Wednesday, December 30, 2009

Indie Rocks – Scuderia Filipinetti, GP da Alemanha, 1962


O nome Filipinetti é frequentemente associado às competições de carros esporte, mas também participou de Grandes Prêmios, principalmente durante o ano de 1962, no qual foi fundada.

Sua criação, em Genebra, se deu por
Georges Filipinetti, um rico revendedor da Ferrari em seu país. A imprensa local, sobretudo o jornalista Henri-François Berchet, o convenceu de montar uma estrutura para que um jovem promissor suíço pudesse ser lançado na Fórmula 1: Jo Siffert. Ele faria suas primeiras corridas com um Lotus 21-Climax e um Lotus 24-BRM, de propriedade de Filipinetti.

Mas a equipe alinharia outros carros e outros pilotos também, todos helvéticos. Um dos menos famosos foi Heini Walter, fotografado acima durante o GP da Alemanha de 1962. De fato, foi o único GP da sua vida, no qual largou e chegou em décimo quarto a bordo de uma Porsche 718. A equipe chegou a inscrevê-lo para o GP do Mediterrâneo, alguns dias depois, em Enna (não-válido para o mundial), mas uma suspensão quebrada impediu sua participação.

Embora amador, Walter conquistou relativo sucesso em sua carreira nos carros de turismo. Foi inclusive campeão europeu de subida de montanha em 1961. Faleceu aos 82 anos, em maio deste ano.

A Scuderia Filipinetti privilegiou desde o começo as competições de turismo, deixando os monopostos de lado após um curto período. Com as rodas cobertas obteve muito mais êxito e fama. Encerrou suas operações após a morte de seu fundador, em 1973.

Nota: este é o último post do ano. Aos seguidores do calendário gregoriano feliz 2010; aos demais, que sejam felizes nas próximas 55 luas. No ano que vem, desde primeiro dia, este blog continua a ser atualizado.

Monday, December 28, 2009

1994, o ano que não acabou


No início de 2009, me propus a publicar aqui no blog textos que marcassem os 15 anos dos eventos de 1994. Mais do que isso, que jogassem luz sobre um ano dos mais importantes da história recente do automobilismo.

O resultado está aí embaixo: onze escritos que tentaram dar conta do tema.

Escrever sobre aquela época não é fácil: lutei muito para desviar de clichês, para tentar não soar repetitivo, encontrar novas abordagens, entregar ao leitor mais do que um assunto repisado.

Na foto acima, procurei ressaltar a complexidade do tema. Ukyo Katayama, com a Tyrrell, durante o GP de San Marino de 1994. Um dos 12 pilotos que chegaram ao final da trágica corrida, e um dos 26 que sobreviveram a ela (o piloto recentemente teve de ser resgatado de uma escalada mal sucedida do Monte Fuji).

1994 não acabou porque não é possível, ainda, esgotar as reflexões possíveis sobre ele. E no entanto, ele passou. Aqui estamos diante de novos problemas, em um mundo de novas possibilidades. Espero ter jogado luz sobre o passado não por mero fetiche, mas para melhor iluminar o futuro.

Será que consegui? Não faço ideia. Caso você queira conferir por si próprio, sinta-se à vontade para clicar nos links. Cada um recebeu uma sinopse para melhor orientá-lo. E não hesite em comentar!

Jeitinho italiano: Foi meu primeiro texto publicado no ano; tentei abordar um assunto por um viés peculiar. Na verdade, um fato bizarro, ocorrido no GP de Portugal de 1994, sem grande relevância histórica por si só e, portanto, esquecido. É bastante incomum introduzir algum tema deste modo, mas Michel Foucault utiliza este recurso em seu livro Vigiar e Punir. Mestre do estilo, Foucault foi minha inspiração.

1994: Neste texto apresento o tema, indicando que tratarei dele ao longo do ano. Ele é ilustrado pela fotografia, creio, mais representativa daquele ano, que estrutura toda a argumentação.

Os dez anos do GP de San Marino de 1994: Em 2004, quando a Fórmula 1 lembrava os dez anos da morte de Ayrton Senna, diversas linhas de reflexão e discussão sobre o assunto foram abertas. Este texto foi uma tentativa de reeditá-las cinco anos depois.

GP de San Marino de 1994 – Treinos oficiais de sábado (
Parte 1 e Parte 2): Escrevi após rever cuidadosamente a transmissão dos treinos daquele GP. Foi um ponto nevrálgico da história da Fórmula 1, pois se deu um dia após o acidente de Rubens Barrichello e foi marcado pela ocorrência da morte e Roland Ratzenberger – a primeira morte na categoria em oito anos. Tentei registrar aquele dia como a antessala da nova Fórmula 1, onde o presente começou a se delinear.

Imola como metáfora: Pequena reflexão sobre Imola como palco simbólico da transição da Fórmula 1 pré e pós-1994. A pista não está mais no calendário; o que talvez enfraqueceu a efeméride dos 15 anos da morte de Senna.

GP da Espanha 1994 – Tragicomédia: Uma visita a um pequeno detalhe do GP da Espanha daquele ano, que evidenciava o quanto a Fórmula 1 encontrava-se em estado crítico após os eventos do GP de San Marino.

Pequeno inventário de pilotos vitimados em 1994: Registro dos oito pilotos que sofreram acidentes graves naquele ano, contextualizando assim as mortes de Ratzenberger e Senna: a emergência do debate sobre segurança.

Massa, outra vez Senna: Análise de como o acidente de Felipe Massa em julho deste ano, em Hungaroring, fez o público amplo brasileiro voltar a se interessar (ainda que por tempo limitado) pela Fórmula 1, como não se via desde os tempos de Ayrton Senna – e que atingiu o ponto alto com sua morte.

