantém a audiência estável. Além disso, a distribuição delas ao longo da prova possibilita a inserção de comerciais sem perda do conteúdo.

Algumas pesquisas divulgadas nos EUA mostram lados interessantes desta relação. O New York Times publicou no mês passado uma reportagem sobre uma pesquisa conduzida pela NYU e Universidade da Califórnia, que indica que o público televisivo não apenas tolera, mas gosta que a programação seja interrompida.

Segundo o artigo, dois grupos de universitários foram colocados para assistir um mesmo episódio de uma série cômica. Um dos grupos o assistiu da maneira como foi veiculado, com comerciais; ou outro, sem interrupções. Por uma margem estatisticamente válida, os que o assistiram com comerciais gostaram mais do episódio.

A abrangência do fenômeno não se limita nem ao lado positivo do intervalo nem à restrição da tv, segundo a matéria do Times. Inserir interrupções em uma atividade prazerosa a potencializa, da mesma forma que suportar condições irritantes, como por exemplo o som de um aspirados de pó, é mais difícil quando elas sofrem pausas.

Há também conclusões empíricas. O professor Mauro Wilton, da Escola de Comunicação e Artes da USP relata uma experiência da Calvin Klein, que comprou todas as cotas de espaços publicitários de uma sessão de filmes semanal no horário nobre da televisão. Ela deixava o filme transcorrer, colocando inserções apenas antes e depois do programa. A audiência caiu.

“A razão para isso, argumentamos, é que tendemos a nos adaptar a uma variedade de experiências conforme elas acontecem (...). Ouvir uma música, assistir a um programa de tv, fazer uma massagem: tudo isso começa muito agradável, e em poucos minutos nos acostumamos. As interrupções quebram isso”, afirmou ao NYT o professor de marketing Leif Nelson, da Universidade da Califórnia em San Diego.

No Brasil, a Fórmula 1 foi transmitida com interrupções até 1988. A Globo, de 81 até esta data, costumava colocar algo entre cinco inserções de 30s cada, ou menos, durante a corrida. Não havia Safety Car nesta época. Causa grande ruído para os olhos atuais. Quando foi banido, nunca mais voltou.

A própria matéria admite que “nem todas as atividades agradáveis melhoram com interrupções”, especialmente as narrativas mais complexas. Podemos pensar que as provas de esporte a motor são, sim, narrativas muito complexas. As variáveis são muitas, a história não é linear, os carros (em teoria) podem abandonar a qualquer momento, os cortes da tv e as informações numéricas incompletas que ela divulga fraturam ainda mais a compreensão. É um esporte não-linear por excelência.

O automobilismo norte-americano resolveu isso da forma mais fácil. Mas será que ainda podemos chamá-lo de esporte?

(Matéria do NYT retirada de caderno especial publicado na Folha de S. Paulo)

Sunday, March 29, 2009

GP da Austrália 2009 - Acidentes esperando para acontecer



"We are accidents waiting/
Waiting to happen"
There There, Radiohead



Foi um pódio de desacreditados. Trulli, porque ninguém acreditava que um bom resultado seria possível saindo da última fila. Barrichello desfrutava de uma dupla desforra: por pensarem que a carreira dele havia terminado e por pensarem que a corrida dele terminaria na primeira curva após a largada. Button era o símbolo do triunfo da Brawn GP, aquela equipe pobre, surgida do espólio de uma equipe horrível.



(Mais tarde foi decidido que a desforra de Trulli caberia a Hamilton, vá lá, esse é outro que está desacreditado na temporada. O italiano teria feito uma ultrapassagem em bandeira amarela- ok Race Control, vou fingir que não estou questionando dessa vez.)



Impossível não sentir apreço por essa equipe que não pode mais ser chamada de ex-Honda, assim como foi impossível não reparar em como Button cumprimentou Barrichello após a prova. Ou como os dois conversavam paralelamente durante a entrevista coletiva. Nota-se que são cúmplices no resultado, que correm como equipe.



No mais, além de uma desforra, o que foi o GP da Austrália?



Foi a prova de que o pacote aerodinâmico funciona. Os carros ultrapassam com mais facilidade, algo tão estranho à Fórmula 1 que por mais de um momento parecia uma corrida de kart.



Se as ultrapassagens voltaram a ser viáveis, a categoria também perdeu um pouco daquele ar racionalista, de jogo de xadrez, e se partiu para o corpo-a-corpo. Que o diga Kubica, com pneus duros, versus Vettel, com pneus de classificação que resolveram chamar de "moles".



E após todos os cálculos, todas as estratégias de pit stop, os dois se encontraram na pista. E a Fórmula 1 voltou a ser o que era. Pois somos todos acidentes, esperando para acontecer.



Race Control

Durante a transmissão da prova, pela primeira vez apareceu uma bancada composta por senhores de terno. O Race Control finalmente ganhou um rosto. Estes senhores de terno decidiram punir Vettel pela colisão entre ele e Kubica com a perda de dez posições no grid mais multa.



Para o Race Control, as batidas são indesejáveis (por destruírem o logotipo dos patrocinadores?) e alheias à natureza do automobilismo. Como postei em um texto recente, Contardo Calligaris diz que após dois séculos higienistas só é dado ao homem civilizado ver a morte de perto em esportes na tv. Mas se a higiene extrema já chegou a Fórmula 1, por que continuaríamos assistindo suas corridas? Para engoradar os bolsos de outros homens de terno?

Saturday, March 28, 2009

Duplo twist carpado, com leve desequilíbrio


Já foi dito que a Fórmula 1 está mais emocionante, que o jogo de forças entre as equipes mudou. Como já disse em um post anterior, não presto tanta atenção nas mudanças repentinas que ocorrem na categoria. As mudanças silenciosas e graduais é que são as mais importantes.


Hoje fui dormir com um grid formado e acordei com outro. Três punições. Não sei se alguém se lembra como as classificações costumavam ser mais simples.


A Fórmula 1, ou melhor, o Race Control pune cada vez mais. Não é um fenômeno novo (basta clicar na tag Race Control, neste blog, para ver como ele já dura algum tempo), mas é um fenômeno crescente.


O resultado é que a Fórmula 1 parece mais um jogo de tabuleiro. Jarno Trulli e Timo Glock jogam os dados e caem em suas respectivas casas, que os obriga a tirar uma carta do monte. "A aerodinâmica do seu carro está fora do regulamento, largue do fim do grid". Hamilton tira a sua carta: "Você trocou seu câmbio, recue três posições".


Desde 2003 a categoria se parece menos com um esporte a motor e mais com uma competição de ginástica olímpica, dependente de um júri para deliberar sobre a validade de pequenos detalhes que escapam aos olhos do espectador.


E isso traz a inevitável pergunta: será que tornar as regras cada vez mais ininteligíveis para o espectador é uma atitude deliberada? Alienar quem está assistindo é uma maneira de deixá-lo menos crítico? De fazê-lo assimilar tudo o que acontece como 'lógico'?


Acompanhe logo mais as 'fantásticas ultrapassagens' que as Toyotas farão em uma 'emocionante corrida de recuperação'.

Saturday, March 21, 2009

O erro de Bernie e Max – ou regras básicas para fazer carros andarem em círculos

Durou algo em torno de 72 horas a mais nova regra desportiva da Fórmula 1, e mesmo assim ela foi suficiente para encher laudas e laudas de posts blogosfera afora. Visto que o piloto com mais vitórias não será, obrigatoriamente, o campeão da temporada de 2009, hoje o dia é de alívio.

A Folha de S. Paulo se arriscou a comentar os motivos do imbróglio (infelizmente, a parte mais interessante do texto foi suprimida por um erro de diagramação). Fábio Seixas, no mesmo jornal, arrisca especular sobre as manobras dos bastidores que culminaram na polêmica. Este, porém, não me parece ser o centro da questão.

Por mais que seja um momento otimista, é importante observar que a Fórmula 1 não é menos business e mais esporte por causa da anulação da regra das vitórias. Nem porque ‘surgiu’ uma nova ‘força’ na Fórmula 1 para combater os desmandos de Ecclestone e seu títere Max Mosley. Ninguém vai deixar de ganhar um euro só porque o regulamento desportivo se mantém inalterado de 2008 para 2009.