O legado do fogo: Sobre o acidente sofrido por Jos Verstappen durante o GP da Alemanha de 1994, quando sua Benetton se encobriu em chamas e expôs muito da fragilidade vivida pelo automobilismo.

Ayrton Senna é pop: Em agosto deste ano, um álbum de música pop espanhola é lançado com o nome “Ayrton Senna”. Que imagem, permanece do piloto no imaginário social?

Adeus, mangueira: Sobre a volta do reabastecimento na Fórmula 1 em 1994, após dez anos de proibição, e como ele afetou a dinâmica das corridas de Fórmula 1. O procedimento volta a ser proibido em 2010.

Sunday, December 27, 2009

Indie Rocks – Scuderia Centro Sud, GP da Alemanha, 1957 e 58

Atendendo gentilmente aos meus clamores, Bruno Santos, que atualmente escreve para o Blogsport, me enviou algumas imagens de carros da Scuderia Centro Sud. Publico aqui duas delas. Ambas são de Maseratis 250F, carro ao qual a equipe foi bastante ligada no início da existência.

Acima, o carro do norte-americano Mastern Gregory, um dos pilotos mais importantes da Scuderia: correu por ela em 1957, 1958, 1960 e 1965. O piloto teve uma carreira errática nos Grands Prix, e obteve seus maiores êxitos na juventude. Aqui seu carro está em primeiro plano em uma fileira de Maseratis, todas as outras oficiais, nos boxes de Nürburgring em 1957.

Abaixo, Hans Hermann em ação durante o também GP da Alemanha, em 1958.



Friday, December 25, 2009

Graham Hill e Jo Siffert, GP da França, 1968


Na volta 14 da prova em Rouen, Graham Hill encosta sua Lotus com problemas na transmissão. Chovia. O inglês cede então o visor de seu capacete para Jo Siffert (Rob Walker/Lotus), que não o possuía.
Estamos tão acostumados a ver a competição ferrenha nas pistas (o próprio automobilismo costuma se vender como uma competição) que momentos de cooperação entre adversários, como o retratado acima, ganham força poética aterradora. Suspeito que do lado de cá, no mundo real, aconteça o mesmo.
Afinal, todos nós também somos adestrados à competição, a "entrar na corrida", a "ser um vencedor". O automobilismo nos lembra que no final das contas não somos apenas competidores: somos também como estes pilotos andando em círculos que alguma hora encontrarão, solitários, uma bandeira quadriculada.
Essa é a forma que encontrei de desejar boas festas aos leitores deste blog. (Não digo "feliz natal"; quase todas as culturas celebram alguma festa importante nessa época do ano, e meus votos se direcionam a todas elas). O blog continuará a ser atualizado sem interrupções.

Wednesday, December 23, 2009

Schumacher e Ferrari: o divórcio do século


A foto acima mostra o GP de San Marino de 2000, já distante no passado. Ainda mais a partir de agora, que Schumacher assinou seu contrato com a Mercedes e seu divórcio com a Ferrari.

Em suma (do pouco que talvez sobre para dizer do assunto), o retorno de Michael Schumacher não é apenas impressionante por si só. Claro, ele vai trazer mais holofotes à categoria e mais torcedores nas arquibancadas. Mas será diferente, para não dizer estranho, olhar o alemão fora do contexto da Ferrari.

Quando entrou para o time italiano, já era bicampeão, mas não era o dono de todos os recordes. Foi de vermelho que construiu sua imagem mais nítida, e foi Maranello, em última instância, que fez os carros que fizeram de Schumacher o que ele atualmente representa.

Grosso modo, a torcida por Schumacher há mais de uma década foi associada a uma torcida muito mais antiga, e será interessante acompanhar ao longo da próxima temporada os pontos dessa ruptura. Infelizmente, o GP de San Marino, que seria nevrálgico neste aspecto, já não faz mais parte do calendário.

E se Schumacher sacramentou seu divórcio com a Ferrari, ao final permaneceu fiel à sua mais longa parceira: com Ross Brawn. O engenheiro esteve ao lado do piloto durante toda sua carreira e todas as suas vitórias, exceto as três que obteve em 1996.

O sonho hippie acabou em um autódromo

Na semana passada, uma matéria de Thiago Ney na Folha de S. Paulo chamava a atenção para o lançamento no Brasil do documentário "Gimme Shelter" em dvd. Trata-se do registro da turnê dos Rolling Stones pelos EUA em 1969, que culminou no trágico festival de Altamont.

Foi no dia 6 de dezembro daquele ano. A princípio marcado para o Golden Gate Park, um jogo de futebol americano o deslocou para o
Sears Point Raceway. Mas uma desavença contratual com os donos do autódromo na época levaram o evento ao Altamont Raceway, de propriedade de um empresário local, Dick Carter - a troca aconteceu apenas dois dias antes do show.

O restante do festival resultou em uma sucessão de infortúnios. O palco, que em Sears Point se localizaria em cima da colina, ficou então no mesmo plano do público. O Hells Angels foram chamados para complementar a segurança, para que ninguém subisse no palco ou destruísse os equipamentos - e pagos com cerveja. Altamont era chamado, então, de "Woodstock do Oeste", com o objetivo de reeditar o grande marco da contracultura, que ocorrera menos de três meses antes.

Assim, 300 mil pessoas se deslocaram para o show de nomes como Jefferson Airplane, Santana, Crosby, Stills & Nash, Grateful Dead e que se encerraria com os Stones - sem cobrança de ingressos.

Woodstock não foi exatamente aquilo que o mito propagou depois, mas nada passou mais longe do lema "paz e amor" do que Altamont. A falta de estrutura, a superlotação e o uso ostensivo de drogas fez com que logo surgissem brigas. Membros do Hells Angels também agiam com violência, distirbuindo socos até ao vocalista do Jefferson Airplane em pleno palco. O Grateful Dead se recusou a se apresentar. O dano a algumas motos do grupo desencadeou uma pancadaria generalizada. Quando os Stones entraram, à noite, ainda havia mais para acontecer: o jovem Meredith Hunter, sob o efeito de drogas, apontou uma arma para o palco, sendo detido a facadas que o mataram no local.

Altamont selou amargamente a esperança de que sexo, drogas e rock 'n roll eram uma alternativa viável para substituir o desgastado e belicoso "american dream".

Isso nos leva à curiosa coincidência do desastroso festival de Altamont ser realizado num autódromo. Autódromos são os lugares dos carros e das corridas, duas palavras que reverberam profundamente no "american dream".

Em primeiro lugar, porque o processo de ocupação do Oeste estadunidense recebeu a oportuna alcunha de "Corrida para o Oeste". Um notável professor de arquitetura, Vincent Scully Jr, propõe uma explicação mais completa: "É evidente que o europeu na América nunca se sentiu fixado no continente. Ele tinha deixado o jardim fechado da paisagem europeia e o seu novo ambiente natural era maior, mais hostil e, acima de tudo, menos confiável do que tudo que conhecera até então. O americano foi, portanto, o primeiro europeu a experimentar o fluxo contínuo dos tempos modernos".

Segundo Scully, isso criou um país fascinado pela metáfora da "estrada aberta". E de tanto ir a Oeste, acabaram chegando na Califórnia.

Em termos de automobilismo, a Califórnia talvez seja um desvio da regra norte-americana, pois, historicamente, os circuitos mistos sempre tiveram mais espaço. Lá fica Laguna Seca e ficava Riverside, por exemplo, e mesmo o Ontario Motor Speedway foi criado com uma seção 'infield'. Uma das provas mais marcantes da Fórmula 5000 dos EUA, não à toa, foi em Long Beach, traçado de rua. Apenas nos anos 90 foi erguido o superoval de Fontana.

Altamont Raceway é um pequeno oval de 1/2 milha (0,8 km) criado em 1966 - o único oval asfaltado existente na sua região, denominada Bay Area. Aliás, nem ele existe mais: foi fechado em outubro do ano passado pela sexta vez em 43 anos, mas agora definitivamente.

Os pilotos locais gostavam de correr lá, pelo asfalto liso e ângulo das curvas, que proporcionavam velocidades elevadas. Fora isso nada nunca pareceu conspirar a favor da localidade. Ele foi fincado no meio de um corredor de vento homônimo que congela os termômetros toda noite. Foi comprado e vendido diversas vezes e ninguém jamais conseguiu fazer a pista se sustentar financeiramente. Trânsito, falta de energia, incêndios, água sulfurosa, tudo contribuiu para prejuízos constantes.

O norte californiano, onde se encontra, é uma das regiões em que a Nascar, em suas versões nacional e regionais, tem mais dificuladade para se estabelecer.

Após o trágico festival, Altamont deixou de receber corridas por três anos. Talvez, neste lugarzinho desconhecido, tenham morrido dois tipos de liberdade que o automobilismo um dia também encarnou: a liberdade da "estrada aberta", que encontrou seu fim geográfico; e a liberdade total do corpo e da expressão pregada pelos hippies, que culminou na negação do "paz e amor".

Monday, December 21, 2009

Cartazes – GP da Tchecoslováquia, 1949


O desenho do cartaz fala por si só. Em tcheco, mas fala. Em duas cores, o traço destaca a frente de um carro, deixando-o porém quase irreconhecível. A roda dianteira esquerda é desenhada por completo, numa atitude que lembra Rembrandt ou Cézanne. O piloto, lá atrás, confunde-se com a mancha do céu. A cidade ao fundo delimita o horizonte.

Parece uma foto em grande angular, clicada debaixo do carro.

A corrida em si merece algumas linhas. Foi disputada nas perigosas estradas ao redor de Brno, na Tchecoslováquia, em 20 voltas de 17,80 km, em setembro – a última prova importante daquele ano.

No grid, muitos pilotos locais e mesmo as maiores estrelas alinharam em carros particulares. Apenas a Gordini, das equipes oficiais, deu as caras.

O risco se manifestou desde o início: o piloto Václav Uher faleceu após acidente nos treinos, e Karel Vlasín não pôde correr porque bateu em um caminhão (?) antes da largada.

Ainda assim, 23 carros partiram. No grid, as Maserati dominaram as quatro primeiras posições, e duas delas marcaram a melhor volta da corrida (Bira e Graffenried, em 8m03s0). Mas aos poucos elas abandonaram até a liderança recair sobre Peter Whitehead, numa Ferrari, que venceu em 2h48min41s0. Mais da metade dos que largaram não correram até o fim, muitos deles devido a acidentes.

Saturday, December 19, 2009

Indie Rocks – Ecurie Bleue, Argentina 1960


Numa época em que ainda não existiam canudinhos dentro dos capacetes dos pilotos, a hidratação destes durante a prova era um problema. Ainda mais no caso do GP da Argentina de 1960, disputado em pleno fevereiro portenho, muito quente. Daí o desespero inusitado de Harry Schell por um balde de água na cara.