O que aconteceu não foi a violação de um simples artigo do Código Esportivo, mas uma quebra do pacto estabelecido entre a Fórmula 1 e o espectador. É um pacto que não está escrito em lugar nenhum, mas está colocado claramente toda vez que você senta na poltrona e liga a tv para ver carros andando em círculos. Acima de tudo, é fácil perceber quando ele é violado: vide o GP da Áustria de 2002.

O erro de Bernie e Max foi quebrar este pacto para exercer um melhor controle sobre o campeonato – caso a regra das vitórias valesse para o ano passado, a desclassificação de Hamilton no GP da Bélgica teria certamente determinado o título a favor de Massa. Se o intento da FIA fosse apenas privilegiar as vitórias, por que não pleitear a reimplantação do sistema de descartes, que vigorou por quarenta anos e quase nunca foi questionado?

Pretendo me alongar mais na questão do pacto com o espectador em breve, mas não acho grave o fato de ele ter sido quebrado: quando isso acontece, quase sempre volta-se atrás. O problema é que ele é plástico, não estático, pequenos adendos são feitos a ele com o passar do tempo. As mudanças lentas que ocorrem na Fórmula 1 são as mais perigosas.

Basta perceber como os avisos de ‘Race Control’ durante as transmissões têm aumentado um pouquinho mais, e têm sido um pouquinho mais determinantes ao longo das últimas temporadas. Nada indica que essa tendência diminuirá.

Thursday, November 6, 2008

Espera-se que Balestre morra em 2009


Num ano de tantas notícias, alguns podem ter esquecido que Jean-Marie Balestre já não habita o mundo dos vivos desde março. No entanto, jamais ele foi tão presente: basta ver o número de corridas em que o Race Control agiu, o número de vezes em que estas ações foram questionáveis e, dentre estas, quantas tiveram influência inegável no resultado final.

Aquilo que Balestre fez no GP do Japão de 1989, causando enorme polêmica no mundo da Fórmula 1, não foi nada menos que institucionalizado – e aceito – com o advento do Race Control em anos recentes.

Aceito? Ao que parece, a própria FIA parece ter notado que o Race Control passou dos limites este ano. A Folha de S. Paulo divulgou hoje que haverá mudança nos procedimento punitivos: quando estes ocorrerem, a partir do ano que vem, os vídeos analisados pelos comissários ficarão disponíveis no site oficial da categoria.

A entidade espera, com isso, ser mais transparente em suas decisões.

Ser um comissário também exigirá mais experiência, já que será requisito prévio este ter acompanhado outros cinco GPs como observador.

Não é o fim do Race Control. Não é nem ao menos um mecanismo que seguramente impedirá que ânimos particulares ou interesses privados determinem as ações da FIA durante uma corrida. Mas já é um avanço, a saber: os dirigentes da Fórmula 1 sabem que, se o público desconfiar da manutenção da justiça no esporte, a categoria vem abaixo como um castelo de cartas.

Ao menos o fantasma de Balestre deve deixar de ser uma figurinha tão presente no paddock. Não é uma morte definitiva – esta só virá com o fim do monopólio que a FIA exerce sobre as imagens das corridas -, mas pode ser considerada a primeira pá de terra sobre o corpo do velho Jean.

Sunday, October 12, 2008

GP do Japão 2008 – Bourdais e o Grande Irmão


Que Hamilton e Massa foram estúpidos, não há dúvida. O primeiro, por querer decidir a corrida nos primeiros metros – sequer nas primeiras voltas. O segundo, por acreditar que sairia impune de uma batida mais do que evitável.

Por mais que as punições não tenham sido proporcionais aos danos, ambos os protagonistas do campeonato se tornaram meros coadjuvantes em cena. Brigando pelas migalhas do fim do pelotão, deixaram o caminho livre para o “The Alonso and Kubica Show”, mais divertido e emocionante, na medida do possível, que a batalha pelo campeonato – e provido, talvez, de melhores pilotos.

Mas a vitória de Alonso, as batidas, a largada controvertida, tudo é explicável na corrida, menos a punição a Bourdais por um toque entre ele e Massa no fim da reta. Em primeiro lugar, porque era uma disputa de posição, porque não houve conseqüência para o andamento da prova, porque não houve mudança brusca de trajetória, nem saídas propositais de pista. Mudança de trajetória e corte proposital do traçado, aliás, que foram óbvios no choque entre Massa e Hamilton. A Fórmula 1 entra, enfim, na era do Grande Irmão.