Schell fez uma prova mediana, e abandonou faltando menos de 20 voltas para o final, por culpa de um problema na bomba de combustível. Ele pilota um Cooper T51 Climax, da Ecurie Bleue. Mas o sorriso que a foto talvez tenha provocado em alguns leitores se dissipará quando estes souberem que esta foi a última prova válida pelo campeonato que o piloto disputou: Schell morreria em maio do mesmo ano, após um acidente nos treinos para o International Trophy, em Silverstone.

A história da Ecurie Bleue é inseparável do nome Schell e do próprio automobilismo francês. Foi dirigida pelo pai de Harry, nos anos 30: Laury Schell, que também era seu proprietário, um expatriado norte-americano que vivia na França. Uma parceria com a fabricante Delahaye rendeu uma fabulosa vitória contra as todo-poderosas Mercedes no
GP de Pau de 1938, com René Dreyfus ao volante. Apesar do êxito, o sucesso não durou muito tempo.

Laury era casado com Lucy O’Reilly Schell, filha de norte-americano rico de ascendência irlandesa, e nascida em Paris. Ela própria era piloto, mais voltada para o rali, e comandava sua própria equipe, a Ecurie Lucy O’Reilly Schell.

Já está confuso com os países de origem dessa família? Então prepare-se. Harry Schell era filho de ambos. Seu verdadeiro nome é Henry e nasceu em Paris, mas foi naturalizado norte americano – portanto, o primeiro estadunidense a correr na Fórmula 1.

Quando Laury morreu em um acidente, pouco antes da Guerra, Lucy tomou o controle das duas equipes, as quais correram até 1940 e retomaram as operações somente em 1948.

A partir de então, a Ecurie Bleue colocou em seus carros, além de Lucy e Harry, também outros pilotos como, por exemplo, Raymond Sommer. Estes correram na Europa e EUA, inclusive nas 500 Milhas de Indianapolis. Dentre provas de Grand Prix, a Bleue e a O’Reilly Schell totalizaram 112 inscrições e 19 pódios.

A maioria das entradas, porém, ocorreu em GPs fora do campeonato. Harry Schell, que correu durante uma década inteira na Fórmula 1, correu com a Bleue apenas três vezes: uma corrida em 1950, uma em 1959 e o já referido GP da Argentina de 1960. No mais, teve passagens por equipes independentes (Enrico Platé) e oficiais (Gordini, Vanwall, Maserati BRM). Seus maiores êxitos foram obtidos em provas fora do campeonato, ou de Fórmula 2, ou de endurance. Aquela seria sua última prova pela equipe da família, já que a British Racing Partnership o contratara para a temporada europeia. Foi com um Cooper desta que bateu na curva Abbey, aos 38 anos.

Thursday, December 17, 2009

Retrospectiva 2009 – Button, meio campeão


No post anterior, procurei entender o frisson e a especulação da volta de Michael Schumacher como relacionado, ao menos em parte, à falta de credibilidade de Jenson Button como campeão. Talvez seja uma boa hora de refletir sobre a carreira do piloto que ostentará o número 1 em seu carro no ano que vem.

Button conquistou o título marcando 95 pontos ao longo de 17 provas no campeonato. Assegurou matematicamente o êxito com uma corrida de antecedência. O vice, Sebastian Vettel, obteve 84 pontos e Rubens Barrichello, companheiro do campeão, terminou com 77. Trata-se, portanto, de margens bastante significativas em relação aos adversários diretos. A questão começa a se delinear quando decompomos tais números.

Button fechou a temporada com seis vitórias, todas elas alcançadas nas primeiras sete corridas do ano. Desde o começo de junho não esteve mais no alto do pódio.

Nas dez corridas que se seguiram, acumulou meros 34 pontos. Tanto Vettel quanto Barrichello fizeram mais. Outros indicativos impressionam: Button liderou 280 voltas nas primeiras sete corridas, e nenhuma sequer nas provas seguintes.

Uma conjunção de fatores ajudou a tornar a tabela do campeonato mais confusa após o GP da Grã-Bretanha: diferentes temperaturas de pista, evolução da McLaren em circuitos ‘Mickey Mouse’, ascensão da Red Bull, que sofreu problemas com os motores. A própria Brawn atendeu a alguns pedidos de Rubens Barrichello, especialmente acerca de seus freios. Num panorama mais flutuante, quando sua equipe deixou de ser incontestavelmente melhor que todo o resto, Button não foi capaz de sobressair.

Por isso é lícito dizer que Button sagrou-se campeão de meia temporada, passando assim a impressão de que se tornou um meio campeão mundial.

Não é uma situação inédita em sua carreira. Por exemplo, em 2006, após obter o primeiro triunfo de sua carreira no atribulado GP da Hungria, o inglês viveu uma boa fase de proporções até então inéditas para si. A partir de Hungaroring, acumulou 35 pontos nas seis últimas corridas do campeonato. Nem Alonso (34), nem Schumacher (32), nem ninguém o bateu no mesmo período.

Um final de temporada memorável do qual ninguém se lembra: porque as 12 corridas anteriores haviam sido péssimas em resultados e Button encerrou aquele ano em sexto lugar.

Em 2005, Jenson não pontuou em nenhuma das nove primeiras provas (ajudado por duas suspensões à BAR e à retirada maciça do GP dos EUA) e marcou pontos nas dez provas seguintes, até a última, consecutivamente.

Até o momento, talvez o desempenho mais constante de Button na Fórmula 1 tenha sido em 2004, quando a BAR lhe deu um carro confiável que o permitiu obter o terceiro lugar no campeonato, atrás apenas das Ferrari. Fez um total de dez pódios, jamais em primeiro lugar.

Nunca, portanto, Button provou ser rápido e constante simultaneamente. Nem com um título mundial nas costas. Um campeão relativo que relativiza um campeonato.

Wednesday, December 16, 2009

Napoleão Schumacher


Um espectro ronda a Fórmula 1 - um espectro que atende pelo nome de Michael Schumacher. Enquanto o piloto e integrantes da Mercedes tecem declarações evasivas em doses homeopáticas, a imprensa se esmera em publicar todo tipo de boato e preencher espaço ocioso em seus veículos sem muito esforço, numa estação em que notícias sobre automobilismo se tornam rarefeitas.

Com este jogo, todos os envolvidos ganham. A imprensa, por ser alimentada; piloto e equipe, por terem seus nomes ventilados e seus valores de marca aumentados. Mas a própria especulação já carrega consigo um simbolismo muito forte, o sintoma de que algo não está bem no mundinho da categoria máxima do automobilismo.

O retorno da Schumacher vem sendo alimentado desde o acidente de Felipe Massa, em julho, quando não se realizou devido a dores insistentes durante testes em Fiorano. Reciclada, volta a ganhar força.

O interessante é que, enquanto um heptacampeão aposentado talvez volte às pistas, o atual campeão possui sete vitórias na carreira e dez temporadas na Fórmula 1, dentre as quais em apenas três ou quatro conseguiu se destacar do limbo do meio do pelotão.

Em outras palavras, é compreensível que a expectativa pelo retorno de Schumacher venha após a consagração de um piloto tão desacreditado como Jenson Button. Alonso e Raikkonen se sobressaíram mesmo quando corriam ao lado do alemão, Hamilton foi recebido como um gênio desde a primeira curva que fez em 2007, e Button...

Button não parece ter lastro para sustentar seu título. E na falta de alguém para desempenhar tal papel, torcedores do mundo inteiro unem-se para acompanhar o retorno de um grandioso campeão do passado.

A situação remonta a um capítulo de 200 anos atrás na história europeia. Quando Napoleão é derrotado na Rússia, e depois pela confederação do Reno, é determinado seu exílio em Elba. Após um ano, foge de lá com um pequeno exército e desembarca na França. Ao que uma companhia se aproxima para expelir os invasores, Napoleão se coloca à frente e desfere ordens para que se submetam a ele. A companhia responde, de joelhos: “Sim, Imperador”.

Assim começa o que foi chamado o Governo dos Cem dias, de março a junho de 1815. Da mesma forma, Michael Schumacher ameaça retornar de seu exílio em Elba. É certo que as duas histórias não se encaixam perfeitamente: a derrota do alemão parece ter sido menos na Rússia do que na Espanha, e antes da aposentadoria a Europa estava pronta a
aclamá-lo ao invés de expeli-lo. Talvez por isso mesmo nós, torcedores, acompanhamos a fuga aflitos, sem saber se a comitiva que saiu de Elba chegará em segurança a alguma praia francesa (ou, no caso, alemã).

Tampouco sabemos quando e como se dará a próxima Waterloo.

Monday, December 14, 2009

John Cooper, sobre o GP dos Estados Unidos de 1959


“Jamais consegui descobrir o que realmente causou a pane seca no carro de Jack Brabham. Eu tinha o hábito de colocar sempre uns dez litros a mais do que indicavam nossos cálculos de consumo para as corridas. Lembro, porém, que em Sebring o Jack não quis largar com esse peso extra. O importante é que conseguimos garantir o título. Brabham e Moss eram grandes pilotos e engenheiros, mas de todos com quem trabalhei, Jack foi o melhor. Stirling talvez fosse o mais rápido, mas nunca foi campeão do mundo. Talvez porque nunca tomou a decisão certa no momento certo. Eu o comparo a Mansell, enquanto Jack me lembra o Prost. Bruce era um grande segundo piloto”.

Declaração publicada pela revista francesa L’Automobile em seu guia para a temporada de 1999. A tradução postada aqui foi retirada da edição especial da revista Carro sobre a Fórmula 1, de março de 1999.

Saturday, December 12, 2009

Por que a nova pontuação tende a diminuir abandonos – e por que isso é ruim


Gilles Villeneuve contornando a curva Tarzan, em Zandvoort, em seu traçado típico: fora da pista; durante o GP da Holanda de 1981.

No
post anterior, tentei traçar um percurso lógico que ligase a alteração na atual pontuação com o desencorajamento de disputas em pista e abandonos. Alguns devem ter achado estranho bater tão enfaticamente na tecla dos abandonos. Contudo, acredito que eles sejam um aspecto importantíssimo do esporte a motor e que seu desaparecimento paulatino é um movimento consciente dos dirigentes.

Mas em primeiro lugar, pretendo defender o novo sistema de pontuação do rótulo de ‘nascarizada’. Considerando que a Fórmula 1 terá 26 carros em 2010, o sistema pontuará algo em torno de 40% do grid, na mesma proporção que o sistema em vigor de 2003 a 2009 o fez. Durante os anos 70 e 80, apenas seis carros pontuavam entre até 40 inscritos.

A distorção, porém, não está no sistema atual, mas sim durante os anos 70 e 80. Pois a zona de pontuação com seis posições foi criada durante os anos 60, nos quais os grids da Fórmula 1 raramente ultrapassavam os 20 carros. Em alguns casos extremos, como em 1969, as largadas ocorriam com 15 participantes, ou até menos.

Quando o grid inchou, o sistema de pontuação não acompanhou o mesmo movimento.