Sunday, September 14, 2008

GP da Itália 2008 – Algo aconteceu


Um jornalista britânico cujo nome me escapa, há poucos anos escreveu que o grande problema da ‘Era Schumacher’, a qual estava em curso, não era o fato de só um piloto ganhar todas as provas. O problema era que não havia mais aquelas corridas em que o espectador pensava ‘eu vou assistir a essa corrida porque tenho certeza que algo vai acontecer’.

Algumas eventuais corridas com previsão de chuva fizeram estas corridas, ainda que raras, acontecessem com mais freqüência (no ano passado, o bom desempenho de Hamilton e a briga interna na McLaren ajudaram um pouco também). Mas nada se compara com a corrida de hoje.

Note: o primeiro colocado no grid venceu, o segundo no grid chegou em segundo; Massa, o único brasileiro de destaque, também chegou na mesma posição em que largou. Mas antes da largada, todos sabíamos que, ainda que nada acontecesse na corrida, algo teria acontecido.

Se nada ocorresse, seria a vitória mais inesperada desde o triunfo de Fisichella no Brasil em 2003, 99 Grandes Prêmios atrás. E assim foi.

O fantasma
As disputas de Spa-Francochamps da semana passada, em pista igualmente (eufemismo) úmida, não deixaram de fazer sombra ao GP da Itália, ao menos nas primeiras voltas. Parecia o início de uma prova conservadora, sem disputas por posição, até que Raikkonen passou Fisichella. A partir de então, Hamilton foi o grande nome da prova, atravessando qualquer um que ousasse bloquear o seu caminho.

Entretanto, pairava o fantasma do Race Control. É conveniente e – acredito – até proposital que não se saiba exatamente qual é a fronteira, nos critérios da FIA, entre uma ultrapassagem arrojada ou desonesta, e muitos fizeram muitas ultrapassagens arrojadas ao longo das 53 voltas.

Massa, inclusive, predispôs-se a devolver a posição a Rosberg por uma manobra que a Ferrari – e ninguém mais, FIA inclusive – teria considerado ilícita. Lewis cansou de negociar curvas de forma ‘discutível’, mas talvez mesmo o Race Control tenha considerado que exagerou em sua manipulação na Bélgica, e arrefeceu seus critérios de ‘segurança’ e ‘ética’. Bom para o esporte.

Interrogação e reticências
Assim como um filme é bom quando ele deixa o espectador pensando após terminar, um GP é bom quando nem todas as pontas estão amarradas na bandeira quadriculada. Se a corrida de hoje fosse um texto, ela teria acabado com um ponto de interrogação ou reticências, a despeito do ponto final que o Race Control tenta impor quando possível.

Afinal, por que Kovalainen não alcançou Vettel? O que, de fato, valeu a Kubica a terceira posição? Por que Webber perdeu o entusiasmo no ataque a Hamilton, nas últimas voltas? Seria devido ao pneu, mesmo motivo que fez Hamilton arrefecer e perder contato com Massa?

Chutem as respostas, citem suas fontes, mas cuidado. A única certeza que esta corrida deixou é de que algo aconteceu (reticências).

Sunday, September 7, 2008

GP da Bélgica 2008 - Tapetão

Nos posts sobre as útimas corridas de 2007, falo bastante e detalhadamente sobre a 'cultura do Race Control' instalada na Fórmula 1.

Aí está a prova de que ela ainda existe. Geralmente, as corridas são decididas na estratégia e nos boxes. O Race Control não gosta dos poucos GPs que são, de fato, decididos na pista. Quando eles acontecem, como hoje, o Race Control tende a invalidá-los.

A cultura do Race Control não está presente apenas nas eventuais decisões dos comissários. Também está presente na forma como os circuitos 'Tilke' são desenhados, na forma como o regulamento técnico é elaborado, e até na supresão do warm-up. O Race Control abomina o esporte, ele visa o controle e a segurança dos lucros que o business da Fórmula 1 promove.

No mais, este blog se recusa a se pronunciar sobre a punição de Hamilton e conseqüente vitória de Felipe Massa.