Durante essa época, e desde o começo do mundial, o sistema de pontuação incluía um recurso que estimulava ainda mais a luta pelas primeiras posições: o descarte. Sua aplicação variou ao longo do tempo, mas o princípio permaneceu inalterado: havia um número máximo de pontuações que um piloto podia acumular durante a temporada. Se ela abrangesse 16 provas, por exemplo, e o número máximo de pontuações fosse 11, os cinco piores resultados do piloto seriam desconsiderados. Não importa se fossem abandonos, sextos lugares, segundos ou vitórias.

Portanto, um competidor que estivesse em segundo lugar em alguma corrida e se sentisse em condições de lutar pela liderança o faria sem hesitar: mesmo que a tentativa fosse frustrada, ele quebrasse ou batesse, isto não interferiria na tabela de pontuação – ao menos isoladamente.

Com isso, é óbvio, os pilotos assumiam mais riscos, eram mais inclinados a sair das zonas de conforto e buscarem pontos de freada mais distantes, trajetórias mais arriscada e pontos de ultrapassagem inexistentes.

Como consequência, os abandonos eram mais frequentes. Com os regulamentos técnicos e desportivos atuais, o risco de abandono passou a ser desencorajado: forçar um motor que deve durar quatro GPs é uma atitude irracional, bem como tentar ganhar alguns pontos a mais correndo o risco de perdê-los para mais adversários se algo sair errado.

Por que ligamos a televisão? Para assistir indivíduos corajosos buscando novos limites para a capacidade criativa e intuitiva humana? Ou um desfile de burocratas entrincheirados em suas zonas de conforto como estagiários em suas baias?

Com o atual regulamento, e o que se desenha para a temporada de 2010, um chefe de equipe pensaria duas vezes antes de contratar um Gilles Villeneuve, por exemplo. Um piloto que se arrisca em manobras perigosas, que não tem medo em retardar um ponto de freada ou de arriscar uma ultrapassagem não possui lá o ‘perfil’ desejado pela Fórmula 1.

Mas afinal, por que ligamos a televisão todo domingo de manhã e, cada vez mais frequentemente, em plena madrugada? Para assistir indivíduos corajosos buscando novos limites para a capacidade criativa e intuitiva humana? Ou um desfile de burocratas entrincheirados em suas zonas de conforto e ‘estratégias de pit stop’ como estagiários de grandes empresas escondidos em suas baias, cumprindo ordens de engenheiros?

Aparentemente, os dirigentes do esporte a motor acreditam na segunda opção. Afinal de contas, a diminuição dos abandonos (fenômeno observável desde 2003 na Fórmula 1) é um movimento consciente e planejado.

Ao diminuir e desencorajar atitudes de risco, a Fórmula 1 se torna menos capaz de articular nossa subjetividade.

Não se trata aqui de dizer que “o grande público gosta mesmo é de ver batida”. Acontece que o abandono é uma parte fundamental da gramática do automobilismo. Uma língua é tão complexa quanto necessária para basear as relações e trocas simbólicas de uma sociedade – quanto menos complexa uma língua, mais pobre simbolicamente é a cultura que a utiliza.

Ao diminuir e desencorajar atitudes de risco, a Fórmula 1 se torna menos capaz de articular nossa subjetividade. Como consequência, nos sentimos menos inclinados a ligar a tv para ver a largada.

Por outro lado, menos abandonos significam menos riscos às marcas que estampam os carros,e, claro, um menos risco de morte aos pilotos. Justamente após aos eventos de maio de 1994 (sim, sempre os eventos de maio de 1994) as pessoas e instituições que investem financeiramente na Fórmula 1 tomaram este caminho mais bem definido.

Desde o início do esporte até há poucos anos, uma espécie de auto-regulação sempre controlou os ânimos para que as corridas não virassem carnificinas. Acordos entre pilotos, intermináveis discussões no paddock sempre existiram para que um pacto fosse estabelecido. Por determinação de alguns senhores, no entanto, tudo isso foi descartado e os piloto foram colocados sob a tutela do capital.

Hoje a Fórmula 1 paga o preço da segurança do investimento de alguns senhores de terno e gravata. Os novos Sennas (ok, mau exemplo), Villeneuves, Pironis, Petersons, Schumachers e Moss continuam a nascer, mas são direcionados a outros esportes ou práticas que os permitam vivenciar situações de risco. Os efeitos sutis e indiretos do novo sistema de pontuação fazem a Fórmula 1 dar mais um passo para a inocuidade a irrelevância.

Por que a nova pontuação tende a diminuir disputas e abandonos


O ‘caso Onyx’ é o principal argumento em favor da mudança na pontuação. Na foto, Stefan Johansson.

A nova pontuação recentemente aprovada e que entra na Fórmula 1 no ano que vem, esconde algumas sutilezas para as quais é bom ficar atento. Primeiro, porém, aos fatos. A pontuação atual alcança os oito primeiros colocados da seguinte maneira: 10-8-6-5-4-3-2-1. A que entrará em vigor premia os dez primeiros em: 25-20-15-10-8-6-5-3-2-1.

O formato aplicado até recentemente foi estabelecido em 2003, em um contexto muito próprio, de uma diferença de desempenho abismal entre a Ferrari (ao menos a de Michael Schumacher) e o resto do grid. Ele substituiu um formato mais tradicional, que mudara homeopaticamente ao longo dos anos, e foi considerada brusca – talvez demais. Encurtou consideravelmente a diferença do primeiro colocado para o segundo e o terceiro, diminuindo assim o valor da vitória na tabela. Como efeito colateral – e desejado -, incluía uma maior porcentagem do grid na zona de pontuação.

O novo sistema, recentemente apresentado, tem o mesmo objetivo: com a entrada de mais equipes, foi considerado procedente o inchaço da zona de pontuação.

Esta é uma demanda antiga das equipes, sobretudo as pequenas, e tem pouco ou nada a ver com a chamada ‘nascarização’. Por exemplo, em 1989 (quando 16 equipes pontuaram!), a pequena novata Onyx conseguiu a proeza de obter seis pontos em 16 provas. Um feito, considerando que apenas os seis primeiros pontuavam e vinte equipes – 40 carros! – estavam presentes no autódromo. Mas patrocinadores possuem uma histórica dificuldade em distinguir um bom resultado apenas pela pontuação. Pouco surpreende, portanto, que a Onyx não tenha durado mais de dois anos na categoria.

Apesar de ter inchado, a mudança na pontuação, porém, manterá a proporção dos pontos quase inalterada: o segundo colocado continua ganhando 80% dos pontos do primeiro e o terceiro 60%. O quarto colocado, que recebia 50%, agora passa a receber 40%.

A maior pontuação em números absolutos, no entanto, passa a impressão ao grande público (e a muitos jornalistas) que a vitória passa a ser mais vantajosa que o era, e que os pilotos correrão mais riscos para conquistá-la. Isso não é verdade.

De fato, o inchaço da zona de pontuação e a manutenção das proporções de distribuição irão inibir as posturas mais agressivas dos pilotos.

Quando um piloto disputa com outro uma posição, principalmente se ambos apresentam desempenhos equivalentes, ele sempre se coloca numa posição de risco – o risco de abandono. Se mais pilotos pontuam em uma corrida, um abandono nas primeiras colocações significa uma entrega de mais pontos aos adversários. Em outras palavras, o risco passa a valer menos a pena.

Fora dos méritos da pontuação o panorama é mais desolador: numa situação de disputa em pista, os pilotos se colocam numa relação perde/perde: ambos (ou todos, se mais de dois) rendem menos em relação aos adversários que correm ‘sozinhos’ na pista, forçando mais o carro. Ora, o regulamento para 2010 será ainda mais restritivo com a mecânica. Por exemplo, os motores terão de durar em média 4 GPs, em vez dos três deste ano.

Como a quebra sendo mais duramente punida, menos disputas em pista serão encorajadas. A consequência das mudanças nos regulamentos técnicos e desportivos será: menos disputas e menos abandonos.

Os efeitos da proibição do reabastecimento, portanto, tendem a ser neutralizados. A Fórmula 1 tenta aumentar o número de ultrapassagens ao menos tempo em que tenta inibir os abandonos, o que é em si uma contradição. Mas esta cruzada contra o abandono tem desdobramentos mais sutis e mais pérfidos. Continuo o raciocínio no próximo post.

Thursday, December 10, 2009

A Silverstone do futuro


Em junho passado, durante o GP da Grã-Bretanha, o mundinho da Fórmula 1 se despedia de Silverstone. Antes do fim do ano, nos é dado a conhecer que não apenas a prova britânica não irá mudar de sede, mas também que ela permanecerá em Silverstone ao menos pelos próximos 17 anos.

Ao longo do ano, porém, os diretores do circuito apresentaram um
novo traçado para a pista. A princípio pensada para a MotoGP, que volta a disputar corridas por ali, é provável que a Fórmula 1 também o utilize, contanto que a FIA emita a autorização.

Para que as motos possam correr com segurança, algumas modificações terão de ser realizadas em curvas já existentes, como a (maravilhosa) Maggots e a (nem tanto) Club. Mas estas alterações são pequenas se comparadas ao grande ‘infield’ que será enxertado. Ao chegarem na Club, os pilotos encontrarão a antiga curva à esquerda espelhada para a direita, entrando numa reta que os leva a um grampo, que por sua vez dá em uma outra reta, ligando ao ‘antigo’ circuito na curva Brooklands, mais aberta que a atual.

Uma ausência, talvez, se faça sentir: a Bridge. Ela não tem a fama de uma Parabolica ou de um Stadium, mas não há piloto que não a conheça pelo nome.

Quando
a F1 Racing pediu a Jenson Button, em 2004, que descrevesse uma volta em Silverstone, ele declarou: “Fazemos a Bridge e pé embaixo. É muito difícil por causa das ondulações e de como você a negocia – você quer fazê-la rápido, mas também ficar o máximo à direita possível. É uma curva maravilhosa que realmente te testa”.

Atualmente ela se encontra após a chicane Abbey e antes da Priory, entremeada por duas retas curtas. Talvez não seja tão famosa por ser parte das reformas “malditas” que, para alguns,
descaracterizaram o circuito original em 1991 para torná-lo mais seguro. Nessa época, a Abbey não era uma chicane e a Priory se encontrava muito mais distante.

Como resultado, ela foi a curva mais rápida da Fórmula 1 entre os anos de 1991 e 93, mais rápida mesmo que a Eau Rouge!

Tão veloz como perigosa, porém. Não tardaram a notar que a reforma deixou o circuito menos seguro do que costumava ser. Com os acontecimentos de 1994, e uma batida que quase matou Pedro Lamy durante testes privados, Silverstone foi outra vez modificada. As últimas reformas relevantes ocorreram em 1997.

Caso saia do papel a nova Silverstone para 2010, a pista ganhará duas retas e algumas centenas de metros a mais do que já tem. De resto, a nova seção parece o que os ingleses costumam chamar de point-and-squirt – que não acrescenta nada ao repertório dos pilotos.

Haverá, com certeza, a nova Brooklands, interessante de se observar. Pena que, embora se torne uma curva de altíssima velocidade, será completamente neutralizada pela lentíssima Luffield logo em seguida. A sensação que passa a reforma de Silverstone é de que ela muda para permanecer igual: mais igual frente aos circuitos atuais.

Monday, December 7, 2009

Indie Rocks - Rob Walker, GP da Espanha, 1970


Graham Hill disputava então sua segunda prova pela Rob Walker, e segunda após um dos acidentes mais graves da sua vida. Mas há algo de estranho na pintura desse carro. O tradicional azul escuro, que aparece quase preto na maioria das fotografias, aqui está acinzentado e pálido. O mesmo acontece com o famoso capacete.

Mas não há nada de errado com a foto. A explicação reside no conhecido acidente entre Jacky Ickx e Jackie Oliver na corrida. Quando as chamas tomaram conta dos carros, comissários de pista acionaram seus extintores desesperadamente, mesmo os que se encontravam do outro lado da pista. O jato atingiu o desprevenido Hill, que estava apenas passando por lá. E assim a Rob Walker ganhou uma pintura 'reestilizada'. Alguém se propõe a fazer uma miniatura desta Lotus 49C como edição especial?

Friday, December 4, 2009

Retrospectiva 2009 – Et in arcadia ego

A partir de agora, e até o fim do ano, tentarei tratar de algumas das principais questões que o automobilismo – e a Fórmula 1, principalmente – enfrentou no ano que passou. Suponho que não só os mais bem informados sabem quem foi o campeão, quais pilotos venceram, quais equipes despontaram, quais desapontaram. Por isso, permitam-me começar a falar sobre 2009 a partir de algo que vocês não sabem: a pintura acima.

Um grande campo aberto, com algumas montanhas ao fundo. Um fim de tarde. Quatro jovens em trajes romanos se reúnem em torno de uma pedra. Quem são eles? Por que estão vestidos assim? Onde eles estão?

As coroas florais e cajados nos respondem a primeira pergunta: são pastores. Um elemento externo justifica suas vestimentas: as figuras retratadas são inspiradas nas antigas esculturas helênicas e romanas, das quais também tomam emprestado o ideal de beleza que personificam. O modo balanceado, quase simétrico em que estão dispostos se deve às regras de composição herdadas da Renascença, em particular de Rafael. Não é uma pedra que os detém a atenção, mas uma lápide – ou uma grande tumba., tão plácida, tão misteriosa quanto seus quatro acidentais visitantes.

Um dos homens ajoelhados tenta decifrar a inscrição. Tarefa também complicada para nós, até mesmo quando vemos a obra em reproduções impressas, quanto mais em escaneamentos mal feitos. Por isso também preciso colocá-la aqui: ET IN ARCADIA EGO.

“E na Arcádia estou”. A Arcádia, uma região do Peloponeso, após a Renascença assumiu o significado de um lugar idílico, bucólico, sereno, isento de arroubos passionais e fortes emoções – e também de sofrimento. Precisamente o mundo em que os quatro jovens habitam. “Eu, a Morte, faço-me presente até no mais sereno dos mundos”, parece dizer a tumba.

O autor da obra é o pintor francês Nicolas Poussin (1594-1665), bastante famoso e celebrado em seu tempo. Se você jamais ouviu falar dele, porém, não se preocupe. Existem por aí muitos entendidos que sabem diferenciar um Renoir de um Monet e, mesmo assim, não se detém em Poussin. A tradição deste último, a acadêmica, após um apogeu de dois séculos, mergulhou em tal rigidez e assepsia que asfixiou e secou.

E o que a temporada de 2009 de Fórmula 1 tem em comum com uma pintura do século XVII? Certamente, não a paisagem. Quanto mais ela abandona a Europa em favor do Oriente, mais ela deixa estes campos bucólicos (Poussin, especificamente, se inspirou nos arredores de Roma) em favor de paisagens urbanas e circuitos de rua.

Por outro lado, se a Fórmula 1, digamos, dos anos 80 e 90 têm mais árvores e pradarias ao seu redor, hoje ela parece muito mais árcade. Grandes pegas e ultrapassagens eram mais vistos em Österreichring do que em Abu Dhabi ou Marina Bay – com os carros na pista, por mais velozes que sejam, tudo parece um calculado ballet, sereno, isento de arroubos passionais e fortes emoções.

Curiosamente, foi numa paisagem árcade, nos arredores de Budapeste, conhecido como um lugar onde nada costuma acontecer (na pista) que categoria levou seu maior susto em muito tempo. Na reta oposta de Hungaroring, uma mola solta, uma volta de desacelaração e assistimos perplexos à inexplicável batida de Felipe Massa contra o muro. Ambulâncias, helicópteros, paramédicos, sangue. Et in Arcadia ego.

Poucos dias antes, o campeão mundial John Surtees enterrava seu filho Henry, vítima de um trágico imponderável numa corrida de Fórmula 2. O automobilismo europeu passou os últimos 15 anos tentando se fechar em um mundo idílico, sem morte. Renunciou a muita coisa para obter a segurança, inclusive às próprias emoções que alguém espera ao assistir a uma corrida. O acidente quase fatal de Massa, embora sem sequelas, fez a Fórmula 1 descobrir o que Poussin já havia encenado há três séculos e meio.

O corte aberto no supercílio do piloto com seu capacete quebrado sem dúvida constitui a imagem mais forte que a Fórmula 1 deixou em 2009. Ela nos faz refletir acerca das escolhas que a categoria fez na última década. Mais do que isso, porém, aponta um possível destino, caso ela persista no mesmo caminho: quem sabe algum dia não a veremos pregada numa parede no Louvre, em um corredor por onde milhares de turistas passam sem prestar atenção?